Inspirado no sistema criado pelo mestre russo Konstantin Stanislavski, o “Método Stanilavski” é baseado na entrega total do ator ao personagem por meio de um processo disciplinado e imersivo. É uma técnica popular em Hollywood, adotada por astros como Marlon Brando, Robert De Niro e Al Pacino. “O Método Kominsky”, por sua vez, é ensinado com maestria por um único ator: Michael Douglas.

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ELENCO Katlheen Turner e Sarah Baker: diversão em cena (Crédito:ERIK VOAKE/NETFLIX)

Douglas interpreta mais uma vez o dono de uma escola de atuação, personagem que já lhe rendeu o Globo de Ouro

A série criada por Chuck Lorre (de “The Big Bang Theory” e “Two and a Half Man”) estreia sua terceira e última temporada nessa sexta-feira 28. Douglas está mais uma vez no papel de Sandy Kominsky, dono da escola de atuação que leva seu nome. Agora, porém, ele não conta com o apoio do amigo Norman Newlander (Alan Arkin), co-protagonista das temporadas anteriores. O elenco tem Katlheen Turner, no papel de ex-mulher de Sandy, além de Haley Joel Osment, neto de Norman – um divertido pastor da igreja da Cientologia, crença seguida por muitas celebridades de Hollywood. A série é de comédia, mas, como é marca registrada de Chuck Lorre, há sempre um ‘twist’ emocional que deixa os espectadores com um nó na garganta.

A premissa de “O Método Kominsky”, sem spoilers, é mostrar o dia a dia de Sandy e os problemas que afetam um homem de mais idade. Há na interpretação de Douglas uma dignidade de certa forma heróica e humilde, uma vez que ele encara as cenas com bom humor – e nem sempre haveria motivos para sorrir. Em cenas que vão dos problemas na performance sexual à insegurança diante de novos desafios profissionais, Douglas se entrega ao personagem sem se preocupar com a imagem de símbolo sexual que construiu durante tanto tempo. Isso é o ponto forte da série: ao integrar o personagem Sandy a sua própria persona, Michael Douglas encara uma espécie de meta-atuação que torna a série deliciosa. Quem sofre ali é Sandy, mas poderia ser o próprio Douglas: só um ator de talento (e elevada autoestima) encararia um personagem assim.

Dinastia de Hollywood

A verdade é que Michael Douglas se diverte. Como ator, não precisa provar nada para ninguém. Já venceu diversos prêmios, entre eles o Oscar, intepretando seu personagem mais maldito: o investidor Gordon Gekko, de “Wall Street” (1987). Com o sucesso de público e crítica, atingiu uma de suas metas de vida: sair da sombra do pai, Kirk Douglas, um dos maiores atores da história do cinema. Após uma vida dedicada a filmes eternos como “Spartacus”, “Glória Feita de Sangue” e “A Montanha dos Sete Abutres”, o ator morreu em 5 de fevereiro de 2020, aos 103 anos.
Michael Douglas dedicou-se tanto à carreira que acabou deixando de lado a vida familiar – fato que pode ter contribuído para uma tragédia que quase o derrubou: o problema com drogas de Cameron Douglas, seu filho. Hoje com 42 anos, o também ator caiu no vício ainda adolescente, e a espiral da dependência o levou a ser preso em uma penitenciária federal por sete anos, de 2009 a 2016 –, ele chegou a passar dois anos muma solitária. Ao sair da prisão, conheceu a paulista Viviane Thibes, atriz e professora de yoga: hoje são casados e tem dois filhos, Lua, de dois anos, e Ryder, de cinco meses.

“O Método Kominsky”está em sua última temporada, mas Michael Douglas segue na ativa. Prepara-se para mais um filme como o cientista da franquia “Homem-Formiga”, da Marvel. É um papel bem diferente de “Atração Fatal”, “Instinto Selvagem” ou “Um Dia de Fúria”, seus maiores sucessos. Mas ele não está preocupado: aos 76 anos, 54 deles na frente das câmeras, já deu sua contribuição indiscutível para “O Método Douglas”, uma carreira que Stanislavski certamente assinaria embaixo.

