A cada dois anos um arrepio e estranhamento são tomados nas apresentações bizarras registradas no horário eleitoral gratuito brasileiro, que teve início nesta sexta-feira, 9. E aqui não se coloca em questão as propostas e a falta de preparo dos candidatos. Nas eleições proporcionais para vereador fica tudo ainda mais potencializado. O horror inclusive não é uma figura de linguagem. Digno de um script de José Mojica Marins, mais conhecido como Zé do Caixão, já estão pelas ruas e nas telas de TV os personagens mais curiosos da política.

OTIMISMO Capitã Cloroquina já foi alvo de abacaxi nas ruas, mas crê na vitória (Crédito:Divulgação)

É inspirado no próprio Zé do Caixão e utilizando a cartola presenteada por ele que Toninho do Diabo pretende se eleger. Ele já foi candidato a vereador em Jundiaí e candidato a deputado estadual, mas não consegue dizer nem quantos votos teve. Os seus bordões se misturam e transitam entre um misto de circo e horror. “A coisa tá feia, a coisa tá preta: então vota logo no capeta”, argumenta o candidato, cujo nome é Antônio Aparecido Firmino. Ele se intitula um artista popular brasileiro, além de cineasta. Por isso, é o representante da cultura e já tem no setor do entretenimento seu foco. “Se a igreja não paga impostos, balada também não vai pagar”, disse Toninho. Ele frisa que gosta de circo, mas que lá ele faz o papel de diabo. “Não sou mandrake para sumir com o dinheiro do povo”, brincou.

Candidatos com o mesmo perfil tragicômico surgem aos montes. E não é uma novidade no Brasil. Em 1959, essa tradição de candidatos bizarros foi inaugurada. O rinoceronte Cacareco recebeu cerca de 100 mil votos para vereador na cidade de São Paulo. Posteriormente, em 1988, na cidade do Rio de Janeiro, o macaco Tião alcançou mais de 400 mil votos para prefeito. Na época, o voto era feito em cédulas de papel e o papel aceita tudo. A cientista política Debora Gershon diz que a sátira é utilizada particularmente em eleições proporcionais. Com o fim das coligações o número de candidatos é maior e os partidos ficam mais vulneráveis a essas candidaturas. “O voto pouco informado, e de protesto, é o que garante o voto mais anedótico. Também há a tentativa de desacreditar o sistema”, disse a cientista política.

No embalo do humor, a candidata à Prefeitura de Ribeirão Pires, Marisa das Casas Próprias, sobrevoou a cidade acompanhada da sua mascote Fofoquinha. Marisa Reinoso diz que os jornais locais faziam muitas fofocas contrárias à sua candidatura. Ela era motivo de chacota e apelidada por “Ana Maria Brega” ou “Marta Suplicy de Ribeirão”. A equipe de comunicação resolveu fazer um voo com a Fofoquinha. “Foi audácia, um voo de liberdade”, disse Marisa. Ao estilo super-heroína, com capa e tudo, ela viralizou na caça aos corruptos. A candidata foge à regra da maioria dos que utlizam o humor: ela disputa um cargo ao Executivo.

“Nunca fui candidata, mas há 12 anos sou assediada pelos partidos. Tive que utilizar criatividade. Sou uma mulher anônima que quer entrar nos lares de Ribeirão” – Marisa da Casa Própria, candidata a prefeita de Ribeirão Pires (Crédito:Gabriel Reis)

Menos engajado e com slogan mais direto o ator pornô Kid Bengala utiliza na sua publicidade elementos da profissão que o deixou famoso. “Esse é pau pra toda obra”. Ele já foi candidato em outras oportunidades a vereador e deputado estadual. Em Santa Maria da Vitória (BA), o candidato a vereador Neguinho do Celular, faz sua propaganda de uma forma que desagrada a gregos e troianos. Ele fez seu santinho com Lula de um lado e Bolsonaro do outro. Tão bizarros quanto e menos criativos surgem aqueles que apelam para nomes chulos , muitos com palavrões e símbolos escatológicos. A baixaria está garantida.Tentando ser engraçado, mas conseguindo constranger a todos sem qualquer filtro. O candidato a prefeito Eunélio Mendonça, de Santo Antônio dos Lopes (MA), divulgou um vídeo que pede para mudos discursarem em atividade partidária. A busca por atenção não tem limites.

Outro personagem que certamente chamará atenção na eleição é a Capitã Cloroquina, candidata a vereadora na cidade do Rio de Janeiro. Regina Célia Sequeira escolheu seu nome em homenagem ao presidente Bolsonaro. Ela já fez teatro e sempre gostou de política. Desde 2004 ela disputa eleições. “As pessoas já me jogaram abacaxi. Mas, hoje qualquer partido me quer”, disse a Capitã Cloroquina. Já foi Zefa das Cavernas, Pokezefa, Zefa de Neve, Zefa Brown e Zefa Emergente. A candidata acredita que agora ganha.

Todos os personagens ouvidos por ISTOÉ lembraram do palhaço e deputado Tiririca, e a popularidade do parlamentar é incentivo para as suas candidaturas. Mas o fato é que a popularidade do deputado é incentivo para as candidaturas. Em regra, a estratégia de apelar para o humor é conciliada com a falta de um projeto político. A fragilidade das candidaturas é evidente.