EM CIMA DO MURO Daniela Reinehr toma posse como governadora; à dir., a piscina na casa do professor de história Wandercy Pugliese (Crédito:Julio Cavalheiro e Divulgação)

Há 75 anos Hitler era derrotado na Alemanha. Desde então, centenas de documentos, relatos, fotografias e vídeos gravados nos campos de concentração não deixam nenhuma dúvida: o Terceiro Reich, levado por teorias geneticistas equivocadas, decidiu matar seis milhões de seres humanos. A “solução final”, como ficou conhecida a ordem de dizimar os judeus da Europa, teve consequências psicológicas e diplomáticas que alteraram a dinâmica do planeta. Negar isso é crime. Mas a governadora interina do governo de Santa Catarina, Daniela Reinehr, considera o tema uma questão de mera opinião pessoal e se recusou a dizer a sua posição sobre o nazismo.

“A história oficial considera Hitler o causador da 2ª Guerra. Isso vem sendo questionado por historiadores de renome” – Altair Reinehr, historiador revisionista (Crédito:Divulgação)

A importância desse silêncio é imensa em um estado que, segundo estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), reúne a maior concentração de grupos neonazistas do país. O detalhe? O pai de Daniela, Altair Reinehr, é professor de História e admirador do nazismo. Em suas redes sociais, reclama sobre o fato de não poder defender “as obras positivas” de Adolf Hitler ou ressaltar os supostos 90% de aprovação popular que o ditador teria junto ao povo alemão. Além disso, Altair Reinehr testemunhou a favor de Siegfried Castan, condenado por racismo ao publicar livros antissemitas. Ao ser questionada na cerimônia de posse, terça-feira 27, se concordava com o pensamento do pai, Daniela deu uma resposta genérica e não falou o que pensa sobre a questão. Alegou que não poderia ser “julgada por atos de terceiros”, referindo-se ao governador Carlos Moisés, afastado por corrupção na compra de respiradores. Produtora rural e policial militar, Daniela assume o cargo do qual era vice com a força e a fúria de uma boa bolsonarista.

Santa Catarina é um estado atípico mesmo se comparado com seus vizinhos, Rio Grande do Sul e Paraná. Conservador e com forte presença da colonização europeia, o estado possui um forte sentimento de orgulho por ser europeu. Festas típicas que honram a cultura alemã, italiana e pomerana mostram um local repleto de lembranças da imigração do século 19. “Não é possível resumir a questão falando somente da imigração, há vários fatores que levam Santa Catarina a ser um estado pró-branco. Há uma conivência do sistema educacional em negar o Holocausto”, diz a antropóloga da Unicamp, Adriana Dias, uma das maiores pesquisadores sobre o tema no País. Ela explica que o problema é cultural e relembra o caso de outro professor negacionista, Wandercy Pugliesi. O professor ficou famoso quando uma imagem de sua piscina com uma enorme suástica ao fundo correu o mundo. “A Alemanha se ‘desnazificou’, mas Santa Catarina não”, diz.