Considerado pela crítica como uma das vozes mais fortes e instigantes da cena musical brasileira da contemporaneidade e do movimento LGBTQ, o trio “As Bahias e a Cozinha Mineira” participou na última terça-feira (3) de live da Istoé Gente. Formado por duas mulheres trans, Assucena Assucena e Raquel Virgínia, e por Rafael Acerbi, a banda, que foi indicada ao Grammy Latino, na conversa com o repórter Rafael Ferreira, fala sobre política, diversidade, pandemia, racismo, questões de gênero e sobre o último trabalho – “Enquanto estamos distantes”.

Veja a entrevista completa:

Há dez anos no mercado, o grupo surgiu de encontros na USP com um pegada pop. Seu som transita pelas batidas do samba, do rock, do pop e outros gêneros. A banda revela que a base da formação do trio são as músicas baianas, em especial as de Gal Costa, num encontro bárbaro com o Clube da Esquina, de Milton Nascimento e Lô Borges.“Estamos vivendo uma depressão econômica, uma depressão psicológica. As pessoas estão ficando tristes não só com as notícias, mas por conta de todo o contexto social. Por isso, optamos para fazer um som sutil e leve.”

Egressos do curso de História da USP, Assucena, Raquel e Rafael produzem uma obra original e provocante. “A música precisa denunciar e trazer desconforto e conforto. Apesar dessas certezas, a gente escolheu trazer conforto nesse trabalho”, contam. No bate papo, Assucena e Raquel falam sem rodeios sobre o fato de serem trans. “É um desafio primeiro porque a gente tem toda uma geração de artistas trans que não puderam se conceber como artistas” e advertem: “o mundo é transfóbico. As pessoas sempre tentam colocar a gente no espaço reservado, o das pessoas trans. Então parece que para tocar a gente na rádio precisa de uma justificativa”, lamenta Raquel.

Indicadas ao prêmio Grammy, ao prêmio Multishow e Bravo, a banda está no quarto álbum e já circulou por todas as regiões do Brasil fazendo shows debatendo musicalmente a cultura brasileira. Quando papo é sobre racismo, o trio é categórico. “As pessoas negras são plurais, suas histórias são naturais e os seus pontos de vista são florais’. Em termos de educação racial, “As Bahias e a Cozinha Mineira” acreditam que os brasileiros precisam crescer e evoluir até entender o porque que o assassinato de um homem negro norte-americano, nos impressiona mais do que um jovem negro brasileiro que morre enforcado. “A gente precisa dar alguns passos que são passos sérios de uma sociedade séria e uma sociedade que constrói projeto sério e que constrói edifícios anti-racistas”, dizem.

“Tomara que tudo que esteja acontecendo seja de fato o começo de uma nova década, o começo de um dia em que a gente vai discutir de maneira profunda as nossas contradições raciais as nossas contradições gênero, as nossas contradições de classe e as nossas contradições que precisam ser colocadas na mesa (…) Se o debate racial estivesse sendo confortável não está sendo feito debate racial, porque o debate racial necessariamente é desconfortável”.