ISOLADOS Time de futebol: garotos tinham entre 11 e 16 anos (Crédito:Divulgação)

Dizer que o documentário The Rescue é de tirar o fôlego não é apenas uma associação com o seu tema principal: uma operação de resgate realizada debaixo d’água. A produção é um dos relatos mais eletrizantes captados por câmeras até hoje. Se alguém apresentasse tal trama como ficção ela seria considerada inverossímil demais. Mas a história é real e, como se sabe, tem final feliz.

Produzido pela National Geographic para o streaming da Disney+, The Rescue (O Resgate) conta os bastidores da ação que salvou doze garotos entre 11 e 16 anos, que jogavam em um time de futebol, e o técnico da equipe, de 25 anos. Eles ficaram presos na caverna Tham Luang, complexo subterrâneo na Tailândia com dezenas de corredores e mais de dez quilômetros de extensão. Em julho de 2018, entraram no local para se divertir, mas as tempestades que assolariam o país em agosto chegaram mais cedo. Resultado: o grupo se viu ilhado. Como conheciam bem o lugar, refugiaram-se no ponto mais alto, o único onde poderiam sobreviver — e esperaram.

Os pais só avisaram as autoridades após verem as bicicletas dos filhos na entrada da caverna. Começava então o plano de salvamento mais alucinante da história — tudo registrado nos mínimos detalhes e com precisão jornalística pelos diretores Elizabeth Chari Vasarhelyi e Jimmy Chin. A dupla — são casados na vida real – já havia assombrado o mundo com outro documentário, Free Solo, vencedor do Oscar em 2019. O filme exibia o desafio enfrentado pelo alpinista americano Alex Honnold para escalar o El Capitán, um paredão vertical de mil metros no Parque Nacional de Yosemite, no estado americano da Califórnia. Detalhe: o atleta optou por escalar o pico sem cordas ou qualquer outro equipamento de proteção.

EXPERTS Rick Stanton e John Volanthen: britânicos receberam medalhas da rainha Elizabeth (Crédito:Divulgação)

Chari e Chin são fascinados por ações extremas. Como escalador e esquiador profissional, ele cuida das filmagens radicais, enquanto ela é responsável pela produção e roteiro. Foi assim que nasceu The Rescue: meses após viajarem à Ásia para registrar o episódio, conseguiram acesso a 87 horas cedidas pelas Marinha tailandesa. É dali, aliás, que vêm as imagens mais impressionantes. Os grandes responsáveis pelo sucesso da operação, no entanto, são civis britânicos: o bombeiro aposentado Rick Stanton e o tecnólogo John Volanthen. Considerados os melhores mergulhadores de caverna em todo o mundo, foram chamados como consultores e terminaram recrutando uma equipe de super mergulhadores vindos de todo o planeta. A chegada deles criou tensão com as autoridades tailandesas, que viram sua autoridade minada pela superioridade técnica dos estrangeiros. Foi um erro que levou o governo a ser responsável pela morte de dois homens.

O filme aborda a dicotomia vivida pelos mergulhadores. Se o plano desse certo, perfeito. Se desse errado, poderiam até ser mortos, vítimas das leis tailandesas

Enquanto a disputa política acontecia fora da caverna, os garotos e o técnico continuavam isolados, sem comida e com o oxigênio cada vez mais rarefeito. Após um mergulho de mais de três horas, Stanton e conseguiram localizá-los. Apesar do otimismo, porém, o fato os faz perceber algo trágico: encontrá-los era apenas a parte mais fácil da história. Ninguém tinha a menor noção sobre a melhor maneira de tirá-los de lá. É aí que começa, então, a fase mais dramática do filme. A ideia de anestesiar as treze vítimas do confinamento e trazê-las por baixo d’água foi inicialmente considerada um piada de mau gosto. “Fui imediatamente contra. Parecia eutanásia”, disse Richard Harris, médico e mergulhador australiano convocado para participar da ação. Depois de duas semanas, no entanto, a situação das crianças passou a ser crítica. Após uma série de reuniões, chegou-se à conclusão: ou colocavam o plano em prática ou morreriam todos.

EM EQUIPE Super time de mergulhadores: estrangeiros atuaram em conjunto com a Marinha (Crédito:Divulgação)

O documentário é espetacular porque aborda também a dicotomia vivida pelos mergulhadores. Estrangeiros e praticantes amadores de um hobby incomum, eles se viram protagonistas de um drama humanitário. O que ganhariam com o sucesso da operação? Uma realização pessoal imensa, certamente. Mas e se tudo desse errado? As consequências seriam imprevisíveis. Havia o risco, inclusive, de que fossem condenados à morte pelas rígidas leis tailandesas. Isso faz do filme não apenas um registro magistral de um caso único na história, mas, também, uma lição de vida sobre a responsabilidade que temos uns com os outros, como seres humanos.