A morte de Wayne Shorter deixa um silêncio na música que não será ocupado por ninguém. O saxofonista norte-americano foi único no mundo do jazz, não apenas pela variedade de artistas com quem trabalhou, nem pelas dezenas de clássicos que eternizou em estúdio, mas por seu estilo aveludado que confortava os ouvidos, e um timbre tão incrível que deixava o público hipnotizado imaginando qual seria a próxima nota em tantas sequências perfeitas.

Wayne Shorter não tocava nem mais nem menos do que a música exigia: tocava apenas a melodia que queríamos ouvir. Ao contrário de muitos de seus pares, ele nunca se preocupou em ser o mais rápido ou o mais radical, nem pensava no rótulo de virtuoso, que tanto afetou outros nomes menos talentosos.

Shorter, ao contrário do nome, teve uma longa carreira. Começou nos anos 1960 e gravou com literalmente todo mundo. Tocou com os Jazz Messengers de Art Blakey, com os revolucionários do Weather Report e com o quinteto inesquecível de Miles Davis. Foi conhecido como o “saxofonista de Miles Davis”, mas é claro que foi muito mais que isso.

Difícil destacar seus melhores trabalhos, mas vamos lá. Brilhou no “Bitche’s Brew”, disco em que Miles mudou a música (mais uma vez) ao criar o jazz fusion. Tocou em “River”, Imagine Project” e dezenas de outros discos de Herbie Hancock, seu melhor amigo. Tocou ainda com os Rolling Stones, Joni Mitchell, Santana.

Era generoso com os jovens. Emprestou sua credibilidade e experiência a Lakecia Benjamin, assim como ao quarteto francês Quatuor Ébène, com quem também lançou “Brazil”. Já os brasileiros se lembrarão dele pelo álbum “Native Dancer”, parceria com Milton Nascimento, em 1974. Do artista mineiro, participou também de “Yauaretê”, em 1987. Ficaram amigos até o fim: Milton o visitou no ano passado, quando se apresentou na cidade em que ele morava, Los Angeles. Encontraram-se pessoalmente, mas o saxofonista já estava com a saúde debilitada e não pode ir ao show.

A última nota de Wayne Shorter saiu de seus pulmões na última quinta-feira, 2 de março. Ele tinha 89 anos de vida e mais de 60 de saxofone.