A cadeia pública José Frederico Marques, em Benfica, na zona central do Rio de Janeiro, é uma festa, um lugar onde os detentos fazem o que querem diante da vista grossa dos agentes penitenciários. Na semana passada, uma inspeção do Ministério Público descobriu que seis celas no quarto andar do presídio, onde estão ou estiveram alguns dos principais presos da Lava Jato no estado— como o presidente afastado da Assembléia Legislativa, Jorge Picciani (MDB), ou o ex-governador Sérgio Cabral (MDB) —, foram transformadas em suítes temáticas e equipadas como os quartos de um motel. As regalias do ninho de amor em Benfica, reveladas pelo jornal O Dia, incluíam colchões de casal, um coração estilizado pintado na parede cor de rosa, luz vermelha no teto para deixar o clima sensual, televisão e pisos de porcelanato. O caso serve para ilustrar a degradação de boa parte do sistema prisional do Rio.

“Presídio do amor”

“Tem um motelzinho instalado em Benfica”, declarou Andréa Amin, coordenadora do Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (Gaesp) do Ministério Público. “Instauramos inquérito para apurar eventual improbidade de agentes públicos e prática de crime, e identificar se era uma estrutura montada para favorecer alguém.” As investigações tentam descobrir quando, como e por quem os quartos especiais foram instalados, quem pagou e autorizou as obras e também verificam se os quartos eram usados apenas para os presos receberem suas mulheres ou namoradas na visita íntima ou também para encontros com prostitutas remuneradas. Possíveis privilégios para os presos da Lava Jato também estão sendo investigados.

A cadeia de Benfica, que era conhecida como “um amor de presídio” pelas facilidades concedidas aos detentos, agora é chamada de “o presídio do amor”. Na inspeção do Ministério Público em Benfica, além dos quartos especiais, foram encontrados R$ 7,4 mil em espécie no local além de roupas e comidas não permitidas.

Dois dias após a divulgação do fato, 17 funcionários foram exonerados da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária (Seap). Há investigações sobre o envolvimento de agentes penitenciários nos descalabros que agora vêm à tona. Entre os exonerados há pelo menos quatro funcionários que ocupavam cargos de chefia em Benfica, como o diretor, o chefe de segurança e o coordenador de área. O coronel da PM Erir Ribeiro Costa Filho, que comandava a Seap até janeiro, prestará esclarecimentos pois a instalação dos quartos aconteceu durante a sua gestão. Um levantamento do Laboratório de Orçamento e Políticas Públicas (LOPP), do Ministério Público fez varredura nas contas do presídio durante um ano e constatou que até janeiro, 71,2% das compras foram feitas sem licitação. O percentual equivale a R$ 345,7 milhões. O atual Secretário estadual de Administração Penitenciária, David Anthony, reconheceu que as regalias encontradas ali “não são normais em outras unidades”. Segundo ele, “causou estranhamento a qualidade do material usado no acabamento das suítes”. No ano passado, quando Sérgio Cabral ainda estava no presídio, foram encontrados alimentos como camarões, presunto cru e queijos importados, além de um aparelho de TV de grandes domensões e home theater.

MORDOMIAS Equipamento de home theater e alimentos importados servidos ao ex-governador Sérgio Cabral, hoje preso em Curitiba

Para o Sindicato dos Servidores do Sistema Penal do Estado do Rio de Janeiro (SindSistema), o problema de Benfica não é um caso isolado. Nota da entidade, assinada pelo presidente Gutembergue de Oliveira, afirma ser “ridícula” a forma como está sendo tratado o “Motel de Benfica” já que o mesmo acontece em outros presídios, como na Penitenciária Gabriel Ferreira Castilho, em Gericinó (zona oeste do Rio). Segundo a nota, no local há “uma galeria com dezesseis celas-suítes com a mesma finalidade e em condições parecidas”. Investigar quem se beneficia dessas regalias é o mínimo que se pode exigir de quem cuida dos presídios.

As celas do amor

Quatro das seis suítes para visitas íntimas no quarto andar de Benfica foram redecoradas e utilizadas por detentos sem permissão da Secretaria de Administração Penitenciária. As suítes foram equipadas com: