Com 45 mil hectares (63 campos de futebol) de área dedicada à plantação de milho, Palotina, no interior do Paraná, entrou no mapa do agronegócio nos últimos anos pelos seus recordes de colheita do cereal — que é usado tanto como ração pela pecuária como serve de base de muitos alimentos e bebidas feitos para humanos. No começo de 2020, ela descobriu que havia entrado para o seleto grupo de cidades que exportam mais de R$ 1 bilhão em produtos agrícolas, e esse número se refletiu meses depois no caixa de uma das cooperativas locais, a C.Vale, cujo crescimento das receitas foi de 37% no ano passado. Com tantos resultados promissores, a previsão para 2021 era de uma nova temporada de lucros. Só não contava, porém, com uma combinação inédita de fatores negativos no campo: uma longa estiagem nos primeiros meses do ano seguida por uma das geadas mais intensas da década, entre junho e agosto. A última delas, que baixou a temperatura para abaixo de zero em boa parte do estado, arruinou quase a totalidade (95%) do milho de Palotina. “Hoje, a gente olha para o que sobrou e sente vontade de chorar”, confessa Eduardo Nishida, um dos produtores de milho da região. E esse sentimento se reproduziu de muitas formas em outras lavouras espalhadas pelo País.

Esse impacto climático foi ainda mais forte sobre os cafezais de Minas Gerais, São Paulo e do próprio Paraná, responsáveis por quase toda a produção nacional de café. Eles terão uma queda de 22% na colheita de 2021, segundo o Ministério da Agricultura. Só no Sul mineiro, uma extensão de 173 mil hectares de lavouras foi afetada, atingindo ao menos 10 mil produtores locais, como as fazendas de Fernando Caixeta, em Machado (MG). “Perdi 50% da minha safra e ainda nem acabou a seca”, lamenta. A estiagem também atingiu outras culturas importantes do agronegócio brasileiro como a soja e o algodão, além da pecuária, que depende de grãos para alimentar os animais. Passada essa fase mais crítica, outra ameaça irrompe no horizonte: a crise hidrica.

Queda nos números

As mudanças climáticas e a inevitável falta de água nos próximos meses ajudam a entender como o setor, um dos pilares da economia e principal motor da retomada pós-Covid, tropeçou. Embora as perspectivas sejam de recuperação, o tombo de agora não era esperado: foi o pior resultado na composição do PIB do segundo trimestre (-2,8%) e ajudou a puxar para baixo as previsões de crescimento do Brasil em 2021, que hoje é de 5,15%, segundo o Banco Central. Foi a maior queda do agronegócio desde o primeiro trimestre de 2019, quando caiu 2,9%. Não à toa, no fim de agosto, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) diminuiu em 0,9 pontos percentuais a expectativa de crescimento do PIB Agro deste ano, de 2,6% para 1,7%. “Além do aumento do dólar, que impacta nos insumos de toda a cadeia, e da queima de muitas safras, há ainda o temor da falta de água, já que as plantações brasileiras, em sua maioria, não são irrigadas artificialmente”, explica Alexandre Mori, especialista em agronegócio da consultoria Funcional.

“Além do aumento do dólar, há o temor da falta de água, já que as plantações brasileiras não são irrigadas artificialmente”
Alexandre Mori, especialista em agronegócio da Funcional (Crédito:Divulgação)

Em meio a esse cenário adverso, o governo já espera que a produção brasileira de grãos caia 1,2% na atual safra (2020/21) em relação à passada (2019/20) — mesmo com um aumento de 4% de área plantada no mesmo período — por causa das geadas e pelas incertezas com a crise dos reservatórios. “É um cenário que diminui exportações e ainda aumenta custos da produção de carnes, em um momento em que a pecuária patina no mercado interno, por exemplo”, avalia Alfredo Lang, presidente da C.Vale.

O tombo do agronegócio brasileiro e as perspectivas pessimistas já atiçam o mercado internacional. Uma pesquisa da agência Reuters mostra que investidores esperam uma alta de 55% no preço do café até o fim do ano. Nos supermercados brasileiros espera-se que o valor do produto suba 40% ainda neste mês. Já a saca do milho está sendo vendida por um valor 72% maior no exterior desde o primeiro semestre do ano — alta semelhante à verificada internamente. Com isso, as expectativas são todas postas sobre o ano que vem. A torcida é, principalmente, pelas chuvas. “O sentimento é que as perdas poderão ser repostas no futuro e de que é hora de pensar em 2022”, afirma Mori.