“Assassinato no Expresso Oriente” é uma das histórias de suspense mais populares do século 20. O romance da inglesa Agatha Christie (1890-1976) fez sucesso e ganhou tantas versões em rádio, televisão, teatro e cinema que só mesmo os millenials ainda não sabem quem é o assassino – se é que já não ficaram sabendo. Diz a lenda que até a autora se cansou do enredo: um crime é cometido no topo de uma montanha na Europa Central em um trem de luxo: dez passageiros são suspeitos e… adivinhe se o culpado é o narrador ou mesmo a suposta vítima?

A nova versão para o cinema virou também sucesso de bilheteria antes de chegar aos cinemas brasileiros. A produção da Fox, com direção e atuação do irlandês Kenneth Branagh, contou com um orçamento de US$ 55 milhões, e obteve receita quatro vezes maior em três semanas de exibição. O filme estreou em 13 de novembro e alcançou a bilheteria mundial de US$ 198,1 milhões.

A versão de Branagh quer rivalizar com a do célebre longa-metragem dirigido por Sidney Lumet, de 1974, com Ingrid Bergman, Lauren Bacall, Sean Connery e Albert Finney , ­como o detetive belga Hercule Poirot. Lumet obteve de Agatha Christie a autorização de filmagem. Apesar do sucesso, Agatha se referia a ele como “aquele filme idiota de trem”.

Cheiro de vapor

Com a intenção de evitar a rejeição dos fãs de Agatha e fisgar plateias que não conhecem a história, Branagh convocou um elenco quase tão estelar quando o da primeira versão – Judi Dench, Michelle Pfeiffer, Penélope Cruz e Johnny Depp como o gângster Edward Ratchett, morto no meio do filme –, mudou personagens e o desfecho, tornando-o apropriado ao gosto atual, mais macabro do que o das plateias de 43 anos atrás. Além disso, filmou em 70 milímetros, bitola que amplia e dá força dramática aos cenários e figurinos de época.

Mas o melhor achado de Branagh foi reservar para si o papel de Poirot. Contou para isso com sua experiência na direção e atuação em peças e filmes de Shakespeare e de longas e séries de suspense. Ele interpretou o passional Hamlet em 1996 e, vinte anos depois, o cerebral investigador Kurt Wallander na série da BBC. Sintetizou os dois caracteres em Poirot: humanizou-o e lhe imprimiu um ar de herói de aventura, capaz de correr, lutar e, feito Romeu, chorar por um amor perdido. É bem diferente do personagem original, um detetive baixo, rechonchudo, cordial e quase sonâmbulo.

“Em Agatha Christie, como em Shakespeare, há uma oportunidade de alterar ideias preconcebidas”, disse Branagh. “Eu queria que o público sentisse a neve e o cheiro do vapor. E fiz questão de ter todas as vantagens do material clássico e nenhuma das desvantagens do excesso de familiaridade.” Para isso, alterou a trama original.

3 versões para cinema e televisão

Agatha Christie se inspirou no caso Lindbergh

Um dos motivos do sucesso do romance “Assassinato no Expresso Oriente”, lançado em janeiro de 1934, foi ter baseado parte da trama em um caso real: o sequestro e a morte, em março de 1932, de Charles Lindbergh Jr., de 1 ano e 8 meses, apesar de o pai, o famoso piloto Charles Lindbergh, ter pago o resgate. O caso provocou comoção mundial. Agatha acompanhou-o pela imprensa e suspeitava que o assassino era um estrangeiro. Para aumentar o interesse, introduziu no enredo figuras e situações análogas às do Caso Lindbergh. O fato se confirmou oito meses após a publicação do livro. O alemão Bruno Hauptmann foi executado na cadeira eletrica em 1936.