O juiz Renato Augusto Pereira Maia, da 11ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, instou o governo Tarcísio de Freitas a se manifestar, em até 72 horas, sobre o pedido para que todos policiais envolvidos na Operação Escudo – que já deixou 28 mortos em Santos e no Guarujá, no litoral paulista – sejam obrigados a usar câmeras corporais.

A decisão foi assinada nesta terça-feira, 5, no bojo de uma ação impetrada pela Defensoria Pública de São Paulo e a Conectas Direitos Humanos. Eles requerem ainda que, caso a eventual ordem para uso obrigatório das câmeras não possa ser cumprida, o governo Tarcísio seja obrigado a suspender imediatamente a ofensiva.

Para a Defensoria e a Conectas a Operação Escudo é uma ‘ação de vingança institucional’, que ‘têm provocado caos e terror nas comunidades’, com relatos de ‘graves violações dos direitos dos cidadãos, invasão de domicílio e busca e apreensão em residências de forma generalizada, e de destruição de residências e comércios (“barracos”)’.

A ‘Escudo’ é classificada na ação como a operação mais letal do Estado de São Paulo após o episódio do Massacre do Carandiru – em outubro de 1992, tropas da Polícia Militar invadiram o presídio na zona Norte da capital para conter uma rebelião e deixaram um rastro de sangue e 111 mortos.

O argumento central da Defensoria e da Conectas é que o ‘não uso adequado’ das câmeras corporais por parte dos policiais na ação nas cidades de Guarujá e Santos ‘aponta para a necessidade de que os mecanismos de controle de uso excessivo da força por parte da polícia, dentre os quais se inserem as câmeras, sejam submetidos a controle social mais rigoroso’.

A ação pontua a necessidade de se fixar ‘parâmetros para o uso de câmeras corporais com a preocupação de existência de um controle social das filmagens e de não alteração das mesmas, para que haja verdadeira auditabilidade da Polícia Militar’.

“Só assim as câmeras poderão produzir ganhos de transparência e accountability e efetivamente contribuirão para a redução dos índices de letalidade”, sustentam.

Os autores do processo ressaltam que as informações não podem ser sigilosas, uma vez que tal sigilo acaba em ‘acobertamento inadequado dos fatos’.

A Operação Escudo foi aberta após o assassinato do soldado Patrick Bastos Reis, da Rota, em Guarujá, no dia 27 de julho. Um dia depois, tropas militares abriram a Operação Escudo para prender suspeitos de matarem o policial. Desde então, até o dia 3 de setembro, 27 pessoas foram mortas pela Polícia, que nega excessos.

A Defensoria relatou à Justiça ter feito uma série de questionamentos ao governo do Estado sobre a ofensiva, além de ter requerido o compartilhamento das imagens das câmeras corporais usadas por policiais durante as diligências. Até agora, o órgão não teve acesso às imagens.

Os defensores então analisaram boletins de ocorrência relacionados aos casos de morte por intervenção policial no bojo da Operação. Para a Defensoria, os documentos ‘indicam a padronização de um comportamento que excede os parâmetros legais sobre o uso da força por agentes de segurança’.

O órgão narrou que apenas um dos boletins de ocorrência mencionou expressamente que os policiais envolvidos estavam usando câmeras corporais. A Defensoria destaca o elevado número de disparos dos policiais que alvejaram as vítimas, fora o ‘encontro de mochilas que não estavam sendo efetivamente portadas pelos indivíduos’.

Outro ponto assinalado na ação é o fato de que o Estado de São Paulo vinha observando queda nos índices de letalidade policial, sendo que tal tendência ‘está ligada diretamente ao uso de câmaras corporais nas fardas dos policiais’.

“No cenário de implementação de um programa promissor e de quedas significativas nos dados sobre letalidade policial, chama ainda mais atenção as 27 mortes por intervenção policial ocorridas na Baixada Santista em menos de um mês, o que pode sugerir que apenas a existência do equipamento não é suficiente para uma efetiva política pública de redução da letalidade policial”, pondera a Defensoria.