Aron D’Souza se vende como visionário, mas para muitos está mais para um picareta. Sua ideia de promover uma Olimpíada com doping liberado não é nova — circulou muito nos anos 1980 e nunca foi levada adiante, porque a indústria farmacêutica não resistiria ao impacto negativo de ídolos do esporte que apresentassem sérios efeitos colaterais — na maior parte das vezes ligados a câncer de fígado, como acontecia com atletas da Alemanha Oriental, por exemplo.

Mas o australiano de idade desconhecida está empenhado: montou um site para informar sobre os Enhanced Games (algo como “Jogos Melhorados”, em português) e diz que em 12 de agosto já estará correndo atrás de interessados — esse é o dia seguinte ao encerramento da Olimpíada de Paris 2024.

O argumento de Aron pela liberação do doping vem de décadas passadas, quando muitos viam o canadense Ben Johnson como “garoto-propaganda” da eficiência das drogas no esporte por seu incrível recorde de 9s79 para os 100m, em 1988 — depois anulado.

A ciência se encarregaria de “enquadrar” futuros danos à saúde e todos teriam mais chance de alcançar os pódios.

O que também é contestado, porque novamente apenas uma minoria teria acesso às drogas mais recentes e aos tratamentos caríssimos em clínicas de alto rendimento.

Olimpíada com doping: a polêmica proposta que deturpa o esporte
Aron D’Souza, criador dos Enhanced Games, com doping: “Vamos desbloquear a medicina de desempenho, que leva à longevidade e às tecnologias anti-envelhecimento” (Crédito:Divulgação )

Atrás de grana

O site dos Jogos “com doping permitido” aparece na internet como ONG — teoricamente, portanto, uma instituição sem fins lucrativos.

Ali está explicado que realização, com data e local, dependerá do “financiamento” que conseguir — mas possivelmente serão em um campus universitário no sul dos EUA, e começando por atletismo e natação. Especialistas cuidariam cientificamente de atletas usuários de doping com o propósito de quebrar recordes — sendo pagos por isso.

O que o site não diz: que serão usados como cobaias e depois em anúncios de drogas a serem lançadas no mercado.

Agora Aron já diz ter verba suficiente para montar seus Enhanced Games no segundo semestre deste ano, depois de convencer empresários como o bilionário Peter Thiel, que fundou o PayPal.

De competidores, apresentou o nadador australiano aposentado James Magnussen, que se submeteria a usar drogas para quebrar o recorde dos 50m livre do brasileiro Cesar Cielo (20s91, ainda de 2009) em troca de US$ 1 milhão.

As falas renderam reações da WADA (a Agência Mundial Antidopagem), que alerta sobre o veto aos atletas de Aron em futuros Jogos Olímpicos. E Sebastian Coe, o fundista que agora é presidente da Word Athletics, resumiu britanicamente, sobre os Enhanced Games: “Uma bobagem”.