Apesar de a política ser uma atividade que desperta paixões inflamadas em todos os lados, sua análise deveria, em um mundo ideal, ser técnica e isenta de ideologias. Se isso fosse levado ao pé da letra, um governo não deveria ser medido por sua popularidade momentânea ou pelo carisma de seus líderes, mas pelos resultados objetivos das medidas que consegue implementar na sociedade. Visto por esse ângulo, o governo do presidente Michel Temer foi um exemplo bastante eficiente de pragmatismo político. A vontade de deixar um registro histórico sobre esse período leva agora ao lançamento de “A Escolha”, livro de entrevistas conduzidas pelo filósofo Denis Rosenfield e com prefácio do economista Delfim Netto. Segundo Temer, a inspiração veio de “Entrevistas com Putin”, diálogos entre o cineasta Oliver Stone e o presidente russo.

“A Escolha” – Michel Temer: como um presidente conseguiu superar grave crise e apresentar uma agenda para o Brasil – Entrevistas a Denis Rosenfield – Editora Noeses (Crédito:Divulgação)

“Daqui a 30, 40 anos, quando alguém quiser saber o que aconteceu nesse período histórico, vai encontrar um relato em que o presidente conta e reflete sobre os fatos da época”, afirma Temer. As doze entrevistas que deram origem à publicação tiveram início no segundo semestre de 2018, a seis meses do fim do seu mandato. Foram feitas em etapas, cerca de uma hora por dia, durante almoços realizados no Palácio da Alvorada e no Palácio do Jaburu. Seguiram até a eleição do presidente Jair Bolsonaro, em outubro de 2018. Segundo Rosenfield, não foram feitas entrevistas posteriores para manter o conteúdo restrito à visão e ao contexto da época. “Quando você está escrevendo a história presente, não há nenhum conforto. Você se defronta com os problemas enquanto estão ocorrendo e precisa dar uma resposta a eles”, afirma Rosenfield. “Com a distância do tempo é fácil dizer ‘você acertou, você errou’. A ideia era deixar para a posteridade a marca da história em tempo real.”

A maior parte do livro aborda o caráter reformista do governo Michel Temer. Do ponto de vista objetivo, como a obra quer ressaltar, chama a atenção o volume de conquistas que o governo conseguiu implementar em tão pouco tempo, dois anos e sete meses. Entre as principais medidas aprovadas, estão a Lei do Teto dos Gastos Públicos, a Reforma Trabalhista e a Reforma do Ensino Médio, o controle da inflação e a profissionalização das estatais, com a Petrobras à frente. Segundo Temer, duas razões foram essenciais para o sucesso dessas iniciativas: o diálogo com o Congresso, que o ex-presidente conhecia como ninguém, e a impossibilidade da sua reeleição. “Me disseram: ‘Temer, aproveite a sua impopularidade para fazer o que o Brasil precisa’. E foi o que eu fiz”, diz o ex-presidente. É bom lembrar que ele assumiu em meio a um País extremamente polarizado, resultado do conturbado processo que levou ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Em vez de acirrar os ânimos, o experiente Temer criou um governo inclusivo e de amplo espectro político, com todas as forças políticas que se posicionavam contra Dilma – e que não eram poucas. “Exerci um semipresidencialismo, trouxe o Congresso para governar comigo. Não fiz isso porque era meu desejo, mas porque é isso que a Constituição determina. Acreditamos no Brasil que o presidente pode tudo, mas a verdade é que o presidente não pode quase nada se não tiver apoio do Congresso.” Temer afirma ter seguido as diretrizes do documento “Uma Ponte para o Futuro”, elaborado pela Fundação Ulysses Guimarães, ligada ao MDB. Sua maior vitória foi na área econômica, sob gestão do então ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

“Me disseram: ‘Temer, aproveite a sua impopularidade para fazer
o que o Brasil precisa’. Foi o que
eu fiz”, diz o ex-presidente

“Pegamos o País com PIB negativo, -3,6%, e logo no primeiro ano fomos a 1%. Reduzimos os índices inflacionários e os juros caíram de 14,25% para 6,5%”, afirma Temer. Segundo o ex-presidente, a Reforma da Previdência também teria sido aprovada se não fosse o episódio em que foi gravado pelo empresário Joesley Baptista e que motivou a denúncia do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot. “A Reforma da Previdência foi frustrada pela denúncia criminosa de um dipsômano, o Sr. Rodrigo Janot”, afirma Delfim Netto no prefácio. Como Temer gostaria de ser julgado pela história? “Como alguém que, ao longo da vida pública e profissional, trabalhou muito, produziu modestamente no campo intelectual, teve uma vida limpa que permitiu liderar um governo reformista, apesar de todos os percalços. Se eu for lembrado como alguém que encaminhou as reformas necessárias ao País, estarei feliz”, conclui o ex-presidente. No futuro, graças ao livro “A Escolha”, a história terá melhores condições de julgar.