ESPERANÇA A brasileira Maria Possas, de 55 anos, recebeu a primeira dose da vacina da Pfizer em Londres: luz no fim do túnel

Há uma luz no fim do túnel. Em meio a uma pandemia que deixou 70 milhões de infectados e matou 1,57 milhão de pessoas até agora no mundo, as notícias das primeiras campanhas de vacinação são alentadoras e surgem como um verdadeiro sopro de esperança para a humanidade. Por mais que a situação seja perturbadora começam a aparecer indícios de que a ciência pode triunfar sobre a peste e interromper a perda de vidas. O Reino Unido, nação europeia mais afetada pela Covid-19, onde o número de óbitos supera 63 mil, foi o primeiro lugar a aplicar, terça-feira 8, uma vacina fora da fase de testes com um imunizante clinicamente aprovado. Tratou-se, no caso, da vacina da Pfizer, desenvolvida em parceria com o laboratório de biotecnologia alemão BioNTech, liberada para uso emergencial na Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda. Sua eficácia, verificada nos ensaios clínicos e prestes a ser atestada pela agência sanitária americana, a FDA, é de 95%.

A primeira pessoa a ser imunizada na Inglaterra foi Margaret Keenan, uma mulher de 90 anos, que recebeu a dose em um hospital em Coventry, no centro do país. O segundo, num bom presságio, foi um homem de 81 anos, homônimo do escritor William Shakespeare. A brasileira Maria Lúcia Possas, de 55 anos, que faz parte do grupo de risco por tomar medicamentos imunossupressores, também está entre as vacinadas em Londres. O NHS, serviço de saúde britânico, declarou que pretende vacinar inicialmente, na primeira fase da campanha, 800 mil pessoas, principalmente idosos e profissionais de saúde, e que o processo para imunizar todos que precisam será uma “maratona, não uma corrida” e levará muitos meses. Seja como for, o primeiro passo foi dado. “É um momento histórico”, afirmou o secretário de Saúde, Matt Hancock. “Até meados do ano que vem a vida poderá voltar à normalidade”.

CARDIFF

MOBILIZAÇÃO Centro de vacinação em Cardiff, na Inglaterra: prioridade inicial é imunizar idosos e profissionais de saúde (Crédito:JUSTIN TALLIS)

Num cenário tenebroso, com a segunda onda da doença atingindo a Europa e o número de mortos pela Covid-19 crescendo em todo o mundo, a chegada das vacinas traz otimismo e alguma segurança para uma população totalmente rendida a um micróbio letal. Mundo afora há acordos fechados para compra e distribuição de imunizantes na fase 3 dos testes clínicos e planos de vacinação saindo urgentemente do papel. Em vários países onde há governos e líderes preocupados com os efeitos devastadores da doença há um esforço concentrado para iniciar a imunização ainda em dezembro ou na primeira quinzena de janeiro. Diante da inconclusão dos ensaios clínicos da maioria das vacinas promissoras ou da falta de uma aprovação definitiva pelas agências de controle, a saída encontrada pelas autoridades sanitárias tem sido a aprovação de imunizantes para uso emergencial. Seguindo a Inglaterra, o Canadá aprovou, quarta-feira 9, o uso da vacina da Pfizer em situação de emergência e deve iniciar sua campanha nos próximos dias.

PROTEÇÃO O cidadão britânico William Shakespeare, de 81 anos: atenção aos mais vulneráveis (Crédito:Jacob King)

Todos os países que se movem pela racionalidade e tem estratégia de combate à doença estão correndo contra o tempo para imunizar suas populações. Na Rússia, onde foi desenvolvida a vacina Sputnik V, batizada em homenagem ao satélite soviético, a vacinação também começou nesta semana na capital Moscou, beneficiando inicialmente assistentes sociais, trabalhadores da saúde e professores. O governo russo anunciou o desenvolvimento da Sputnik V em agosto e, atualmente, a vacina está na fase 3 dos testes, feitos com 40 mil voluntários. A taxa de eficácia anunciada para o imunizante é de 95%, mas há questionamentos da comunidade científica internacional por causa da falta de transparência dos estudos clínicos. De qualquer forma, os russos estão bancando a qualidade do produto ao oferecê-lo para sua população.

