O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, Roberto Azevêdo, enfatizou hoje (19) a necessidade de agir para resolver as tensões comerciais na comunidade internacional e disse que, independentemente da opinião que se tenha sobre a existência de uma possível guerra comercial entre Estados Unidos e China, “os primeiros tiros já foram dados, e não foram poucos”. Durante uma palestra na Casa da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Azevêdo defendeu reformas na entidade e alertou que o caminho adotado pelos dois gigantes econômicos mundiais é muito perigoso.

“A organização nunca foi tão relevante como é agora e o próprio interesse dos líderes de falar da OMC, revigorar, mostra que a alternativa de um mundo sem OMC será um desastre total”, disse Azevêdo ao complementar: “Será um mundo de incertezas, unilateralismo, nacionalismo exacerbado e intolerância também. Isso vai afetar não só as relações econômicas e comerciais, mas terá um impacto nas relações políticas e estratégicas”.

Ao responder perguntas dos jornalistas no fim do evento, Azevêdo afirmou que a tensão entre as duas potências é muito preocupante e pode escalar para outras áreas além da tarifária. Ele se recusou a citar alguma outra área que pode ser usada no impasse. “A área tarifária não esgota o potencial de tensão”, alertou.

O diretor-geral da OMC também manifestou preocupação com a resistência dos Estados Unidos em liberar a nomeação de novos juízes no órgão de solução de controvérsias da organização. Segundo o diretor, se a postura se mantiver até o ano que vem, o órgão poderá ter menos de três juízes, o que traz o risco de que “perca sua efetividade”.  

O diplomata brasileiro afirmou que tem buscado estimular a conversa entre os membros e reforçar que a elevação da tensão estava prevista pela OMC quando alertou sobre as primeiras medidas tomadas contra o livre comércio. “A pergunta é: querem uma solução?”. Azevêdo ponderou que têm havido diálogo entre Estados Unidos e China, mas sem progressos.

“Essa conversa de fazer uma reforma na Organização Mundial do Comércio é encontrar um campo de jogo que cubra as preocupações de todos os lados e, em particular, desses dois”, disse ele, ao lembrar que os Estados Unidos continuam a recorrer à OMC em questões que julgam necessárias. “Eles caminham de uma maneira mais independente quando acham que é necessário para alavancar a posição deles no diálogo bilateral, mas, ao mesmo tempo, usam o sistema multilateral quando isso ajuda a promover os seus interesses. Isso não significa que o sistema foi abandonado, significa que os Estados Unidos estão usando outros caminhos também”.
 
As discussões para reformar a OMC estão em estágio inicial e ainda não há coincidência entre as visões apresentadas. Azevêdo avaliou que os pilares que devem nortear as discussões são a forma como as negociações podem preencher possíveis lacunas nas regras de comércio, os procedimentos decisórios da entidade e o modo de solucionar as controvérsias. Países como o Brasil, conta ele, revindicam que as discussões não deixem de lado assuntos tradicionais como a agricultura.

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A reforma, acrescenta ele, precisa encontrar um equilíbrio e não se tornar nem ambiciosa demais nem tímida demais, a ponto de não resolver os problemas que geram a tensão.

Para o diretor-geral da OMC, não se pode mais esperar a tensão comercial passar. Nos últimos 12 meses, a OMC teve o maior número de casos abertos dos últimos 16 anos. O volume de comércio coberto por medidas restritivas dobrou no último ano e, nos últimos seis meses, foi adotado um grande número de medidas como tarifas e restrições aduaneiras.

“O impacto é sempre muito difícil quantificar, mas o certo é que essa escalada cria muita incerteza e vai afetar o crescimento do comércio e do PIB mundial. Decisões de investimentos são afetadas”, explicou Azevêdo, que apontou que o cenário já atinge as economias da Argentina e da Turquia. 


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