Para o ator, que lançou o primeiro filme do Porta dos Fundos, o País terá chance de mostrar ao mundo que foi ferido, mas não está morto

O filme “Contrato Vitalício”, primeiro longa-metragem do Porta dos Fundos no cinema, é uma crítica ao mundo do entretenimento e da mídia. Mas, passa longe da crítica política que o grupo que costuma fazer em seu poderoso canal na internet. O ator Fábio Porchat sabe que essa cobrança viria e brinca: “Não cabia nesse filme. Mas se tivéssemos feito um longa mais político, nos cobrariam de não ter tocado no tema religião”. Fábio, que está prestes a estrear um talk-show na Record, deixa a veia cômica de lado e diz que, durante os jogos Olímpicos Rio 2016, o Brasil terá a grande chance de mostrar ao mundo que foi ferido, mas não está morto.

ISTOÉ – Como achar graça no momento brasileiro?

Porchat – É difícil achar graça.  Embora o Brasil seja o país da piada pronta, como já disse Jose Simão, não é fácil. Mas sempre dá para rir. O Brasil sabe muito bem rir de si mesmo. O  7 a 1 na Copa mostrou isso. Tomamos 7 a 1 da Alemanha em casa, e cinco minutos depoi,s já estava o pessoal sacaneando, metendo o pau, brincando. A gente é um povo que gosta muito de brincar com as nossas próprias desgraças. Então fazer humor no Brasil para este povo é muito bom. Acho que o Filme do Porta dos Fundos é um momento de alívio cômico dessa situação no País.

ISTOÉ – O país vive uma roda-gigante de deformação na política. Como você tem observado esta crise política e moral brasileira?

Porchat – Estamos vivendo um momento único, acho que tardiamente aquelas manifestações de 2013 estão batendo em algum lugar agora. A operação Lava Jato de fato virou uma conquista dos brasileiros. A gente está investigando os políticos e chegando a conclusão de que realmente há uma farra, realmente está institucionalizada a corrupção em todos os âmbitos.  Na política, não há salvação. Ou seja, 98% das pessoas que estão ali de alguma forma, já subornaram ou já foram subornadas, já propinaram ou já foram propinadas. Essa limpa é necessária. Claro que não pode ser uma Maria Louca que descobre as coisas e manda todo mundo embora. Tem que ser realmente um processo, um passo a passo para que não se cometam certas injustiças. Mas o que estamos vivendo é extremamente necessário e tomara que isso se reflita nas próximas eleições, já.

ISTOÉ – Você acha possível uma renovação política?

Porchat – Acho que sim. A Lei da Ficha Limpa já funciona. Isso é um grande avanço. Algumas máscaras já caíram para esses velhos políticos. Não digo políticos velhos. Talvez finalmente a população se dê conta. Todo mundo entende que agora os caras estão sendo punidos. A população percebe. A gente pode cobrar e pode bater que os caras vão cair. Estão isso é bom e é um alento para os brasileiros. Isso se reflete no futuro, embora seja um processo lento. Tem muita gente para cair, tem muita coisa para investigar ainda. A cada dia, você abre o jornal é uma notícia de um escândalo diferente. Cada dia, um presidente diferente. Acho ótimo esse momento, no sentido de lavarmos essa realidade.

ISTOÉ – O que se discute na renovação política é a ausência de novas lideranças, que ainda não surgiram nesse processo. Você vê gente nova surgindo?

Porchat – Me parece que não. Vamos ver nas próximas eleições. Mas acho que o problema que estava acontecendo, e espero que não aconteça de novo, é que chegavam as novas lideranças e rapidamente elas eram engolidas pelo monstro da corrupção e do sistema instaurado. Agora talvez seja o momento de novas lideranças surgirem e perceberem que a banda está tocando de outra maneira.

ISTOÉ – Como você vê hoje as figuras de Dilma, Temer, Lula, Aécio?