A Indonésia é outro país que está acelerado em seu programa de vacinação e deve começar a campanha antes do final do ano. Nos primeiros estágios do programa, o país irá utilizar as vacinas das farmacêuticas chinesas Sinopharm e Sinovac, também fornecida para o governo do estado de São Paulo. Os laboratórios garantirão 18 milhões de doses da vacina, sendo que 15 milhões serão fabricadas pela farmacêutica local Bio Farma. O presidente do país, Joko Widodo disse que “garantir a segurança da vacina é uma prioridade e os profissionais de saúde, a polícia e os militares serão os primeiros da fila na campanha de vacinação”. A Turquia pretende iniciar a vacinação com a Coronavac no dia 11 de dezembro, segundo o ministro da saúde, Fahrettin Koca. Ele explica que serão aplicadas 20 milhões de doses nas primeiras semanas da campanha. Outras 30 milhões de doses estarão disponíveis até fevereiro de 2021. Na quarta-feira 9, o governo dos Emirados Árabes Unidos autorizou o uso emergencial da vacina da Sinopharm, que teria demonstrado eficácia de 86%. Embora a vacinação em massa ainda não tenha data de início, os profissionais de saúde dos Emirados já estão sendo imunizados. O líder de Dubai, sheik Mohammed Bin Rashid Al-Mktum, recebeu uma dose experimental da vacina no mês passado.

DUBAI

SEGURANÇA O sheik de Dubai, Mohammed Al-Mktum, toma uma dose da vacina chinesa Sinopharm (Crédito:Divulgação)

Drama americano

No país mais atingido pela pandemia no mundo, os Estados Unidos, o objetivo, segundo noticiou o jornal The New York Times, é distribuir vacinas contra o coronavírus para 24 milhões de pessoas até meados de janeiro, dando prioridade para residentes em casas de repouso e profissionais de saúde. Na quarta-feira 9, o país registrou mais de 3 mil óbitos num só dia, recorde desde o início da pandemia. O número de americanos mortos se aproxima de 300 mil. Mas como acontece no Brasil com o presidente Jair Bolsonaro, Donald Trump também faz pouco caso da doença. Só se mexeu depois que seu sucessor, Joe Biden, acusou o governo de não ter um plano de vacinação. Moncef Slaoui, principal conselheiro científico do programa de desenvolvimento de vacinas do governo Trump, disse que a maior parte da população altamente suscetível, cerca de 100 milhões de pessoas, deve ser vacinada em março. O governo americano tenta fazer como o inglês e aprovar a vacina da Pfizer emergencialmente na FDA. O comitê consultivo da FDA se reuniu, quinta-feira 10, para revisar dados de segurança e de eficácia da vacina. Outra farmacêutica, a Moderna, solicitou aprovação emergencial para seu imunizante.

Na Itália, onde os efeitos da segunda onda são tão nefastos como na Inglaterra e as mortes já chegam a 62 mil, o ministro da Saúde, Roberto Speranza, disse que o país terá doses para vacinar 1,7 milhão de pessoas no mês que vem, especialmente trabalhadores da área de saúde e moradores de asilos. “Prevejo que os primeiros dias de vacinação sejam organizados entre a terceira e a quarta semana de janeiro”, disse. Por intermédio da União Européia, a Itália garantiu acesso a quatro vacinas: a do consórcio Pfizer, da Universidade de Oxford, da Janssen-Cilag e da Sanofi. Num momento de extrema incerteza e risco para a saúde, não há outro caminho a não ser confiar na ciência e deslanchar a vacinação. E governos responsáveis tratam de acelerar a chegada de imunizantes promissores à população para conter a tragédia do coronavírus.

MOSCOU

SOLUÇÃO LOCAL Russos começam a receber a Sputnik V: imunizante na fase 3 dos testes clínicos (Crédito: Maxim Shemetov)

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