Wei Jingsheng recebe seus visitantes oferecendo um cigarro, uma maneira muito chinesa de fazer isso, embora ele viva nos Estados Unidos desde 1997. Então acende um e condena “a ditadura do regime de partido único chinês”.

Wei denuncia a opressão das aspirações democráticas dos cidadãos chineses. Uma luta que lhe custou 18 anos de detenção em prisões da República Popular, antes de ser enviado em um avião para os Estados Unidos, oficialmente por motivos de saúde.

Aos 68 anos, Wei parece estar em forma, apesar do vício em cigarros Gauloises, marca francesa que não encontra com facilidade, e dirige uma fundação que leva seu nome em uma casa no sul de Washington.

Conhecido como o “pai” da dissidência chinesa, comemora na quarta-feira um aniversário histórico, os 40 anos do que foi batizado como “muro da democracia”. Em 5 de dezembro de 1978, Wei pintou em uma parede de Pequim um chamado à liberdade que mudou consciências.

Outros intelectuais acompanharam seus passos, como o ganhador do Nobel da Paz 2010, Liu Xiaobo, detido até sua morte em 2017.

Wei pediu no muro a democracia, que chamou de “quinta modernização”, termo que respondia às “quatro modernizações” que o dirigente Deng Xiaoping defendia para fazer da China uma potência econômica independente, ideias pelas quais depois foi considerado o arquiteto da abertura e das reformas do país.

– Reformas “pela metade” –

“Necessitamos retificar esta ideia amplamente aceita na China e no exterior”, pede. “As reformas só avançaram pela metade, economicamente mas não politicamente”.

A abertura da China pós-maoísta, diz, foi impulsada por um amplo movimento popular, assim como por outros líderes do Partido Comunista, não só Deng Xiaoping.

O país mais populoso do mundo se tornou, no fim das contas, “uma mistura de ditadura de partido único e capitalismo. Quando oprimem as pessoas, é mais feroz que em qualquer outro lugar. E quando exploram as pessoas é pior que o capitalismo original dos países ocidentais no momento do marxismo”.

Wei toma um chá preto da região de Fujian, que não acalma suas críticas às figuras que foram se sucedendo no Politburo Central do Partido Comunista da China.

Wei, ex-eletricista do zoológico de Pequim, acusa o ex-líder Jiang Zemin de ter compartilhado com financiadores internacionais os frutos do crescimento chinês, baseado na mão de obra barata.

“Sob o governo de Mao, a China era um país socialista pobre. Hoje a China é um país capitalista pobre. Em geral, os chineses comuns não se beneficiaram disso”.

– Com Clinton e Bush –

Quanto ao atual chefe de Estado, Xi Jinping, que aboliu o limite de mandatos presidenciais, Wei adverte que “não só quer se tornar imperador depois de 2023, quer ser imperador agora”.

“Com Xi Jinping, a China retrocede ainda mais”, insiste o dissidente, em alusão à ofensiva empreendida contra os defensores dos direitos humanos e das liberdades.

Ao repetir de maneira bastante sutil que “o governo chinês não respeita nenhuma regra”, Wei Jingsheng encontra ouvidos atentos na classe política americana.

Nas paredes da casa onde mora, com vista para um afluente do rio Potomac, há grandes fotografias dele com os presidentes Bill Clinton e George Bush.

Mas há algum tempo, Wei, ganhador de prêmios de direitos humanos como Olof Palme e Sakharov, limita suas viagens a Washington. “As autoridades americanas e europeias estão preocupadas com a minha segurança”, afirma.