O presidente Bolsonaro e os milicianos amazônicos

O presidente Bolsonaro e os milicianos amazônicos

O desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips na Amazônia é uma vergonha para o mundo. O episódio, porém, traz um componente ainda mais escandaloso: a reação do presidente Jair Bolsonaro diante do fato. Suas falas e atitudes não deixam dúvida: ele não está nem aí com os desaparecidos.

O absurdo dessa história começou com uma nota oficial do Exército Brasileiro, que admitiu que estava “em condições de cumprir missão humanitária de busca e salvamento”, mas que as ações só seriam iniciadas “mediante acionamento por parte do Escalão Superior”. Ou seja: os poderosos não haviam permitido o início da operação de busca e salvamento.

O comunicado foi divulgado quando o sumiço de Bruno e Dom já passava de 30 horas desde a notificação às autoridades. Isso é uma clara confissão de culpa de crime de omissão que o Exército jogou no colo do “Escalão Superior”, leia-se ministro da Defesa e presidente da República. Sugiro que seja usada como prova cabal contra o Brasil pelo governo britânico e outros organismos internacionais, assim que o caso chegar a algum tribunal internacional.

O pior veio depois, como sempre acontece, quando Bolsonaro abriu a boca: chamou a viagem de Bruno Pereira, que trabalha na Amazônia há onze anos, e Dom Phillips, respeitado jornalista com 30 anos de carreira, 15 deles no Brasil, de “aventura não recomendável”. E completou: “tudo pode acontecer. Pode ser um acidente, pode ser que tenham sido executados”.
Inacreditável. A desrespeitosa declaração do presidente do País é uma das frases mais abjetas que já ouvi na vida. “Aventureiro”, para o presidente, é alguém que segue sua profissão. Viajar pela Amazônia é atividade básica do indigenista. E Dom é jornalista, estava escrevendo um livro sobre a região. Aventura?

Ao admitir que há áreas no Brasil onde um jornalista não pode ir, ou locais não-recomendáveis para um indigenista, Bolsonaro admite que o Brasil é uma terra de selvagens. Aqui não há Constituição, apenas a lei da selva. Como um presidente tem a coragem de bater no peito para tentar convencer os outros de que a Amazônia é nossa, se o poder público liderado por ele não consegue sequer garantir que a legislação brasileira seja respeitada no local? E o pior: admitir que Bruno e Dom podem ter sido executados? Por quem, presidente? Pelos mesmos garimpeiros ilegais estimulados por sua retórica a favor do desmatamento e contra o meio-ambiente? Fico imaginando a família dos dois ouvindo isso.

No governo Bolsonaro, os conflitos na Amazônia se intensificaram. Mais de 100 indígenas já foram mortos, em sua maioria vítimas de criminosos nas terras Yanomani. Para completar, o desmonte do IBAMA, Funai e demais órgãos que ajudavam a proteger a região torna o governo federal cúmplice dos grileiros de terra, madeireiros, caçadores, pescadores ilegais. A ideologia bolsonarista legitima e apoia a ação de mais um grupo criminoso: os milicianos amazônicos.