Bienal Sur – 1ª Bienal Internacional de Arte Contemporânea da América do Sul / 32 cidades de 16 países / até dezembro

Ao divulgar as linhas gerais da 33ª Bienal de São Paulo, prevista para 2018, o curador-geral Gabriel Pérez-Barreiro anunciou que seu projeto é desmantelar o modelo de bienal que vigora no mundo. Isto quer dizer, abdicar de um tema único e do controle curatorial, dividindo a tutela do evento com sete artistas-curadores. Mas se o intuito é buscar um modelo inédito e tratar a arte com olhar mais aberto e não dirigido, a Bienal Sur saiu na frente. Na estrada desde setembro, a 1ª Bienal Internacional de Arte Contemporânea da América do Sul é o evento artístico de maior descentralização que se tem notícia, ao formar uma rede global de colaboração com instituições de 32 cidades de 16 países. O marco zero das ações é Buenos Aires, mas a cartografia do evento inclui França, África, Japão e Austrália, passando por oito países latino-americanos.

A pergunta inevitável é: por que uma bienal que tem a América Latina e o Sul global como foco se estende aos cinco continentes? “Por que construir muros? O mundo todo é aceito. Estamos realizando uma mirada global, a partir de conceitos do Sul”, responde Aníbal Jozami, diretor geral da Bienal Sur e reitor da Universidade Nacional Tres de Febrero (UNTREF), da Argentina. “O norte determinou todas as regras, mas nós podemos repensá-las”, completa Diana Wechler, diretora artístico-acadêmica, que contou com um conselho internacional de 17 curadores para selecionar as obras inscritas em convocatória aberta e repensar as regras que controlam o sistema cultural global.

Qualquer suspeita de ambição exagerada que um evento de proporção planetária como este poderia gerar é dissipada pelo embasamento teórico garantido por intelectuais e pesquisadores ligados a universidades públicas. Apesar do evento assimilar ao seu projeto instituições com programações pré-definidas, a coerência do discurso do projeto Bienal Sur fala mais alto. Integração e diversidade parecem ser as palavras-chaves que orientam os 18.370 quilômetros de raio de ação desta bienal. E o símbolo do desejo de integração das diferentes regiões do mundo é o antigo Hotel dos Imigrantes de Buenos Aires, onde foi estabelecido o quilometro zero do roteiro.

No antigo edifício, reabilitado e gerido pela UNTREF, funciona hoje o Museu da Imigração e o Centro de Arte Contemporânea, que recebe a exposição “Arte Para Pensar a Nova Razão do Mundo”, curadoria de Manuel Borja-Villel com obras do Museu Reina Sofia, de Madri. No corredor central, o estilista mineiro Ronaldo Fraga apresentou na quinta 2, um desfile e homenagem às migrações e às origens dos povos sul-americanos. Estampas com desenhos de diferentes etnias e caligrafias de cartas de imigrantes vestiram um casting de tantas cores e diversidade quanto os projetos da bienal.

Os povos originários das Américas e a silenciada presença negra na cultura argentina foi o objeto da intervenção o artista paulista Ivan Grilo no Museu Histórico Nacional, a 4,4 quilômetros do marco zero. O trabalho propõe uma releitura da história, acentuando a presença de seus atores anônimos. No quilômetro 5,5, no antigo zoológico transformado em Centro de Arte Contemporâneo Eco-Park, a dupla suíço-brasileira Dias & Riedweg realizou a vídeo-instalação “Ventanas del Tiempo”, a partir de registros de 24 horas de cenas vistas através de janelas emblemáticas da cidade. No quilômetro 5,8, o paulistano Eduardo Srur instalou suas “PETS” na boca do Riachuelo de Matanza, o mais poluído rio de Buenos Aires. “Procurei seguir a estrutura ampliada da bienal e distribui as esculturas em rios de duas cidades, no Rio Paraná, em Rosário, e no Rio da Prata e no Riachuelo, em Buenos Aires”, diz Srur à Istoé.

ROTEIROS

Aqui, bem ao Sul / MAB-Centro, SP / até 2/12

A 2.004 quilômetros do Hotel dos Imigrantes, marco zero da Bienal Sur, está a primeira sede brasileira da Bienal Internacional de Arte Contemporânea da América do Sul. São duas intervenções artísticas nos espaços da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. No estado de São Paulo, há três pontos demarcados. O Museu de Arte Contemporâneo de Sorocaba recebe a individual do argentino Eduardo Basualdo e uma intervenção urbana da também argentina Graciela Sacco. Na capital, há duas exposições no Memorial da América Latina e a mostra “Aqui, bem ao Sul”, com obras de artistas em residência artística no Edifício Lutétia, em São Paulo. “Propomos, na mostra, a reflexão sobre esses processos de criação, em deslocamento, como forma contemporânea de produção, na qual conceitos como participação, troca e vida coletiva se tornam peças fundamentais”, diz o professor Marcos Moraes, coordenador da Residência Artística FAAP e dos cursos de Artes Visuais. Finalmente o Rio de Janeiro figura com intervenções na fachada da Fundação Getúlio Vargas, na Praia de Botafogo, e na Estação Central do Brasil. “Tenho total convicção que na próxima edição teremos muitas mais parcerias”, diz a brasileira Marlise Ilhesca, assessora geral do evento.