O processo é simples. O atleta vai até o local, deixa o braço ou a perna para consertar e volta para buscar mais tarde sem custo nenhum. O serviço funciona das 8 horas às 21 horas e é aberto para todos os participantes dos Jogos Parapan-Americanos em Lima, no Peru. Além de membros mecânicos, a Ottobock, empresa parceira do Comitê Paralímpico Internacional (IPC, na sigla em inglês), conserta cadeiras de rodas.

A dois dias do término da competição os mecânicos e responsáveis pela oficina informaram ao Estado que já bateram o número de atendimentos de Toronto-2015. O brasileiro Emerson Bolvo, auxiliar chefe do local, disse que foram feitos mais de 800 consertos na capital peruana. No Canadá, os reparos beiraram os 800.

A demanda é maior na atual edição por dois motivos, segundo ele. O primeiro é que há mais atletas em Lima do que no Canadá. O outro é que a região é mais pobre. Por isso é comum que muitos apresentem a prótese danificada antes mesmo de competir. “É uma tradição isso. No Rio-2016 foi assim também. Reencontrei vários atletas que estavam lá. Eles chegam com um problemas antigo. Aqui a gente prioriza as próteses e cadeiras de competição, mas também conserta as de uso no dia a dia”, disse Bolvo, mestre em ortopedia técnica.

A empresa deslocou 23 funcionários de diferentes países de suas filiais para trabalhar em Lima. Além de brasileiros, há cubanos, norte-americanos, colombianos, entre outros. Eles ficam divididos em três localidades. A oficina principal está na Vila dos Atletas. E há também outros dois pontos em centros esportivos onde acontecem as disputas.

As peças, o material de solda, todas as ferramentas e um forno vieram da Alemanha em dois contêineres, que depois se tornaram a própria oficina. O local é dividido por setores: há o estoque, a sala de conserto com duas mesas enormes, um área para solda e outra com o forno. A Ottobock nasceu logo após a primeira guerra mundial com o objetivo de auxiliar combatentes amputados. Há 31 anos, desde os Jogos de Seul, é parceira do IPC.

CONHECIMENTO DE CAUSA – Um dos funcionários que passa o dia na manutenção das pernas e braços mecânicos é o curitibano Rodolfo Bostelman. Ele é supervisor técnico de uma filial na capital paranaense e está trabalhando pela terceira vez em uma competição paralímpica.

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Bostelman conhece do assunto por necessidade. O emprego que está hoje ele descobriu somente depois de ter tido parte da perna direita amputada em um acidente de moto. O táxi varou o sinal vermelho e pegou o então fisioterapeuta de frente. “Acordei oito dias depois e já estava amputado”, comentou. Depois de se recuperar do trauma, ele comprou uma prótese, mas teve dificuldade na adaptação. A perna mecânica causava ferida em sua perna e dor nas costas.

“Passava dois dias com ela e 20 dias de muleta para recuperar do machucado”, disse. Por isso, foi atrás de uma empresa para saber se o problema era com ele ou com o componente. Nesse período acabou sendo contrato pela empresa. “Consegui primeiro o trabalho e depois a prótese”, afirmou.

Lá dentro passou a estudar e notou que havia um somatório de erros. Possuía um sistema desregulado para o nível de amputação e montado de maneira incorreta. Ele resolveu o problema dele e começou a ajudar todo mundo. Agora em Lima ele lembrou de um caso de um atleta peruana que sentia as mesmas dores nas costas e não se adaptava à prótese. Quando analisou percebeu que havia uma peça importante quebrada.

ALTA DEMANDA – A oficina na Vila dos Atletas teve picos de até cem atendimentos na mesma hora durante o Parapan. Além de uma sala de espera, eles também oferecem cadeiras de rodas reservas para os atletas se locomoverem durante os consertos.

As cadeiras de roda que dão problemas geralmente são do basquete ou do rúgbi por causa do contato. O trabalho mais comum é o de solda. Também pode acontecer de ela estar fora do padrão e precisa ser cortadas. O mais simples é um pneu furado.

A prótese costuma dar problemas nas dobras e também no pé. Houve um caso também que o cadeirante teve o óculos quebrado além da cadeira. Bolvo lembrou que remontou o óculos com os aros das rodas e ficou tudo certo.

Uma perna mecânica de última tecnologia pode custar até R$ 200 mil, mas há também modelos mais acessíveis que saem por R$ 3 mil. Em todos os casos, Rodolfo alerta para os cuidados com a manutenção para evitar quebras.

MECÂNICOS NAS EQUIPES – Os times de basquete e rúgbi em cadeira de rodas possuem mecânico em sua comissão técnica. Marcelo Romão está com o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) desde 2005 e atualmente acompanha o basquete feminino. Para ele, a demanda na atual edição até que foi leve se comparada com outras competições. “Dessa vez foram somente ajustes como as de regulamentação e pneus murchos por causa do frio”.

O trabalho também está mais fácil. “Eu já cheguei a trazer 30 quilos de ferramentas, mas hoje somente o que se usa na cadeira de basquete precisa de no máximo cinco quilos”. O time feminino brasileiro perdeu para o Canadá nas semifinais por 61 a 40. A disputa pelo bronze será contra a Argentina neste sábado, às 18h30 (de Brasília).


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