Abre Alas 14/ A Gentil Carioca, Rio/ até 10/3

A visita à galeria A Gentil Carioca, no centro do Rio, é sempre precedida por uma experiência sensorial. Descer na estação Carioca do metrô e subir a Sete de Setembro até a Praça Tiradentes, ou descer na Presidente Vargas e atravessar o mercado popular do Saara até a Rua Gonçalves Ledo, é ser provocado por intensos e inebriantes estímulos sonoros e visuais. Especialmente em época de Carnaval. Entrar na Gentil, que ocupa um prédio de meados do século 19 e outro do início do século 20, é encontrar no interior da galeria a mesma vibração da rua. Em 2018, A Gentil Carioca faz 15 anos mantendo-se fiel não apenas ao Centro antigo do Rio (em um momento em que as principais galerias brasileiras tentam fugir da crise abrindo filiais em outras cidades e países), como ao espírito original de assimilar novos artistas — e, portanto, trazer novos ares e colorações ao mercado de arte.

Um de seus projetos que melhor refletem esse estado de espírito é o “Abre Alas”, que chega à 14ª edição com uma mostra curada por Clarissa Diniz, Cabelo e Ulisses Carrilho, trazendo 20 artistas sem galeria. O “Abre Alas” foi criado como uma maneira generosa de abrir o calendário da galeria, sempre na véspera do Carnaval, aproveitando as centenas de portfolios de artistas que chegam anualmente à galeria. “É um tesouro que chega às nossas mãos”, diz Marcio Botner à Istoé. Nos cinco primeiros anos, a curadoria do que entraria no “Abre Alas” era feita pelos três sócios, Marcio Botner, Ernesto Neto e Laura Lima. Quando a seleção passou para as mãos de jovens curadores, o projeto lançou novos nomes, hoje super atuantes no eixo Rio-SP, como Bernardo Mosqueira e Paula Borghi.

INVENÇÃO ”Trabalho de Superfície”, de Mariana Paraízo: talento lançado no projeto carioca (Crédito:Pedro Agilson)

Este ano, a seleção foi feita a partir de projetos recebidos de todo o Brasil e outros seis países. Mas a seleção priorizou o artista residente no Rio. Entre os 20 projetos expostos, 16 são do Rio, dois de São Paulo, um de Santa Catarina e um do Espírito Santo. Isso acaba por ressaltar a afinidade que os trabalhos guardam com o espírito das ruas cariocas. E o papel que o “Abre Alas” tem de dar espaço à comunidade local de artistas, fazendo as vezes dos antigos salões de arte, uma instituição em franco desaparecimento.

Nas portas de acesso à galeria, “Entre” (2017), de Danielle Cukierman, convida o visitante a entrar no espaço da arte atravessando cortinas de tiras plásticas de PVC, nas cores básicas (amarelo, vermelho e azul). O campo de cores refere-se tanto aos elementos cromáticos elementares da pintura, quanto às cores predominantes da estética popular ao redor. Outro trabalho que traz o mundo para dentro da galeria é a série “Faixas de rua” (2017), de Thiago Ortiz, feita a partir de pesquisa sobre a visualidade suburbana. Composto por 17 moedas comemorativas do Jogos Olímpicos 2016 (com deformações sofridas ao serem posicionadas nos trilhos do VLT — Veículo Leve sobre Trilhos — e atropeladas pelos vagões), “Legado” (2017), de João Paulo Racy, é uma sagaz reflexão sobre a história recente da cidade, apontando para o estado de deterioração dos equipamentos milionários construídos para as Olimpíadas.

Roteiros
O algoritmo de Volpi

Alfredo Volpi – La Poétique de la Couleur/ Nouveau Musée National de Monaco/ até 20/5

INÉDITA NA EUROPA ”Sem Título” (1962) tela de Alfredo Volpi

Na primeira retrospectiva de Alfredo Volpi (1896-1988) em uma instituição pública fora do Brasil, a curadoria de “La Poétique de la Couleur” reconhece nas clássicas bandeirinhas de festas juninas um “algoritmo” que dá ao pintor a chance de realizar infinitas variações cromáticas sobre um mesmo tema.

Com 70 obras, a exposição prioriza o Volpi maduro e abre mão dos anos figurativos de formação. Sua trajetória é explorada no Nouveau Musée National de Monaco a partir dos anos 1940, quando a atenção do artista se desloca das paisagens urbanas e litorâneas que ele pintava desde os anos 1910 para a estilização das fachadas do casario de cidades do interior. Esta é a década marcante, em que sua pintura ganha um tratamento geométrico e em que o pintor troca o óleo pela têmpera, permitindo a exploração das texturas geradas pelo movimento dos pinceis.

Nas décadas seguintes, surgem as bandeirinhas descoladas da representação das fachadas. Elas se comportam como elementos compositivos autônomos – ou “algoritimos”, como são reconhecidas nesta exposição. Nos anos 1950, o caráter construtivo e a abstração geométrica dominam completamente a obra de Volpi, mas seu vínculo natural com a estética sacra e popular volta à tona em 1958, quando pinta telas com motivos religiosos e afrescos para a Capela Nossa Senhora de Fátima, em Brasília. Todas essas fases estão contempladas na retrospectiva, até os anos 1970, quando as composições de bandeirinhas são intercaladas com mastros de festas do interior.

A mostra prevê um catálogo co-editado pela Editora Capivara e a Mousse Publishing. Para escrever sobre este filho de imigrantes italianos, nascido em Lucca e instalado em seu primeiro ano de vida no bairro do Cambuci, em São Paulo, os editores convocaram o curador Cristiano Raimondi e a novíssima geração de imigrantes italianos em São Paulo, Jacopo Crivelli Visconti e Lorenzo Mammì, curador do IMS Paulista. PA