“Lá vem o papo ecochato de novo”. Pois bem, eu entendo. Mesmo porque eu e vocês, por gerações, fomos educados a priorizar o desenvolvimento econômico em detrimento da preservação ambiental. Assistimos cidades, shoppings e indústrias em um crescimento rápido, e assistimos (participando fortemente) ao consumo aumentando vertiginosamente, e que não veio acompanhado de uma consciência ambiental. Sim, é chato. Mesmo porque a natureza era vista quase como um recurso inesgotável, algo que sempre estaria à nossa disposição.

Fomos educados a procurar o luxo, o lazer e o conforto no consumo, acreditando que o planeta era um cenário estático, que suportaria nossas demandas infinitas sem grandes consequências. E agora, nos vemos nesse desvio de valores que não nos foi ensinado, e tentamos arrumar desculpas para continuar como sempre foi.

Nunca estivemos tão na contramão da trajetória histórica que marcou o início da industrialização e a expansão das cidades. Existe um movimento inverso, uma fuga crescente das cidades em busca de silêncio e de tranquilidade. A urbanização acelerada, que por tanto tempo foi vista como o caminho inevitável para uma vida melhor, agora nos leva a anseios por refúgios naturais, longe do concreto e da poluição, em um desejo de retornar às raízes e redescobrir o equilíbrio que o ritmo das cidades roubou.

Esses dias assisti um documentário sobre um rapaz que decide visitar um lugar bem remoto do Alasca chamado Katmai, destino esse que era o preferido de sua falecida avó e, chegando lá, ele se depara com uma montanha de lixos e calçados velhos. Como esse lixo chegou até as geleiras do Alasca?

Sempre escrevo com muito carinho com o objetivo de incentivar as pessoas a viajarem para a natureza, a explorarem paisagens deslumbrantes e a se reconectarem com o que há de mais puro e essencial no mundo. Faz um bem danado pra gente. E de certa forma, é uma experiência de aprendizado, onde o prazer de estar imerso na paisagem vem (ou deveria vir) acompanhado do compromisso de protegê-la.

Nos ajuda a ver de perto a potência e a importância dela. Mas é preciso falar também do equilíbrio entre o desejo de explorar e a responsabilidade de preservar.

E talvez o equilíbrio comece na análise de cada trilha que decidimos percorrer, cada destino que elegemos explorar: Estamos realmente respeitando a natureza, ou apenas nos beneficiando dela?

Não quero falar somente sobre a importância de apenas evitar deixar lixo para trás ou utilizar produtos biodegradáveis. Acredito que da nossa parte, envolve uma responsabilidade mais profunda, que começa na escolha do destino e se estende às decisões sobre como interagir com o lugar. Muitos paraísos naturais estão sendo explorados até o limite de sua capacidade, e as comunidades locais enfrentam o desafio de equilibrar a preservação ambiental com as necessidades econômicas que o turismo traz.

Praia superlotada na Ásia
Reprodução

A colisão entre a busca pelo refúgio natural e o compromisso sustentável está, em muitos casos, nos detalhes invisíveis. Sim, invisíveis aos nossos olhos que não vêem perigo. A construção de resorts em áreas antes intocadas, o aumento das emissões de carbono pelo transporte aéreo e a sobrecarga de sistemas de gestão de resíduos são apenas alguns exemplos de como o turismo de natureza pode, inadvertidamente, prejudicar os próprios ambientes que promete proteger.

Além disso, o conceito de “over-tourism” — o excesso de turistas em uma determinada área — não é mais exclusivo de grandes cidades e monumentos históricos. Áreas de preservação ambiental e parques nacionais agora enfrentam esse mesmo problema. O que antes era um destino remoto e desconhecido, rapidamente se torna um ponto de interesse global, levando a uma transformação irreversível no equilíbrio entre turismo e conservação.

Portanto, para que essa colisão não se transforme em um choque irreparável, a solução precisa vir também de nós viajantes, além dos destinos. É essencial que ao planejarmos nossa próxima aventura em meio à natureza, adotemos uma postura consciente. Isso inclui tentar escolher épocas menos movimentadas, apoiar projetos de ecoturismo que realmente contribuam para a preservação local, respeitar as restrições impostas pelas áreas protegidas e, sobretudo, reconhecer que nem sempre “explorar o novo” significa ocupar fisicamente um espaço, mas sim aprender a valorizar a natureza em sua integridade.

A sustentabilidade no turismo não é um ponto de chegada, mas um processo contínuo de aprendizado e adaptação, afinal, não aprendemos isso desde que fomos educados. No final, o verdadeiro refúgio não está apenas na fuga para um lugar remoto, mas na capacidade de garantir que esse lugar continue existindo para as futuras gerações — intocado, preservado e com a mesma beleza que um dia atraiu o primeiro viajante consciente.

Assista aqui o documentário “Footprints on Katmai”, que citei no texto.