“Abrir uma livraria é coisa de maluco, mas me sentia preparado para ter minha própria loja” Fábio Brito, sócio da Casa da Árvore (Crédito:Chico Ferreira)

O pós-pandemia abre perspectivas alvissareiras para o mercado livreiro. Depois do domínio quase absoluto na última década das megastores, chegou a vez dos espaços menores, especializados e mais aconchegantes ganharem destaque. Há inaugurações de livrarias em várias grandes capitais e também um fluxo de frequentadores crescente que querem retomar as compras presenciais. No centro de São Paulo, por exemplo, começaram a funcionar nos últimos meses, a Megafauna e a Gato sem Rabo, espaços acolhedores e com boa seleção de títulos que estão cada vez mais cheios. No Rio, a livraria Casa da Árvore inaugurou uma filial na Tijuca, e a Janela, uma loja no Jardim Botânico no ano passado. Em Belo Horizonte, a livraria Coralina abriu as portas. O Sindicato Nacional da Editora de Livros (SNEL) calcula que cerca de 60 livrarias foram abertas no País somente no primeiro semestre. É um número semelhante ao registrado entre julho e dezembro de 2020, quando tudo parecia parado. Além dos pequenos pontos, há também redes emergentes se impondo nacionalmente, como a Leitura, surgida em Minas Gerais, que abriu 15 lojas em dois anos, e a Travessa, do Rio, que tem nove lojas, inclusive uma filial em Portugal, e prepara uma inauguração em Brasília.

“Abrir uma livraria é coisa de maluco, mas estou no mercado há 15 anos e me sentia preparado para ter minha própria loja”, afirma Fábio Brito, um dos proprietários da Casa da Árvore, com foco em ciências humanas, literatura e religiões de matriz africana. Antes da filial da Tijuca, a livraria já tinha um ponto de venda no restaurante e casa de cultura Omolokum, na Pedra do Sal, na Gamboa. Segundo Brito, a aposta agora é na conquista do público tijucano, que tem um perfil dinâmico e diversificado e gosta de consumir as coisas do bairro, dando muito valor ao comércio local. A concorrência na região é pequena e se limita a outras cinco ou seis lojas, inclusive uma da Leitura, no Shopping Tijuca, também recém-inaugurada. Como outras livraria de rua, a Casa da Árvore aposta numa boa curadoria, com ambiente aconchegante e atendimento personalizado. “Queremos que as pessoas tenham aqui um espaço de convivência e encontrem os livros que desejam”, diz Brito, que sentiu uma melhora nos negócios nos últimos dois meses.

O longo período de dificuldades no setor, que atingiu seu auge entre 2017 e 2018, e foi acentuado pela chegada do coronavírus, dá sinais de que está se esgotando. Um campo de oportunidades parece se abrir, com um público mais interessado na leitura. As compras presenciais voltaram a crescer e a onda de lançamentos também é impressionante. Se no ano passado, as editoras se dedicaram basicamente a reedições – o autor mais vendido foi o inglês George Orwell, autor de 1984 —, e evitaram os riscos de lançar novos autores, em 2021 a situação mudou completamente. Com a volta das compras físicas surgem edições cada vez mais caprichadas e atraentes e consumidores ávidos por novidades. O último Painel do Varejo de Livros no Brasil, referente a setembro, que mede mensalmente o consumo de livros de interesse geral, não incluídos os escolares, mostra o aquecimento dos negócios. Até setembro foram vendidos 36,1 milhões de exemplares com um faturamento de R$ 1,52 bilhão, 34,8% maior do que em 2020. Os números confirmam a retomada e se aproximam, a três meses do final do ano, do total de 2016, quando a receita foi de R$ 1,6 bilhão, e de 2017, com vendas de R$ 1,7 bilhão.

“É muito interessante ver que o livro e a leitura estão em alta no Brasil e o desafio agora e manter os novos leitores ”, afirma Marcos da Veiga Pereira, presidente do SNEL. “Acredito que essas novas livrarias com formatos menores são a tendência atual e do futuro”. Segundo ele, as vendas online, que representaram cerca de 70% dos negócios no varejo em 2020, já baixaram consideravelmente e hoje garantem entre 55% e 60% dos negócios. Para o presidente da SNEL, o momento histórico de debate público intenso estimula o surgimento de novos autores e leitores, que buscam uma discussão mais qualificada, além de um relacionamento mais próximo das livrarias com o consumidor. “As livrarias estão se comunicando mais com o leitor e várias desenvolveram seus próprios sistemas de venda online e de entrega”, diz Pereira.

Entre as potências emergentes do setor estão a Leitura, de Minas Gerais, a Travessa, do Rio, A Página, de Curitiba, com 17 lojas, e a Livraria da Vila, de São Paulo, com 15 unidades. A Leitura deve terminar o ano com 92 lojas. “As redes sociais ajudam muito nas vendas, mas o atendimento presencial é imprescindível para a evolução dos negócios”, diz José Américo Filho, livreiro da Travessa em Ipanema. A Travessa, que opera principalmente lojas de rua, acaba de ampliar sua unidade na Vila Madalena em São Paulo e vai retomar os lançamentos presenciais a partir de novembro. Em um País onde pouco se lê, qualquer reação do mercado é muito bem-vinda. E tudo indica que o interesse pelos livros voltou a crescer.