O presidente Jair Bolsonaro tomou posse há seis meses e, de lá para cá, a sua performance política no cargo de mais alto mandatário fez com que o País pouco andasse para frente. A fé e a esperança dos cerca de cinquenta e sete milhões de brasileiros que o elegeram recaíam sobretudo em suas promessas de recuperação da economia. Na escrita do dramaturgo italiano Luigi Pirandello consta um clássico em que seis personagens vivem buscando um autor, e um deles bem que poderia ser Bolsonaro: no âmbito político, o chefe de nosso Poder Executivo parece um personagem de si mesmo à procura de alguém que lhe dê roteiro para governar. A seu favor conta a sinceridade ao declarar, após eleito, que não estava preparado para a função, e talvez não tenha dito isso anteriormente, já na campanha, porque de fato não imaginava o que se faz no Palácio do Planalto. A verdade é que tudo está estacionado e, em alguns pontos, caminhando de costas. Da tão vital Reforma da Previdência, dela Bolsonaro tomou distância: entregue o projeto ao Congresso, correu a afirmar que o problema era dos parlamentares. Em relação ao pacote anticrime do ministro Sergio Moro, a atitude do presidente-personagem-perdido-no-palco-do-poder não têm sido diferente. Além disso, a relação com congressistas mais azeda que adoça, a situação do desemprego piora, o PIB murcha, a esperança vai se enlutando. Essa tem sido a performance política. Na plateia, tirante os fanáticos seguidores, a popularidade cai.

As cortinas de Delfim Moreira

Falou-se da ação política. Pano rápido! Mas há um outro performático Bolsonaro, e esse parece um feliz garoto de sessenta e quatro anos a cada encenação — tipo o personagem Calvin, de Bill Watterson, dizendo a si mesmo: “vamos aprontar?!”. É passeio de moto burlando a lei, é almoço improvisado com caminhoneiros, é plano de saltar de paraquedas. Não há dúvida de que Bolsonaro tenta com tais encenações se aproximar do povo, busca compensar a fraqueza política com demonstrações de um vigor físico que, a rigor, só existe em sua mente — ela dá a ordem mas seu corpo, desgastado pelo tempo e por um criminoso atentado, já não consegue obedecer. Mas, repita-se, mesmo com a tática de ganhar popularidade, existe nesse Bolsonaro uma dose de espontaneidade, ele se torna alegre e natural: quem não lembra do presidente forçando o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, a andar de jet ski e depois ficar rindo ao vê-lo encharcado de água? E tem também a eterna mania das flexões.


Tudo bem que Bolsonaro divirta-se assim, mas desde que a parte séria de sua gestão, aquela que deve atender aos anseios do povo, estivesse tinindo. Diga-se, aliás, que não é ele o primeiro a se valer do espalhafato físico para chamar atenção. Todo presidente já fez embaixada com jogador de futebol; João Figueiredo, que dizia preferir o cheiro de equinos ao cheiro do povo, saía cavalgando para mostrar que sua coluna não padecia de dores; Fernando Collor corria e suava atrás de “marajás” enquanto a corrupção também corria escamoteada. Cada um, ao seu estilo, tentou galgar o ranking da popularidade usando o corpo, e Bolsonaro não é exceção — mas podia levar a sério o que tem de ser sério, uma coisa não exclui a outra. Cada um com sua idiossincrasia, Delfim Moreira, nos nove meses que ficou na Presidência, passava horas escondido nas cortinas do Catete para observar as pessoas. Julgava-se invisível, esquecendo que as pontas de seus sapatos apareciam sob o cortinado. Fez, porém, um bom governo, dentro do que podia ser bom no amanhecer da República. Fez um bom governo, apesar da encenação.