E como era de se esperar, o toque mágico bolsonarista deixou sob suspeita a Polícia Federal.

Leio na coluna Painel, do jornal Folha de São Paulo, que as ações do órgão já não são vistas como neutras, mas como tentativas de agradar ou prejudicar o grupo político de Jair Bolsonaro.

É assim, obviamente, com a operação que nesta semana tem entre seus alvos o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, e sua mulher.

Porque Witzel é o político a quem Bolsonaro se referiu como “estrume” na pornochanchada ministerial de 22 de abril. Cabra marcado para morrer.

Porque a deputada federal bolsonarista Carla Zambelli deu a entender, em uma entrevista no Rio Grande do Sul, que estava a par da existência de várias investigações da PF sobre governadores e suas medidas de combate à pandemia do coronavírus. Ela até tentou emplacar um nome para o conjunto de ações, na mesma linha de mensalão e petrolão: Covidão.

Isso não quer dizer que Witzel esteja sendo injustamente perseguido. A investigação no Rio de Janeiro não começou ontem. Se a PF vasculhou o gabinete do governador, é porque o Superior Tribunal de Justiça, reponsável pela condução de ações judiciais que envolvem governadores, autorizou a diligência, enxergando indícios de que Witzel pode mesmo estar envolvido no desvio de recursos destinados à construção de hospitais de campanha no Estado.

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Se Witzel estiver de fato implicado, que seja punido exemplarmente. Será educativo ver um político que se elegeu com um discurso espalhafatoso de combate à corrupção afogar-se na própria hipocrisia.

Mas veja-se a reação ao trabalho da PF. Ao menos dois deputados do Rio de Janeiro, Marcelo Calero (Cidadania) e Alessandro Molon (PSB), querem saber se houve uso político da corporação na investida contra Witzel. Como criticá-los?

Escrevi há alguns dias que não enxergo no vídeo da reunião de 22 de abril elementos que levem Jair Bolsonaro a ser denunciado por interferência indevida na Polícia Federal. Espero ter sido bem compreendido. Disse que uma ação judicial requer provas cabais de que o presidente agiu para desviar a PF de sua missão institucional. A meu ver, essa prova não está na gravação. Talvez esteja disponível no fim da investigação. Veremos o que acontece quando o inquérito for concluído.

O que não fiz foi negar o óbvio, ou seja, a ânsia do presidente em ter na diretoria geral da PF  e na superintendência fluminense policiais com quem se sinta à vontade.

A exposição dessa ânsia é mais do que suficiente para um julgamento político: Bolsonaro não acredita em instituições, não respeita instituições, e não está acima de usá-las em benefício próprio. É possível que esse seja o legado da presidência do ex-capitão — um monte de instituições dilaceradas. A PF já adoeceu.


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