A oposição venezuelana retomou, nesta quarta-feira (15), as atividades parlamentares, um dia após forças de segurança impedirem a sua sessão, o que seu líder, Juan Guaidó, denunciou como uma tentativa do governo de fechar o Legislativo.

“Aqui estamos, em sessão, dando a cara ao povo”, afirmou Guaidó após começar o debate no Legislativo, único poder nas mãos da oposição, alvo de uma investida oficialista desde uma fracassada rebelião militar em 30 de abril contra Nicolás Maduro.

Embora não tenha sido informado o número de comparecimentos, vários assentos e o espaço para a imprensa estavam vazios.

Guaidó, líder parlamentar reconhecido como presidente interino da Venezuela por cerca de 50 países, disse que com o bloqueio da Assembleia, o governo socialista mostrou ao mundo a véspera “que são uma cruel e vulgar ditadura”.

Na terça, agentes da Guarda Nacional, policiais e agentes do serviço de inteligência (Sebin) isolaram e bloquearam as entradas do Palácio Federal, uma operação que o número dois do chavismo, Diosdado Cabello, justificou citando uma ameaça de bomba.

“A opção na Venezuela é lutar, seguir adiante (…) e aqui está seu Parlamento para acompanhá-los e sair desta crise”, disse Guaidó em um debate sobre as represálias judiciais contra parlamentares, ao qual a Guarda Nacional proibiu a entrada de jornalistas, embora a Assembleia tenha transmitido pelo Twitter.

“Estão tentando fechar pelas vias dos fatos o Parlamento nacional”, tinha denunciado na terça o engenheiro de 35 anos.

Nesta quarta, garantiu, contudo, que o “fim da usurpação” está próximo, em referência à Presidência de Maduro, cujo segundo mandato o Congresso considera ilegítimo.

– Parlamento diminuído –

Quatorze deputados foram acusados de traição à pátria e conspiração pelo Supremo Tribunal de Justiça (TSJ, na sigla em espanhol), alinhado com o governo, por seu apoio ao levante liderado por Guaidó. Mais tarde, a Assembleia Constituinte chavista lhes retirou seu foro privilegiado.

A face mais visível do levante é Edgar Zambrano, braço direito de Guaidó e vice-presidente do Parlamento, que foi detido em Fuerte Tiuna, principal complexo militar em Caracas, após ser preso há uma semana.

Quatro parlamentares se refugiaram em residências de embaixadores em Caracas, o último deles, Franco Casella, recebido na casa do diplomata mexicano para oferecer “proteção e resguardo”, anunciou nesta terça-feira o governo desse país.

Este fato chamou atenção porque o México – diferentemente de países como Brasil, Argentina e Colômbia, reconhece Maduro e não Guaidó.

Além disso um deputado fugiu para a Colômbia e o legislador Freddy Superlano anunciou nesta quarta no Twitter que passou para “a clandestinidade” dentro da Venezuela para evitar sua prisão.

“Hoje, a história obriga a ser firmes os poucos que pretendem macular os ideais do povo”, disse nesta quarta o presidente do TSJ, Maikel Moreno, em um ato oficial, referindo-se a supostos ataques à Constituição.

O Parlamento está de mãos atadas desde 2016 por uma decisão do TSJ. Na prática foi substituído em suas funções pela Constituinte.

Segundo o Legislativo, 26 de seus membros foram alvo de medidas judiciais.

“Liberdade para Juan Requesens, sequestrado pela ditadura”, afirmava um enorme cartaz colado de um palco com o rosto do deputado, preso por um suposto atentado contra Maduro em agosto de 2018.

No debate desta quarta-feira, o Parlamento aprovou a reintegração da Venezuela à Corte e Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), da qual foi excluída pelo governo chavista em 2013.

Mas trata-se de um movimento simbólico, já que as decisões do Parlamento não têm validade desde 2016, por decisão do Tribunal Supremo de Justiça.

– Guaidó recalibra estratégia –

Guaidó contesta o poder de Maduro desde que se autoproclamou presidente interino em 23 de janeiro, depois que o Parlamento declarou a reeleição ilegal do líder socialista, no contexto da pior crise sócio-econômica na história recente do país petroleiro, com hiperinflação e escassez de medicamentos e alimentos.

“Eles não deveriam estar se matando, deveriam fazer as pazes e ajudar o país”, disse à AFP Leidy Ramirez, 29, mãe de quatro filhos e moradora do popular bairro de Caracas, Petare.

Guaidó procura forçar a saída de Maduro para pedir “eleições livres”, mas sua estratégia de fazer as forças armadas mudarem para seu lado diante da pressão dos protestos de rua perdeu o ímpeto.