A Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira, 20, o PL 2628/2022, que ficou conhecido como projeto contra a “adultização” e versa sobre mecanismos para a proteção de crianças e adolescentes em ambientes virtuais. A proposta, apesar de já ter passado pelo Senado, deve retornar para análise dos senadores por ter sido sancionada com mudanças.
O PL tem como autor o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) e teve como relator na Câmara o deputado Jadyel Alencar (Republicanos-PI). O texto passou com urgência após a repercussão de um vídeo feito pelo youtuber Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca, com denúncias sobre exploração infantil no ambiente virtual.
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Uma das mudanças do projeto aprovado na Câmara é relativa a previsão de uma autoridade nacional autônima, entidade da administração pública que será responsável por zelar, editar regulamentos e procedimentos e fiscalizar o cumprimento da nova legislação.
Com 16 capítulos e 41 artigos, o texto obriga as plataformas digitais a tomarem medidas “razoáveis” para prevenir riscos de crianças e adolescentes acessarem conteúdos ilegais ou considerados impróprios para essas faixas etárias, como exploração e abuso sexual, violência física, intimidação, assédio, promoção e comercialização de jogos de azar, práticas publicitárias predatórias e enganosas, entre outros crimes.
Um dos pontos abordados no no projeto é a “prevenção desde concepção”, para a inclusão de medidas protetivas a crianças e adolescentes desde que plataformas digitais sejam estabelecidas.
Luiz Fernando Plastino, advogado no escritório Barcellos Tucunduva Advogados e especialista em Propriedade Intelectual, Privacidade e Proteção de Dados e Direito de Informática, explica que o texto implica em mudanças de processos de desenvolvimento do software. “Requer repensar todo o desenvolvimento do produto, mas é algo similar ao que outras leis já exigem”, comenta.
Além disso, o advogado e presidente da Comissão Especial de Direito do Turismo, Mídia e Entretenimento do Conselho Federal da OAB, Marco Antônio Araújo Júnior, acrescenta que a “prevenção desde concepção” envolve ativar configurações mais protetivas automaticamente, reduzir recursos que induzam uso compulsivo de redes sociais, gerenciar riscos à saúde e segurança, classificar conteúdo por faixa etária e impedir encontro de conteúdo ilegal, nocivo ou inadequado.
“Para redes sociais, há ainda o dever de vincular contas de crianças ao responsável e aprimorar continuamente mecanismos de verificação de idade. O texto aprovado prevê vacatio legis de um ano, permitindo às plataformas atualizar sistemas, políticas e interfaces antes da exigibilidade”, pontua Araújo Júnior.
Verificação de idade e supervisão parental
A proposta de lei também prevê regras para supervisão dos pais e responsáveis e exige mecanismos mais confiáveis para verificação da idade dos usuários de redes sociais, o que atualmente é feito basicamente por autodeclaração.
Alexandre Coelho, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Digital e Cibersegurança, entende que as mudanças no texto que versam sobre o monitoramento de menores pelos responsáveis representam um “avanço importante”. “Hoje, os mecanismos de supervisão parental estão fragmentados em sistemas operacionais e lojas de aplicativos, mas raramente dentro das próprias plataformas onde o problema acontece. Torná-los nativos é não apenas possível como necessário.”
Araújo Júnior ressalta que o projeto trata sobre a autenticação da idade dos usuários de redes sociais, que poderá, em alguns casos ser feita por uma confirmação dos responsáveis “inclusive por apresentação de documento de identidade válido”, desde que os dados coletados sejam usados “exclusivamente para verificação”.
“Lojas de aplicativos e sistemas operacionais também têm deveres: aferir faixa etária, oferecer APIs para sinal de idade com minimização de dados e permitir aos pais configurar supervisão no nível do sistema”, conclui o advogado, acrescentando que há “previsão expressa” de que o download de aplicativos por menores dependa de “consentimento livre e informado” dos responsáveis.
Para Coelho, a exigência de documentos de identidade é a “solução rápida”, mas “abre a porta para a coleta massiva de dados sensíveis”. “A saída está em métodos proporcionais e menos invasivos, como autenticação por terceiros de confiança (identity providers) ou sistemas de estimativa etária por inteligência artificial auditável“, propõe o especialista em Direito Digital e Cibersegurança.
Segundo Plastino, as plataformas informarem se seus serviços são adequados a crianças e adolescentes é a medida “mais simples de se implementar”. “Como o projeto também obriga a avaliação de conteúdo por faixa etária, as plataformas terão de combinar rotulagem/avisos com processos de classificação e moderação, observando padrões que serão detalhados em regulação”, indica o especialista em Propriedade Intelectual.
*Com informações da Agência Brasil