Porchat – Todos eles estão contaminados.  A figura deles todos, independentemente se você é pró-Lula ou se você é contra Lula. Pró-Aécio, contra Aécio, todos foram atingidos. A delação premiada é um processo novo e está funcionando. Todo mundo ali foi citado. Tanto pelas delações quanto pelo que a gente está descobrindo dos fatos reais. O Aécio foi citado não sei quantas vezes. O Lula foi citado, o Temer foi citado. Estão todos manchados e feridos dessa batalha. Você pode ser pró-Lula, mas não é possível que você não perceba que houve uma sangria no PT, que houve uma sangria do País, provocada pelo PT, independentemente de maus elementos existirem em todos os partidos. Você percebe. Se você é contra Lula e pró-Aécio, você percebe que não é possível que o Aécio seja esse santo que estão falando. Há questões em todos os partidos com todos os políticos. E o PMDB está em todas elas e articula.

ISTOÉ – Como você observa o governo interino de Michel Temer?

Porchat – O governo Temer ainda não é um governo. Vamos descobrir esse governo depois de agosto.  Acho que a Olimpíada será um marco para a gente em todos os sentidos. Inclusive para o Brasil mostrar para o mundo que somos fortes e que conseguimos sair dessa feridos, mas não mortos.

ISTOÉ – Porque vê a Olimpíada como esse divisor de águas?

Porchat – A Olimpíada marcará esse processo. E é uma pena que culminou de a Olimpíada acontecer neste momento tão problemático para o País. No período dos Jogos Olímpicos Rio 2016, saberemos se a presidente será definitivamente afastada ou não. Mas o evento marca a consagração de uma cidade que ainda lá atrás era vista como um cartão postal do Brasil. Quando o Rio foi eleito para ser sede dos Jogos Olímpicos estava tudo certinho, né? Estava lá o Lula de acordo com o Sergio Cabral. E de repente foi todo mundo se perdendo. Por isso acho que a Olimpíada é um marco simbólico do Brasil antes e depois da Lava Jato.

ISTOÉ – Como serão as Olimpíadas?

Porchat – Acho que dará tudo certo nas Olimpíadas como deu na Copa do Mundo, tirando o 7 a 1, é claro.  Acho que vamos ganhar medalhas. Os atletas não tem nada a ver com o que está acontecendo. É um evento fenomenal. Nunca mais, em 100 anos, vai ter outra Olimpíada aqui no Brasil. É um momento histórico.

ISTOÉ – Esse discurso prevalece: O Rio arrasado, o Brasil em crise sem precedentes e uma Olimpíada…

Porchat – Se tivesse sido decidido fazer a Olimpíada no Rio no ano passado, eu diria: que ideia de Jerico. Mas, há sete anos, estava tudo ótimo, o Brasil estava na moda, a Olimpíada passava uma energia boa para todo mundo. Adoro viajar e quando estou lá fora, seja no Quênia ou na Tanzânia, só se fala no Rio e nas Olimpíadas. Quer dizer, o Brasil está no mundo. É a primeira Olimpíada na América do Sul. É um marco mundial. Mesmo lá atrás, sediar uma Olimpíada podia ser uma ideia desnecessária. Várias cidades o fizeram e tiveram prejuízo. Barcelona é um exemplo raro. Mas insisto que não era uma má ideia há sete anos. Mas o Rio de janeiro, com toda roubalheira, com a corrupção, com o caos, com as empreiteiras, está pronto para a Olimpíada. Não estou dizendo que está maravilhoso, estou dizendo que está tudo certo para os Jogos Olímpicos começarem. A cidade se modificou, sim, está melhor. A que custo? A custo de dinheiro desviado. Isso é uma pena.

ISTOÉ – A ideia desse momento culminar com o impeachment da presidente Dilma, você que vai colocar o País num farol de visibilidade para o mundo. A essa altura isso ajuda ou atrapalha?

