Há exatamente um mês, no dia 26 de outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seu homólogo americano, Donald Trump, se encontraram para iniciar as negociações acerca da principal pendência bilateral entre as nações: as tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos sobre produtos nacionais.
Por ser uma pauta delicada, a reunião foi realizada em uma zona neutra – ou seja, um território que não oferece vantagem diplomática para nenhum dos lados. A cidade escolhida foi Kuala Lumpur, na Malásia, aproveitando a passagem dos líderes na cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN).
Pouco antes disso, na reunião da Assembleia-Geral da ONU em setembro, os dois presidentes chegaram a se encontrar e já sinalizar uma abertura para o diálogo. “Eu o vi, ele me viu e nós nos abraçamos”, disse Trump sobre Lula. “Nós concordamos que nos encontraremos na próxima semana”.
A novela entre EUA e Brasil contou com um esfriamento vagaroso, que envolveu esforços políticos de ambos os países. Desde o princípio, o objetivo de Lula era claro – a reversão das tarifas de exportações sem uso de agressividade, apostando em estratégias diplomáticas. O sucesso da tática foi observado no dia 21 de novembro, pouco menos de um mês após a reunião dos dois líderes, com a retirada das taxas de 40% de 249 produtos brasileiros.
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A crise entre Lula e Trump
A problemática protecionista de Trump começou ainda em em abril de 2025, com imposição de alíquotas gerais de 10%. Contudo, a situação escalou drasticamente em julho, quando os EUA decretaram taxas adicionais de 40% sobre mercadorias brasileiras. A Casa Branca justificou a medida como retaliação, alegando que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estava sofrendo “perseguição política” no Brasil devido ao julgamento da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF). Na ocasião, o presidente americano chegou a citar uma suposta “caça às bruxas” contra seus aliados.
A reposta de Lula foi imediata, adotando postura de combate frente aos decretos norte-americanos. O governo federal capitalizou a narrativa da “soberania nacional” – inclusive como nova bandeira de campanha – e continuou defendendo o curso do processo contra Bolsonaro. O rebote diplomático do petista foi amplamente repercutido na mídia internacional, que destacou o presidente como negociador eficaz.
O que mudou desde a reunião de outubro?
Tarifas sobre exportações brasileiras

O presidente dos EUA, Donald Trump, segura decreto das tarifas na Casa Branca em Washington, D.C., EUA
Na reunião de outubro, Lula e Trump concentraram esforços em resolver o “tarifaço” de até 50% imposto pelos EUA sobre centenas de produtos nacionais, com o Brasil pressionando por uma suspensão imediata durante as negociações. A diplomacia brasileira saiu do encontro otimista, alegando que Trump havia orientado sua equipe a iniciar rapidamente tratativas técnicas, e esperava-se que um acordo fosse alcançado em poucas semanas.
Desde então, o governo norte-americano anunciou a reversão parcial das tarifas, retirando 249 produtos brasileiros da sobretaxa de 40% no dia 21 de novembro, o que representa alívio para cerca de 51% das exportações. No entanto, 22% das vendas brasileiras seguem pagando a taxa adicional e outros 27% continuam sob tarifas setoriais como a Section 232 (aço, alumínio, móveis). Ainda assim, a redução retroativa – com possibilidade de reembolso de valores já pagos – foi celebrada como o primeiro resultado prático do diálogo iniciado em outubro.
Sanções a autoridades

O ministro do STF Alexandre de Moraes e o presidente dos EUA, Donald Trump
Quando Lula se encontrou com Trump em outubro, um dos pontos sensíveis foi a discussão sobre as sanções aplicadas a autoridades brasileiras sob a Lei Magnitsky, tema trazido à tona pelo caso de Jair Bolsonaro. O governo brasileiro afirmou então que o Judiciário é independente e procurou diminuir a tensão política, sinalizando disposição para conversar sobre o assunto no âmbito mais amplo da reaproximação diplomática.
Contudo, ao longo de novembro, as atualizações mostram que, ao contrário das tarifas, não houve movimento equivalente no campo das sanções individuais. O ministro do STF Alexandre de Moraes, por exemplo, não foi retirado da Lei Magnitsky e segue proibido de viajar aos EUA.
Interesses estratégicos, minerais e crise na Venezuela

Lula e Trump
Além do comércio, a reunião de outubro abriu espaço para conversas mais estratégicas sobre minerais críticos, cadeias tecnológicas, biocombustíveis e até o papel do Brasil como mediador na crise com a Venezuela – gesto que Lula usou para reforçar a utilidade diplomática de Brasília.
Ao longo de novembro, as negociações técnicas continuaram e o vice-presidente Geraldo Alckmin afirmou que os entraves relacionados à importação de biocombustíveis dos EUA para solo nacional estão “praticamente resolvidos”, enquanto setores como data centers, tecnologia e minerais estratégicos foram incorporados à pauta de negociação com os americanos. Apesar disso, as demais iniciativas – como a parceria formal em minerais raros ou uma mediação ativa no atrito venezuelano – ainda não se materializaram.