PRISÃO Eduardo Imperador é apontado como líder do esquema criminoso (Crédito:Divulgação)

A Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), estatal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional, já virou um símbolo das artimanhas políticas associadas ao orçamento secreto orquestrado pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo presidente da Câmara, Arthur Lira. Com a função original de entregar obras de irrigação na região do Semiárido, a empresa se descaracterizou completamente e passou a fazer de tudo, desde instalações para saneamento básico, obras de pavimentação, construção de pontes até entrega de máquinas e equipamentos, com o objetivo de agradar lideranças regionais e angariar votos. Com ação capitalizada junto às prefeituras e com projetos de grande apelo eleitoral, virou, de 2020 para cá, um núcleo de distribuição de verbas do Centrão. A fatia do orçamento da estatal para ser distribuída entre emendas de deputados e senadores dobrou em 2022, saltando de R$ 610 milhões para R$ 1,2 bilhão, de um total de R$ 2,7 bilhões de verbas para este ano. Desvios já foram detectados em aquisições e projetos da empresa nos estados do Maranhão e da Bahia. Na Bahia, a Controladoria Geral da União (CGU) divulgou um relatório que aponta para a compra superfaturada de milhares de tubos de PVC.

A fatia do orçamento da estatal para ser distribuída entre emendas parlamentares saltou de R$ 610 milhões para R$ 1,2 bilhão

Começam a aparecer também os nomes de alguns operadores do esquema. Numa operação da Polícia Federal, batizada de Odoacro e realizada no final de julho no Maranhão, foi preso o empresário Eduardo José Barros Costa, chamado Eduardo Imperador. A PF o aponta como líder do esquema criminoso para desvio de dinheiro da Codevasf por meio de fraudes em licitações que beneficiaram a empreiteira Construservice, empresa que usa laranjas para vencer concorrências de pavimentação com verbas da estatal e que teria Imperador como “sócio oculto”. Ele foi solto pela Justiça Federal depois do pagamento de uma fiança de R$ 121,2 mil, correspondente a 100 salários mínimos, e está sendo obrigado a usar tornozeleira eletrônica. Continua sendo investigado.

INVESTIGAÇÃO O deputado licenciado Josimar Maranhãozinho é acusado de operar o desvio de emendas parlamentares para o Codevasf (Crédito:Gilmar Felix)

Outro personagem revelado nas investigações policiais é o deputado licenciado Josimar Maranhãozinho (PL-MA). Relatórios de Inteligência Financeira analisados pela PF mostraram que a construtora Madry, da qual Maranhãozinho é proprietário, transferiu R$ 100 mil para a E.R. Distribuição de Asfalto, que tem mais uma vez Imperador entre seus donos. Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, a investigação encontrou outros repasses de R$ 215 mil da Águia Farma, outro negócio de Maranhãozinho, para a Construservice. A PF investiga se o deputado está por trás do desvio de emendas parlamentares para a Codevasf.

As provas de uso indevido da estatal para atender demandas de deputados e senadores se acumulam e revelam vários esquemas simultâneos com repetidas denúncias de superfaturamento e de obras encomendadas a partir de emendas para o orçamento secreto. No caso da compra dos tubos de PVC, a CGU apontou irregularidades e recomendou a suspensão do negócio, mas, mesmo assim, a Codevasf desembolsou R$ 2 milhões na aquisição. A empresa está atrelada à cúpula do Congresso e envolvida em negociatas políticas sem seguir qualquer critério de transparência. Desde o final do ano passado as denúncias contra a empresa vêm se acumulando, mas a primeira ação concreta para investigação dos crimes foi a operação da PF. Em abril, o PSOL pediu ao MPF a apuração de irregularidades em licitações realizadas pela Codevasf que favoreceram a empreiteira Engefort. Na representação, o partido pediu à Procuradoria-Geral da República (PGR) providências administrativas, civis ou penais contra Bolsonaro, Rogério Marinho, ex-ministro do Desenvolvimento Regional, Marcelo Moreira, presidente da Codevasf, e contra os sócios da Engefort. Ao longo do governo Bolsonro, a empresa pública teve atuação ampliada e recursos turbinados por emendas do relator. Virou a estatal do orçamento secreto, que atende interesses de deputados e senadores e faz de tudo, menos obras de irrigação na região do Semiárido.