Ofendido, Bolsonaro grita: “É o orgasmo da TV Globo ver um filho meu preso? Ver um irmão meu preso? Ver um amigo meu preso? Esse é o orgasmo de vocês, TV Globo?” Terminam assim os 23 minutos e 41 segundos da mais incrível peça de comunicação política da história do Brasil. Bolsonaro não entende mesmo o que é o poder.

Quando a economia está começando a dar certo é ainda mais urgente que o presidente entenda os perigos de seu discurso e os impactos que este pode ter nas pessoas e nas empresas. Isso ninguém vai lhe perdoar. A economia vai bem, mas olhar a política brasileira dá pena. Suga a energia da gente. Tira o foco. Mata a alegria. Entristece o povo. É como o ciúme na canção de Elza Soares. Algo que rói nos cotovelos, da raiz dos cabelos até a sola dos pés.

O presidente do Brasil, em direto a partir da Arábia Saudita, quatro da manhã, respondeu ofendido a uma notícia da TV Globo. Por muito que lhe custe admitir, o chefe de um estado não é mais o pai de uma única família. É o pai de todas. Ele não pode se ofender apenas pelas dores e injustiças sofridas por alguns. Tem de fazê-lo por todos. Por isso, não deve trazer sua vida familiar para a praça pública.

O exercício da solidão está na essência do poder.

É certo que o poder impacta os homens de maneira diferentes e, por isso, ninguém poderia adivinhar como Jair Bolsonaro iria se comportar depois de sentar na cadeira mais importante do Planalto. Mas a forma com que seu estilo está tomando conta da substância está acabando com sua Presidência.

Volto ao vídeo. Fiquei de celular na mão quase meia hora. Um amigo me contou que quando o presidente descobriu a notícia da Globo — era madrugada alta em Riad —, quase enlouqueceu. Despiu o pijama, botou o terno, pediu para que alguém ligasse a câmara do celular e arrebentou.

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Sem filtro e sem ensaio, Bolsonaro não falou apenas da reportagem do Jornal Nacional — verdadeiramente mal feita e querendo atingi-lo. Ele também contou (de novo) todas as histórias quem estão enfraquecendo a sua Presidência: os processos contra os filhos, a prisão da sogra, a perseguição à nora, o desmoronamento de seu partido. Vezes demais Bolsonaro está se transformando em um personagem irreal, um teatral ponto de si próprio em seu autocartoon. Cada vez que isto acontece, Jair Bolsonaro torna mais difícil a sua reeleição. Tratar o maior grupo de mídia do Brasil de “imprensa porca, canalha, nojenta e imoral” não é bom. Mesmo se fosse verdade, não dá para ter orgasmos assim.

O poder afeta os homens de modos diferentes, mas ninguém poderia adivinhar que o estilo de Bolsonaro ajudaria a minar sua Presidência


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