Capital mundial da cultura e berço da arte, a França aos poucos flerta com a normalidade. Sedentos por liberdade, os franceses podem agora retomar suas vidas e de quebra receberam um presente especial: um novo museu em Paris. Aberto há poucos dias no antigo prédio da Bolsa de Valores, o Museu Pinault Collection simboliza o renascimento da esperança na Cidade Luz. Locado pelos próximos 50 anos, o espaço conta com mais de cinco mil obras e, segundo especialistas, pode ser considerado como a inauguração do ano. Idealizador do projeto e dono das peças expostas, o bilionário François Pinault investiu cerca de £ 200 milhões (mais de R$ 1,5 bilhão) no seu sonho.

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£ 200 milhões foram investidos no ambicioso projeto

O acervo apresenta peças de artistas dos séculos XIX e XX como David Hammons, Urs Fischer, Louise Lawler, Miriam Cahn e Cindy Sherman e os itens impressionam pela atemporalidade. O foco é a vida, até por isso há telas que passeiam pelas condições humanas: nascimento, morte, a passagem do tempo e como o momento presente deve ser valorizado – reflexão poderosa num dos momentos mais caóticos da história da humanidade. O público pode acompanhar mais de dez exposições simultâneas. “Uma das grandes virtudes da relação com a arte está nas perspectivas que ela abre”, diz François Pinault, no prefácio do catálogo.

Tal qual como os artistas, a equipe técnica responsável pela reforma explicita o desejo da globalização. O arquiteto escalado para o trabalho foi o japonês Tadao Ando, conhecido pela capacidade de revitalizar construções históricas com sutileza e sem “substituir” o antigo. O local é um marco da cultura, inclusive, era frequentado por uma figura emblemática há mais de 300 anos: a esposa do rei Henrique II de França, Catarina de Médici. Conhecida como uma grande mecena, a rainha patrocinava artistas locais e incentivava exposições, fato que transcendeu sua presença na realeza. Visionário e fã de Catarina, Pinault quer ser lembrado na posteridade como o “mecena dos mecenas”. “A audácia para a construção deste projeto tem que ser destacada”, ressalta Bruno Assami, diretor executivo do projeto Unibes Cultural.

ACERVO Museu terá em exposição mais de cinco mil obras de artistas dos séculos 19 e 20 (Crédito:Panayotis Pavleas )

Assim como não existe apenas um sabor de croissant, em Paris não existe só o Louvre. Pelo contrário, há diversos museus. A meta dos organizadores do Museu Pinault Collection é dividir a atenção com o vizinho ilustre que fica a poucos metros de distância. Assami destaca que a retomada dos circuitos culturais inaugura uma nova era nas artes, sobretudo num mundo cada vez mais digital.

HISTÓRIA Espaço da antiga Bolsa de Valores foi alugado por 50 anos: vizinho do Louvre (Crédito:Panayotis Pavleas)

Paixão pela arte

Poucas vezes se viu uma paixão tão forte como a de François Pinault pela arte. Apesar de ter erguido um império de luxo que comanda marcas como Gucci e Saint Laurent, o bilionário de 84 anos queria ter seu próprio museu. Inclusive, ele levou mais de 15 anos para realizar o sonho. Em 2005, depois de esbarrar em diversas burocracias governamentais, decidiu levar seu extenso acervo para Veneza, na Itália. Lá, construiu dois dos mais belos espaços culturais da cidade: Palazzo Grassi e a Punta della Dogana.

Estima-se que o magnata francês possua mais de dez mil obras em seu acervo, um dos maiores do mundo (Crédito:Thomas COEX / AFP)

Seu impacto na cultura era incontestável, tanto que diversas instituições ao redor do mundo pediam autorização para contar com suas obras. Apesar do sucesso, lhe faltava algo. Como dizia o escritor parisiense Gustave Flaubert: “Não se faz nada de grande sem fanatismo”. Pinault queria fazer história em sua cidade natal. E fez. De acordo com Maria Cristina Oliveira Bruno, museóloga da Universidade de São Paulo (USP), a atitude do magnata pode transformar o mercado. “É absolutamente importante criar e valorizar equipamentos culturais”, diz. “Não é uma coisa comum ver tanto investimento assim, mas pode se tornar uma tendência”, conta. Definitivamente, após meses, os franceses tem um motivo para celebrar.