19/08/2016 - 18:00
Quando o historiador Sérgio Buarque de Holanda escreveu, em “Raízes do Brasil”, que o povo brasileiro é cordial, não se referia à polidez. Expressava a ideia de que somos movidos muito mais por impulsos emocionais do que racionais. Fazia uma crítica, portanto. Nos Jogos do Rio, a premissa de Holanda nunca foi tão latente. A performance nacional foi marcada por um desfile de choros incontidos, risos eufóricos, gestos efusivos e outras demonstrações de que a emoção, para o esportista nacional, fala mais alto do que o preparo físico e técnico. Houve quem dissesse que Thiago Braz conquistou o ouro inédito no salto com vara graças, em boa parte, à sua força mental durante a prova. Da mesma forma, é surpreendente que a seleção feminina de vôlei tenha sucumbido diante das chinesas, inferiores em diversos aspectos, mesmo depois de tê-las massacrado no primeiro set. Bastou um revés do jogo para o time inteiro fraquejar. O mesmo se aplica à seleção feminina de futebol, que venceu a Suécia por 5 a 1 na primeira fase e depois, na semifinal, foi derrotada nos pênaltis. Nos dois casos, o que fez a diferença foi o tumulto de emoções vivido pelas atletas brasileiras.
Houve um tempo em que se dizia que os brasileiros falhavam no Exterior porque se sentiam oprimidos pela torcida adversária. Uma vaia aqui, uma zombaria ali eram suficientes para desestabilizar o time inteiro. Nos últimos dois anos, os atletas tiveram a chance rara de se apresentar para uma multidão apaixonada. Na Copa do Mundo, o apoio popular surtiu um efeito contrário ao esperado. O 7 a 1 para a Alemanha não representa a diferença técnica entre os dois times: os alemães eram melhores, mas não tanto assim. O que pesou, e isso é inegável, foi o medo de perder – ou a responsabilidade de ganhar – diante da própria torcida. A mesma inconstância emocional pode ter influenciado no desempenho de Marta e companhia no futebol feminino na Olimpíada. Prata com o vôlei feminino em Atlanta-96, Ana Moser faz uma análise lúcida da questão. “No Brasil, é tudo ou nada, porque o competidor vive com a expectativa de que uma medalha irá mudar a vida dele.”
A exibição consagradora de um atleta ou o fracasso inesperado podem estar ligados à maneira como ele gerencia as emoções. Isso ficou claro nas palavras de Diego Hypolito, depois que ele conquistou a prata no solo nos Jogos do Rio. “Na hora que fui para a última acrobacia, me veio um filme de Pequim”, recordou o ginasta, referindo-se à Olímpiada realizada em 2008, na qual ele chegou como favorito ao ouro, mas fracassou. “Mas não deixei nenhum pensamento negativo me atrapalhar.” De acordo com a psicóloga Mara Raboni, que presta atendimento a atletas profissionais, expressar emoção não fragiliza o competidor. “Pelo contrário, dá a ele um caráter de garra e vivacidade e tem o poder de motivar os torcedores”, diz ela. “A manifestação emocional sadia pode até desestabilizar o adversário.” Isso, reforça Nuno Cobra, ex-preparador físico e mental de Ayrton Senna, é a maior força de um atleta. “Se ele não se emocionar, é grande a chance de ter um desempenho medíocre”, afirma. “Tanto é verdade que, no atletismo, muitos competidores pedem palmas para o público a fim de sentir a emoção.”
Medo e ansiedade são os sentimentos que derrubam um atleta. O que eles provocam:
POR QUE AS EMOÇÕES NEGATIVAS PREJUDICAM O DESEMPENHO
1 – O cérebro prepara o corpo para reagir ao que interpreta como uma ameaça
> A freqüência cardíaca e a pressão arterial se elevam
> A respiração torna-se mais curta
> Com menos oxigênio, o atleta sente-se mais cansado
> Os músculos ficam tensos, prejudicando a execução dos movimentos
> As pupilas se dilatam, perturbando a visão
2 – A mente é atingida
> O foco mental passa a ser a ameaça. A concentração no jogo acaba
> Cresce a irritabilidade com os erros consecutivos
> A sensação de impotência toma conta e o descontrole pode resultar em crises de choro