Operação C'est Fini: propina era paga até no Palácio Guanabara, diz MPF

Rio de Janeiro - O ex-chefe da Casa Civil do governo Sérgio Cabral, Régis Fichtner, chega preso à sede da Polícia Federal (Tânia Rêgo/Agência Brasil)

O ex-chefe da Casa Civil do governo Sérgio Cabral Régis Fichtner chega preso à sede da Polícia Federal Tânia Rêgo/Agência Brasil

A Operação C’est Fini, uma ação conjunta da Polícia Federal e do Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF-RJ), constatou que o chefe da Casa Civil do governo Sérgio Cabral Filho, Régis Fichtner, recebia propinas referentes a obras públicas até mesmo no Palácio Guanabara, sede do governo fluminense.

Deflagrada por determinação do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Criminal Federal, a operação de hoje (23), que envolveu cerca de 85 agentes da Polícia Federal, cumpriu cinco mandados de segurança, inclusive o que resultou na prisão preventiva do próprio Fichtner; uma condução coercitiva, a do ex-dono da Delta Construções S.A., Fernando Cavendish; 14 mandados de busca e apreensão; e uma intimação para depor, do empresário Alexandre Accioly.

Homem forte de Cabral, Fichtner é acusado de receber cerca de R$ 1,5 milhão neste esquema de propinas, referentes a obras como a construção do Arco Metropolitano (que interliga rodovias que chegam à cidade do Rio) e a urbanização de grandes comunidades no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) das Favelas. Este esquema chegou a desviar R$ 21 milhões dos cofres públicos.

Com a deflagração da C’est Fini, expressão em francês que significa “É o fim”, o Ministério Público Federal acredita ter fechado definitivamente o cerco aos integrantes daquela que ficou conhecida como “farra dos guardanapos” , evento em Paris que foi considerado uma comemoração antecipada da escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 e que tinha o então governador Sérgio Cabral como protagonista de uma foto, com outros colegas, todos de guardanapo na cabeça.

Além de Fichtner, foram expedidos mandados de prisão contra o ex-presidente da Fundação Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Rio de Janeiro (Funderj, vinculada ao DER-RJ), Henrique Alberto Santos Ribeiro; de Lineu Castilho Martins, apontado como operador de Ribeiro; dos empresários Maciste Granha de Mello Filho e George Sadala; e do próprio Régis Fichtner. Estes dois últimos constam da famosa foto do evento em Paris.

Desdobramento da Calicute

Fichtner aparece nas anotações feitas pelo operador do esquema Luiz Carlos Bezerra, que foram apreendidas durante a Operação Calicute. A ação resultou na prisão de Cabral em novembro do ano passado. Bezerra é réu confesso e já foi condenado pela Justiça, mas está solto por colaborar com as investigações.

Bezerra tem detalhado para o Ministério Público e os agentes federais os significados dos registros de uma planilha apreendida em sua casa na Operação Calicute, que contém os números da contabilidade paralela. Nelas, Fichtner aparece com os codinomes “Régis”, “Alemão” e “Gaúcho”.

O procurador federal Eduardo El Hage ressaltou o fato de que a Operação C’est Fini tem como intuito “avançar no desbaratamento dos demais agentes que solicitaram e administraram o recebimento de vantagens indevidas pagas por empresas que celebraram contratos com o estado, assim como de seus respectivos operadores financeiros”.

Lineu Castilho era identificado, nas anotações de Bezerra, como “Boris”, também conhecido como “Russo” e “Kalash”. Ele teria aportado cerca de R$ 17 milhões para a organização criminosa, atuando sempre como braço-direito e operador financeiro do ex-presidente da Funderj, entre 2008 e 2014.

Georges Sadala, que é vizinho de Cabral no condomínio Portobello, em Mangaratiba (RJ), é conhecido pelos pelos codinomes “G”, “Salada” e “Saladino”. Ele é apontado como o  corruptor da iniciativa privada na área de prestação de serviços especializados relacionados ao programa Rio Poupa Tempo. Sadala teve evolução patrimonial exponencial desde o início do governo Cabral. Em troca de facilidades na contratação de suas empresas junto ao Estado do Rio de Janeiro, ele garantiu o pagamento de propina, com o aporte de, ao menos, R$ 1,3 milhão em favor da organização criminosa.

Desvios continuam

A Receita Federal também participou da ação antes de sua deflagração e constatou indícios de distribuição fictícia de lucros e dividendos por pelo menos uma empresa ligada a um dos investigados, para embasar o aumento patrimonial. Também foram verificadas inconsistências em relação ao efetivo funcionamento de empresas de investigados.

O aumento patrimonial dos investigados também foi notado pela Receita, em especial de três deles: Régis Fichtner, Georges Sadala e Maciste Granha de Mello Filho. De acordo com a investigação, o empresário Georges Sadala, por exemplo, tinha um patrimônio de R$ 1,4 milhão em bens em 2007, valor que subiu para R$ 35,6 milhões em 2016.

O grupo de procuradores ressaltou que vários dos contratos que envolvem os desvios investigados ainda estão ativos e vêm sendo pagos. “O estado do Rio vive, em decorrência deste sistema corrupto que se instalou na administração pública, uma situação de caos em suas contas. A organização ainda está ativa e ainda há um volume significativo de recursos [sendo desviado]. As investigações continuarão, de forma a garantir a ordem pública e estancar este processo de lavagem de dinheiro público que ainda está em curso”, disse Eduardo El Hage.