Aos gritos de “Liberdade!”, milhares de opositores saíram às ruas da Venezuela para reivindicar a vitória nas eleições presidenciais de Edmundo González Urrutia, que fez um apelo contra a repressão do povo após protestos que deixaram pelo menos 12 mortos e centenas de presos.

Apoiadores de González Urrutia e da líder opositora María Corina Machado se concentraram na terça-feira (30) em Caracas e em outras cidades venezuelanas para contestar o resultado do pleito de domingo, que, segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), alinhado ao governo, concede um terceiro mandato ao chavista Maduro.

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“Devemos permanecer nas ruas, não podemos permitir que nos roubem os votos tão descaradamente. Isso precisa mudar”, disse a administradora Carley Patiño, de 47 anos, à AFP.

Liderada por María Corina Machado, a oposição afirma ter provas da sua vitória. Ela afirma possuir cópias de 84% das atas, que provariam a fraude, e as publicou em um site.

A comunidade internacional pressiona por uma recontagem transparente dos votos.

Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e dos Estados Unidos, Joe Biden, pediram a apresentação das atas de votação “de forma imediata”, ressaltando que as eleições na Venezuela representam “um momento crítico para a democracia no hemisfério”.

O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, seguiu a mesma linha nesta quarta-feira e pediu “acesso imediato às atas de votação de todas as seções eleitorais”. “Até que as autoridades publiquem as atas e as mesmas sejam verificadas, os resultados anunciados não poderão ser reconhecidos”.

Para o Carter Center, as eleições presidenciais não seguiram “parâmetros e padrões internacionais de integridade eleitoral”.

“Não pode ser considerada democrática”, afirma um comunicado divulgado pelo Centro Carter, convidado pelo CNE para observar as eleições.

O Peru reconheceu González Urrutia como o presidente eleito “legítimo” da Venezuela, o que levou o ministro venezuelano das Relações Exteriores, Yván Gil, a anunciar na rede social X o rompimento das relações com o Peru.

A presidência do Peru anunciou “lamentar” a decisão e destacou que Caracas a tomou “diante da impossibilidade de demonstrar de forma confiável sua atribuída vitória eleitoral, exibindo todas as atas com verificação internacional, como solicitam os países e múltiplas organizações internacionais”.

Pedido de calma

Durante a manifestação em Caracas, González Urrutia pediu que os militares mantenham a calma. “Senhores das Forças Armadas: não há razão para reprimir o povo da Venezuela, não há motivo para tanta perseguição”, disse.

Maduro responsabilizou González Urrutia e Machado pela violência nas manifestações e garantiu que “a justiça vai chegar”.

“Responsabilizo o senhor, González Urrutia, por tudo o que está acontecendo na Venezuela, pela violência criminosa, pelos delinquentes, pelos feridos, pelos mortos, pela destruição”, disse na terça-feira.

“A justiça será feita contra diabos e demônios. Haverá justiça. Saia da sua guarida, senhor covarde!”, gritou o presidente mais tarde referindo-se a Urrutia e María Corina, diante de centenas de apoiadores que se concentraram em frente ao palácio presidencial Miraflores.

O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodríguez, também atribuiu os protestos pós-eleitorais a González Urrutia e María Corina Machado, que segundo ele “deveriam ser detidos”.

“María Corina e Edmundo devem ser detidos. Não negociamos com o fascismo, aplicamos todo o rigor das leis da República”, disse durante uma sessão da Assembleia Nacional.

O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, e o responsável pela diplomacia da UE pediram respeito à manifestação pacífica dos opositores.

 ‘Número alarmante’

A ONG de defesa dos direitos humanos Foro Penal contabiliza pelo menos 11 civis mortos nos protestos, incluindo dois menores de idade.

“Preocupa-nos o uso de armas de fogo nestas manifestações. O fato de terem ocorrido 11 mortes em um único dia é um número alarmante”, considerou Alfredo Romero, diretor da Foro Penal.

O procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, também relatou a morte de um militar e anunciou que 749 pessoas foram detidas.

A ONG ‘Encuesta Nacional de Hospitales’ informou que 84 civis ficaram feridos nos protestos, enquanto o Ministério da Defesa mencionou que 23 militares sofreram ferimentos.

O líder opositor Freddy Superlano foi detido na terça-feira preso hoje, no que a oposição chamou de “escalada repressiva”. O seu partido, Vontade Popular, denunciou a “torturas” para “obrigá-lo a confessar o falso plano montado pelos porta-vozes do regime”.

As Forças Armadas, principal apoio do governo, expressou “lealdade absoluta e apoio incondicional” a Maduro, declarou o ministro da Defesa, general Vladimir Padrino, que respaldou a tese de golpe contra o presidente.

O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, pediu que aqueles que questionam e denunciam uma fraude eleitoral “não metam o nariz” nos assuntos internos da Venezuela os que questionam e, inclusive, denunciam fraudes nas eleições.

Na Cidade do México, centenas de venezuelanos denunciaram a “fraude” eleitoral.

Antes de romper relações com o Peru, Caracas expulsou o corpo diplomático deste país, assim como os da Argentina, Chile, Costa Rica, Panamá, República Dominicana e Uruguai, em resposta ao que considera “ações intervencionistas” desses países.

Seis colaboradores de María Corina estão refugiados há seis semanas na embaixada argentina. A líder de oposição denunciou um cerco policial à sede diplomática.

A Argentina afirmou que se trata de “assédio” contra sua sede diplomática.