O ex-juiz Sergio Moro concretizou a filiação ao Podemos na manhã de quarta-feira, 10. A cerimônia ocorreu no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília. Ele começou justificando que estava nervoso e que as críticas a sua dicção não tinham importância. “O Brasil precisa de líderes que ouçam e atendam a voz do povo”. No discurso, o ex-juiz disse que a “gota d’água” para voltar à política foi o encontro que teve com um estudante brasileiro no exterior, que questionou se ele havia abandonado o Brasil. “Aquilo foi um tiro no meu coração”.

O cientista político Antônio Lavareda entende que Moro teria sido imbatível em 2018, mas que hoje “necessitará afastar a ideia de uma especialização monotemática em Justiça. Terá que convencer que entende de economia e de políticas sociais. A última pesquisa Ipespe mostrou que enquanto os temas econômicos alcançam 44% como a principal demanda de atuação do próximo presidente, o combate à corrupção atinge apenas 6%”.

FLERTE O senador Alessandro Vieira entende que Moro possa ficar com os votos dos eleitores frustrados com Bolsonaro (Crédito:Waldemir Barreto)

A narrativa do presidenciável deixou claro que ele sabe das críticas e que já prepara sua campanha. Temas como educação, saúde, emprego, meio ambiente e, principalmente, “erradicação da pobreza” foram inclusos na fala de Moro. Mas, também, fez questão de reafirmar o motivo que deu tanta projeção ao líder da Lava Jato. Sem mencionar os seus adversários — Lula e Bolsonaro —, Moro imprimiu o tom que dará ao seu diálogo. “Chega de corrupção, chega de mensalão, chega de petrolão, chega de rachadinha”, disse o ex-juiz. Ele ainda ressaltou o êxito da Lava Jato que recuperou até agora mais de R$ 4 bilhões e tem previsão de receber outros R$ 10 bilhões.

A opção de filiação ao Podemos sempre foi a mais plausível. O apoio do partido à operação Lava Jato sempre foi claro. Os senadores do Paraná, estado em que ele manteve o domicílio eleitoral, são todos do Podemos: Álvaro Dias, Oriovisto Guimarães e Flávio Arns. A presidente da sigla, deputada Renata Abreu (SP), está afinada com o discurso de Moro. À ISTOÉ ela disse que “o Podemos é muito mais do que a Lava Jato”, mas acredita que a solução de problemas econômicos e sociais só virá com o fim da corrupção, que “tem relação direta com a pobreza e a miséria no País”. Por sua vez, o senador Oriovisto Guimarães destaca que a principal virtude do novo colega de partido é a honestidade. Sobre o cenário de disputa, Guimarães disse que “Moro já arranca com mais de 10% de intenção de votos e é uma opção para quem não quer Lula, nem Bolsonaro”.

Outros partidos cortejavam o ex-magistrado. O União Brasil – unificação de PSL e DEM – era quem estava mais próximo. As conversas continuam. Principalmente, por conta dos parlamentares mais jovens. O deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), a deputada Dayane Pimentel (PSL-BA) e o deputado Júnior Bozzela (PSL-SP) mantém o diálogo. Bozzela pensa que Moro pode se apropriar do eleitorado de Bolsonaro. “O Moro representa as bandeiras lavajatistas que elegeram o presidente”. Na cerimônia de filiação, o ex-ministro da Saúde, Luiz Mandetta, esteve presente. Ele é apontado com o nome que o União Brasil colocará para ser candidato a vice, numa possível composição. A recomposição de uma direita tradicional é o sonho do grupo.

Terceira via

Também flertam com Moro, o PSDB, especialmente com o governador João Doria (SP), e o Cidadania. À ISTOÉ, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) disse que mantém seu nome na disputa. “Sou pré-candidato à Presidência, mas entendo que mais adiante os nomes da terceira via devem afunilar”, afirmou o senador. Vieira ainda lembrou que existe uma frustração dos eleitores de Bolsonaro, “por conta das rachadinhas e da aliança com o Centrão” que seriam capazes de migrar os votos para Moro.

Na mesma onda que navega o ex-juiz, o procurador Deltan Dallagnol abandonou o Ministério Público e seguirá a carreira política. Provavelmente, ele disputará uma vaga para a Câmara de Deputados, também pelo Podemos. Moro e Dallagnol foram criticados por ter utilizado cargos na Justiça para obter notoriedade nacional. O cientista político Ricardo Ismael entende que a crítica não faz qualquer sentido. “Sindicalistas e militares saem dos seus postos para ir à Presidência. É legítimo”, afirma o cientista político. Após sair do Ministério da Justiça, Moro deixou claro que não aceitava a intervenção na Polícia Federal e seu descontentamento com o pacote de medidas de combate à corrupção engavetadas no Congresso. “É justo que ele queira mudar o País a partir de um cargo no poder. E a Presidência da República é o melhor lugar”, disse Ismael.