O que move e o que barra a cruzada de Lula pelo ‘novo pré-sal’

Ricardo Stuckert/PR
O presidente Lula (PT) na primeira exploração do pré-sal, em 2008 Foto: Ricardo Stuckert/PR

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enfatizou nesta semana a importância para o governo de que a Petrobras obtenha a licença ambiental para realizar estudos de exploração de petróleo na Margem Equatorial, região com 16 poços em uma área que se estende pela costa de seis estados.

“Nós precisamos autorizar que a Petrobras faça pesquisa [na Margem Equatorial], é isso que queremos. Se depois vamos explorar é outra discussão, o que não dá é ficar nesse lenga-lengaO Ibama é um órgão do governo, e parece que é um órgão contra o governo”, disse o petista em entrevista na quarta-feira, 12.

Neste texto, a IstoÉ explica o potencial econômico que a petroleira mapeou na região e quais são os fatores que movem — e interrompem — a cruzada de Lula.

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O passado explica

O presidente comprou uma briga que já era travada pelos ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil, Rui Costa, além do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e pela própria petroleira, que classifica o projeto como o “novo pré-sal”, em alusão à descoberta que alavancou a indústria brasileira de combustíveis às vésperas da reeleição deste mesmo Lula, em 2006.

A comparação ajuda a explicar o desejo do petista. Neste início de 2024, a economia registra indicadores de pleno emprego e crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), mas o governo vê sua popularidade em quedaa aprovação de Lula caiu para 24%, a pior de todos os seus mandatos, segundo o Datafolha — e a inflação preocupa a menos de dois anos de uma nova eleição presidencial.

“O governo não tem mais munição fiscal e há uma elevação na taxa de juros. Se a economia desacelerar, como é esperado, haverá uma razão ainda mais forte para queda na aprovação“, disse à IstoÉ Marcelo Neri, professor de economia da FGV-RJ (Fundação Getulio Vargas) e ex-presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

O potencial assombra

Pressionado pelo que vislumbra, Lula vê na Margem Equatorial a perspectiva de exploração de 10 bilhões de barris de petróleo, uma cadeia de criação de até 350 mil empregos e uma oportunidade sólida de atrair investimentos estrangeiros, conforme projeções do Ministério de Minas e Energia.

O que move e o que barra a cruzada de Lula pelo 'novo pré-sal'

Mapa da Petrobras mostra a região de bacias na foz do Amazonas (região superior)

Mais do que isso, o Planalto encara a possibilidade de evitar nova fadiga. A pasta projeta que, com o bolsão atual de reservas, o Brasil corre risco de voltar a ser um importador de petróleo entre 2036 e 2039, cenário que afasta investidores e restringe o poderio econômico do país no cenário internacional.

À IstoÉ, o diretor do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), Adriano Pires, disse haver uma justificativa clara para a mobilização do governo pela exploração e considerou o Ministério de Minas e Energia correto ao tratar a região como o “novo pré-sal”. E Lula, como já se ouviu, não nega o desejo de entregar um governo que seja um “espelho melhorado” de seu primeiro.

A coisa não anda

Mas há um obstáculo. O Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) indeferiu os pedidos da Petrobras para prosseguir com os estudos de viabilidade em razão dos riscos embutidos à biodiversidade da Margem Equatorial.

Segundo o Observatório do Clima, a região abriga um ecossistema recifal formado por rodolitos, bancos de algas carbonáticas existentes em outras regiões do Atlântico Sul, que servem de habitat para peixes e outras criaturas marítimas. Publicações científicas apontaram que o recife está vivo e é essencial para a reprodução e alimentação de animais típicos — e comercializados — no Norte.

Carlos Bocuhy, presidente do Proam (Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental), afirmou à IstoÉ que o avanço de estudos exploratórios “impacta não só pela extração, mas pela geração de gases efeito estufa que provocam o aquecimento global”. A avaliação para isso deve “obedecer aos critérios de segurança ambiental e se reportar à mesma alternativa locacional, uma região com sistema ecológico frágil“, concluiu.

Nesta linha se posiciona o Ibama, à revelia do Executivo. Para Adriano Pires, há uma “ideologia que demoniza o petróleo” e “um certo ambientalismo xiita” na resistência ao aval.

Ex-presidente da autarquia e coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo disse à IstoÉ que a negativa não tem razões políticas, visto que a equipe de licenciamento do órgão é “preparada tecnicamente e já concedeu mais de duas mil licenças de perfuração”.

Cabe questionar as razões de a Petrobras demorar anos para cumprir as exigências que a empresa sabe que são necessárias em um processo desse tipo”, prosseguiu. A petroleira, por sua vez, argumentou que fez e entregou ao Ibama os resultados de estudos de identificação dos possíveis impactos ambientais e se propôs a promover medidas de mitigação, controle e monitoramento dos impactos da atividade.

O que move e o que barra a cruzada de Lula pelo 'novo pré-sal'

O presidente Lula (PT) e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva: entrevero à vista

A Petrobras tem o Planalto a seu lado e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, cada vez mais isolada na ponta contrária do governo — o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, não tem apoio nem do próprio partido (o PSB) na cruzada.

Nesta sexta-feira, 14, Lula voltou a tocar no tema e afirmou que sua ministra “jamais será contra” a exploração de petróleo na Margem Equatorial, porque “é uma pessoa muito inteligente”. “O que ela quer não é não fazer, [se atentar a] como fazer. Como fazer para a gente não ser predatório com a nossa querida Amazônia”, afirmou, em entrevista a uma rádio.

Em 2008, vale lembrar, Marina deixou deixou a Esplanada sob este mesmo Lula por falta de endosso do Planalto a medidas de combate ao desmatamento na Amazônia. Os dois só voltaram a se aproximar nas eleições de 2022.