Porchat – O Rio já está no farol da visibilidade. O Cristo que tinha subido como foguete na capa da Economist ja caiu, já afundou. Todo mundo fala de tudo o que está acontecendo. Temos o Zika, temos uma ciclovia que cai, temos a presidente afastada, temos o Souza Aguiar invadido por bandidos, ai morre a médica na Linha Amarela. Então, lá fora, nós já estamos mal vistos  para caramba. A gente precisa resolver a situação do Pais. A presidente vai, a presidente fica. E se ficar vai chamar novas eleições, e vamos ter a chance de começar um 2017 tentando se livrar desses vermes que estão no poder. Se não ficar, teremos eleições em 2018.

ISTOÉ – A internet naquele momento em que o Porta dos Fundos começou era, de certa forma, uma ‘porta dos fundos’. E hoje virou porta da frente. Como encara o começo de uma história com o cinema, uma mídia tradicional?

Porchat – O nome Porta dos Fundos nasceu de uma brincadeira,  uma mímica, mas, simbolicamente, isso da internet ser uma porta dos fundos funciona bastante. Este é o primeiro filme da produtora Porta dos Fundos. Todos nós já tínhamos feito cinema, que adoramos, mas a ideia é a do Porta dos Fundos lançar filmes novos todos os anos.

ISTOÉ – O filme faz uma sátira à mídia. Como você encara as deformações da indústria do entretenimento?

Porchat – É algo que existe, não tem como negar. É difícil. A mídia quer assunto. Quer gerar assunto, e fazer com que as pessoas cliquem, leiam, assistam, comprem. Claro que há uma parte da mídia que faz isso de uma forma torta, de propósito, faz algo para te colocar numa manchete que você nem queria estar. Ou você nem falou aquilo direito. Mas o importante para lidar com isso é saber que a mídia não está interessada em você, está interessada em vender. Entendendo isso, funciona. Pode soar mal ou errado dizer isso. Mas quando se tem essa noção, você entende um pouco mais o funcionamento. E você consegue se preservar mais ou menos. Ou, pelo menos, está ciente do que está sujeito.

ISTOÉ – Já viveu situações como a de Contrato Vitalício – ser envolvido numa rede de pessoas loucas e interesseiras?

Porchat – Já. Muitas das coisas do filme já vivi pessoalmente. Já convivi com gente deslumbrada, assessor de imprensa que está mais interessado que você seja famoso e nada mais. Já me vi diante de gente me orientando a tirar fotos com famosos. Pessoas que querem gravar um snapchat aqui rapidinho, e você simplesmente estava conversando com a pessoa. Essa necessidade frenética das redes sociais. A namorada do personagem que faço, que está sempre querendo postar algo da relação dos dois para aumentar seu número de seguidores. No fundo, ele cumpre essa função na relação. Já vivi um pouco de todos aqueles personagens na minha vida e do que acontece no filme. Mas, claro, ponho uma lente de aumento.

ISTOÉ – Alguma história marcante?

Porchat – Já tive uma empresária que um dia negou um pedido, sem falar comigo. Estava num evento e alguém pediu para eu fazer algo como apresentar alguma coisa no palco. A empresária foi categórica: não, Fábio não vai fazer, ele não faz esse tipo de coisa. E ela nem viu que eu já estava no palco, fazendo! Tem isso do empresário virar alguém mais pomposo que o ator. Dizer não para algo que, na verdade, o artista pode fazer. O filme mostra o ator interessado em teatro, e o empresário corta a ideia.

ISTOÉ – Qual foi a pior situação que viveu na roda gigante do entretenimento?

Porchat – Foram tantas coisas, ainda mais quando a gente está começando. Testes que são muito ruins, você fica exposto. Buscar patrocínio é uma das piores coisas que tem.  Viver aquela situação de apresentar seu projeto para quem não te ouve. A gente fez um vídeo do Porta dos Fundos que é isso: Shakespeare tentando patrocínio para a peça dele e aquela dificuldade. Dificuldades como essa a gente joga num vídeo. Ajuda a exorcizar.