“Não é por ser velho, viu? Mas é que, para mim, compensa demais usar orelhão”, já se justifica o eletrotécnico e analista de sistemas Rubens Brito, de 65 anos. Com o celular quebrado, é um dos usuários frequentes dos orelhões mais utilizados da cidade de São Paulo: os da estação de metrô e terminal rodoviário Barra Funda, zona oeste. Por lá, Brito passa diariamente, indo e vindo de ônibus de Sorocaba – no interior, onde mora -, para trabalhar.

Sim, os orelhões estão entre nós. E a maioria ainda funciona. Invisíveis para muitos, são utilizados por outros tantos que, na emergência, por falta de celular, acabam telefonando a cobrar ou com cartão. Os telefones de uso público estão espalhados nas calçadas do País: são 768 mil. De julho a dezembro de 2017, cerca de 93% dos telefones públicos no Estado tiveram uso de até 1 crédito por dia (chamada de dois minutos). Desse montante, metade teve uso de até 59 segundos.

Só na cidade de São Paulo, são mais de 40 mil. Os orelhões mais usados estão nas Estações Brás e Barra Funda – com base nos créditos dos cartões telefônicos, e não na duração das chamadas. “Muitas vezes, não tenho créditos no celular. Então, sempre tenho um cartão ou dois na mão para fazer ligações. Desta vez, estou com o celular quebrado mesmo”, conta Brito. Por mês, diz usar o telefone público de 10 a 15 vezes.

Além disso, ele admite que não é lá muito afeiçoado a estender a conversa por telefone. Brito para nos orelhões da Barra Funda, enfia um cartão e conversa por 2 minutos com a mulher “para saber como estão as coisas” e para avisar que estava retornando a Sorocaba. “Sou muito objetivo. Minhas ligações são rápidas. Tem gente que fala demais o dia todo. É chato isso de ficar mandando mensagem todo tempo.”

Quem também não é muito chegada a conversar ao celular e evita o troca-troca de mensagens instantâneas é a diarista Maiana Leão, de 33 anos. “Não gosto, não. Acho que atrapalha o serviço. Sou até contra”, diz ela, que está com o celular quebrado há três meses. “Meu cartão telefônico estava guardado nas minhas coisas há uns cinco anos. Sabia que usaria um dia.”

Maiana marcou de buscar encomendas com um vendedor na Estação Brás por saber que lá encontraria orelhões. Mas houve um desencontro: o vendedor foi para o lado errado das catracas, e a diarista precisou ficar subindo e descendo para ir até os telefones públicos e se comunicar com as filhas, as intermediárias do encontro. Por questões financeiras, Maiana optou por deixar as filhas de 12 e 9 anos, cada uma com um aparelho móvel, para ela poder se virar quando estiver na rua.

“Ai, que nervoso! Olha a dificuldade. Toda hora que quero saber alguma coisa preciso subir a estação inteira para ir até o orelhão. Não estou encontrando com o homem porque estou sem celular. Já é a segunda vez que ligo para as minhas filhas para poderem falar com ele e avisarem onde estou”, disse.

Enquanto a reportagem conversava com Maiana, no Brás, o técnico de telefonia Carlos Eduardo Domingues consertava os orelhões. A manutenção é semanal. Segundo ele, o principal motivo para falhas é o furto de cabos. “Quando comecei a trabalhar com orelhões, pensei que ninguém usava. Mas muita gente usa. Só no centro, na área onde opero, são 4 mil.”

Marsilac

Longe do centro, no extremo sul da capital, moradores de Marsilac já sabem que somente duas operadoras de telefonia funcionam nas redondezas. Nessa área afastada do centro, quem usa mesmo os orelhões são “os perdidos”, que não moram por ali.

Morador de Marsilac, o cabeleireiro Josiel de Jesus, de 37 anos, diz que os caminhoneiros, quando vão fazer entregas na região e precisam localizar o cliente, recorrem a telefone público. “O celular deles não pega, aí param aqui e tentam ligar no orelhão. Se não conseguem, pedem nosso celular e ligam a cobrar.”

Quando não são os perdidos, é um morador com algum perrengue: por não ter celular ou precisar ligar para um 0800. Na quinta-feira da semana passada, a dona de casa Sara Santos, de 23 anos, estava sentada diante de dois orelhões. “Pelo celular não consigo ligar 0800. No orelhão, dá. Mas esses não estão funcionando. Geralmente, está tudo quebrado.”

No aperto, até os técnicos de telefonia usam os “dinossauros”. Naquele mesmo dia, a caminho da casa de um cliente, em Marsilac, o técnico da Vivo Reginaldo Luís precisou entrar em contato com o cliente, mas estava sem o telefone particular. O celular corporativo, segundo ele, só liga para contatos institucionais. A solução estava logo ali: dois orelhões. Mas eles não funcionavam. Decidiu então abrir os telefones e consertar. “Não mexo com orelhão, só com fixo e internet. Vim consertar porque precisava falar com o cliente”.

Em nota, a Vivo disse que, mensalmente, cerca de 25% dos telefones públicos da operadora no Estado sofrem vandalismo. Um sistema remoto detecta os defeitos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.