Lula e Bolsonaro atacaram hoje, quase ao mesmo tempo, a ideia da terceira via. Ambos disseram que ela não existe..

Isso é verdade neste momento. Não é necessariamente verdade para as eleições de 2022.

Mais do que constatações óbvias sobre o instante político, suas falas escondem o desejo ardente de que não surja uma alternativa. São como as batidinhas na madeira dos supersticiosos, para acordar os deuses e esconjurar o perigo.

Eis o texto que Lula publicou no Twitter:

“A terceira via é uma invenção dos partidos que não têm candidato. Falam em polarização… O que tem de um lado é democracia e do outro é fascismo. Quem está sem chance usa de desculpa a tal da terceira via.”

Há dois problemas nesse post. O primeiro é que ele exclui os eleitores da equação. Não é o ponto de vista “dos partidos que não têm candidato” que interessa. O que interessa é a existência de eleitores que não estão ideologicamente alinhados nem com o lulismo nem com o bolsonarismo.

Eles existem. Variadas pesquisas recentes mostram que são, ao menos, 30% do eleitorado. São essas pessoas que importam, são elas que não têm candidato – ainda.

O segundo problema é Lula dizer que representa a democracia. Bolsonaro é inaceitável. Mas conformar-se com a declaração de Lula, há quinze meses das eleições, significa conformar-se com uma versão muito rebaixada daquilo que a democracia pode ser.

É aceitar que a democracia não pode oferecer nada melhor que um populista de esquerda que faz genuflexão diante da ditadura cubana; um ex-presidiário que vai escapando de novas condenações por questões processuais, e não porque sua inocência tenha sido provada no mérito; um corruptor, que participou de esquemas de desvio de dinheiro público de uma magnitude inédita, para garantir a permanência de seu partido no poder.

Não, definitivamente: há quinze meses da eleição, não é possível abrir mão da esperança que a democracia brasileira possa ter algo melhor a apresentar.

Vejamos as declarações de Bolsonaro:

“Terceira via? O povo não engole isso aí. O vaselina… O vaselina não vai dar certo, não vai agregar, não vai atrair simpatia da população. Não existe terceira via, está polarizado.”

Bolsonaro tem razão. A terceira via não vai emplacar se for vaselina, ou seja, se fugir de  posições firmes; se tiver cheiro de centrão; se for sonsa, tentando disfarçar o oportunismo.

É patético ver Rodrigo Pacheco encantado com a ideia de ser candidato à presidência, que Gilberto Kassab lhe soprou no ouvido.

Dias atrás eu elogiei sua crítica aos arroubos golpistas de Bolsonaro. Como presidente do senado, ele fez aquilo que seu cargo exigia. Espero que continue usando esse uniforme.

Mas aquele também foi, provavelmente, seu primeiro passo como aspirante a candidato – um esforço para criar uma distância entre ele e o governo Bolsonaro. Não vai dar certo, porque os eleitores sabem que primeiro veio a adesão ao projeto bolsonarista. Porque Pacheco tem cheiro de centrão.

Uma terceira via no Brasil de hoje precisa ser exasperada, indignada, até mesmo raivosa. Não pode ter salamaleques. Precisa rejeitar com muita força e clareza aquilo que Lula e Bolsonaro representam na política. Mas não pode ficar só na negação. Precisa ter algo de construtivo a dizer sobre educação, algo para aqueles que estão sem emprego, para os que querem empreender. É difícil, mas não impossível.

O que não for Lula nem Bolsonaro será bom para o Brasil. É preciso haver uma terceira via.