O Tribunal de Contas da União (TCU) forçou Jair Bolsonaro a desmentir uma das suas lorotas.

O presidente disse ontem que um relatório do tribunal sobre a pandemia indicava que 50% das mortes atribuídas ao Covid-19 não tinham nada a ver com o vírus. Como essa afirmação, ou qualquer coisa parecida com ela, simplesmente não consta do estudo, o órgão veio a público desautorizar o presidente.

Na manhã de hoje, Bolsonaro foi obrigado a reconhecer que os tais 50% eram fruto de uma distorção dos dados, feita por ele e seus assessores. Mas como mentir é da sua natureza, ele insistiu em outra afirmação que interessa a ele, mas não está certa. Segundo Bolsonaro, o tribunal demonstrou que prefeitos do país todo inflaram os números da pandemia para receber mais dinheiro federal. Ocorre que até agora o TCU só falou disso como uma hipótese.

Seria muito educativo se o TCU aproveitasse o dia para corrigir outro figurão do governo – desta vez, o ministro do Desenvolvimento Regional Rogério Marinho.

Ele compareceu a uma audiência no Congresso em que foi instado a explicar o Bolsolão, um esquema de distribuição de verbas orçamentárias que vinha acontecendo sem nenhuma transparência, beneficiando de forma desproporcional parlamentares aliados do governo. É dinheiro grande – ao menos três bilhões de reais.

Com grande tranquilidade e a maior cara de pau, Marinho disse aos deputados: “Se está havendo algum problema aí na visibilidade, os senhores são o Parlamento, os senhores têm a iniciativa e a capacidade de aperfeiçoar os instrumentos.”

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Sim, o Parlamento pode “aperfeiçoar os instrumentos”. Mas isso não exime o ministro de respeitar os princípios básicos da administração pública. O Bolsolão fere ao menos dois deles: o da publicidade, ao manter ocultas informações sobre a destinação de verbas, e o da impessoalidade, permitindo que dinheiro público beneficie políticos escolhidos a dedo, sem nenhum critério objetivo.

Marinho tem o dever de lidar com o dinheiro público que está sob sua guarda de forma transparente e impessoal. Essa história de jogar a responsabilidade para o Congresso é pura balela. Se os parlamentares aprovassem uma lei dizendo que ele pode gerir o orçamento sigilosamente, seu dever seria descumpri-la. Como administrador público, as obrigações que ele tem de seguir não mudam.

Quem já cuidou de verbas públicas, mesmo uma fração ínfima dos bilhões que Marinho controla, sabe muito bem que se responder aos órgãos de controle como o ministro,  estará encrencado até o pescoço por muitas décadas. Nenhum pequeno gestor público do Brasil consegue empurrar suas responsabilidades para o vizinho dessa forma leve e descompromissada.

O TCU e o Ministério Público deveriam corrigir Marinho em público de forma enfática. Quando o chefe de uma pasta rica do governo federal diz impunemente uma barbaridade como a de hoje, as consequências são duas: o Bolsolão, malandragem da hora, ganha sobrevida; e os tubarões da administração pública se sentem autorizados a seguir se alimentando como sempre.


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