Entrevista
Michael Douglas

“Um vilão tem de ser atraente. O diabo é sempre sedutor”

Senhor Douglas, seu novo projeto..?

Antes de começar… onde você está?

Em São Paulo, no Brasil.
É uma bela cidade. Como vocês estão se saindo com a Covid? Já melhorou?

Ainda não. Nosso presidente é um negacionista, como Donald Trump.
Eu sei. Meu coração está com o Brasil. Entendo que é uma situação muito difícil.

Sua família agora tem sangue brasileiro.
Sim, meu filho Cameron namora com a paulistana Viviane, mãe dos meus netos.

HERANÇA O filho, Cameron, a namorada e os netos: sangue brasileiro na família Douglas (Crédito:Divulgação)

Dizem que é difícil encontrar bons papéis para atores mais velhos. O que o atraiu em “O Método Kominsky”?
O texto. Eu não estava pensando em fazer TV ou streaming. Mas quando li o material de Chuck Lorre falei “uau!” É sempre assim, o roteiro é a base de tudo.

Seu personagem é professor de atores. Existe o “Método Douglas” na família?
É sempre sobre o roteiro, nunca sobre o papel em si. Foi assim com meu pai e é assim comigo. Também sou produtor, então me preocupo com essa qualidade.

MUSAS Carys, a filha, e a esposa, Catherine Zeta-Jones: dificuldades de um casamento público (Crédito:Divulgação)

A sua abordagem na vida real é parecida com a do professor da série?
Sim, mas as reflexões mais profundas foram criadas por Chuck Lorre. O tom do professor, porém, era o que eu queria. Ele é parecido com um antigo mestre que tive no início da carreira. É melhor encorajar os atores do que criticá-los.

Na série, sua filha se casa com um homem muito mais velho. Você tem filhos jovens (Carys, de 18 anos, e Dylan, de 20), como encararia se eles fizessem isso?
Se querem se casar com alguém mais velho, devem esperar até que eles mesmos fiquem mais velhos.

Teremos novas temporadas?
Não, essa foi a última. Fechamos com chave de ouro, estou orgulhoso.

Ser filho de Kirk Douglas foi uma bênção ou dificultou sua carreira?
Há benefícios quando seu pai é um astro do cinema. Você aprende os caminhos para evitar erros. A desvantagem é a genética: muitos olham para mim e se lembram dele.

Você cresceu como filho de ‘Spartacus’.
Tive que estabelecer desde cedo minha própria identidade. A verdade é que não há muitos atores de segunda geração por aí. Muitos tentaram, mas poucos tiveram sucesso.

Quando um casal é famoso, a vida privada se torna pública. Qual é a parte mais difícil de um casamento assim?
O mais importante é o respeito mútuo. Não importa quanto tempo tem a relação, é preciso manter a atenção à pessoa que está ao seu lado. Às vezes nos esforçamos mais com estranhos do que com quem está próximo da gente. É um erro.

O investidor Gordon Gekko, de “Wall Street”, é seu grande vilão. Você se arrepende de tê-lo feito tão bem?
Muita gente em Wall Street diz que sou o culpado por eles acreditarem que a ganância é uma qualidade. Explico que Gekko era um vilão, mas não querem acreditar. Acho que fiz um bom trabalho porque um vilão tem de ser atraente. O diabo é sempre um sedutor.

PAI Kirk Douglas: ensinou ao filho Michael os caminhos para evitar erros na carreira (Crédito:Divulgação)

Conhece a música brasileira chamada “Michael Douglas”? O que achou?
Eu achava que era uma homenagem até que alguém me contou que se trata de gíria para droga. Queria subir no palco do show com a minha máscara de “Michael Douglas” para pregar uma peça nesses caras.

Você ganhou o Globo de Ouro por “Método Kominsky” em 2019. O prêmio é a maior recompensa para um ator?
Sim. Mas aí é preciso colocá-lo na estante e voltar ao trabalho.