Nos tempos de Mao Tsé-Tung, a imagem e os ensinamentos do líder chinês faziam parte da vida diária da população. O rádio e a televisão encontravam uma audiência receptiva e a máquina de propaganda comunista deu origem a um extraordinário culto à personalidade de Mao. Até hoje seus retratos estão espalhados por lugares públicos e privados. Agora, eles têm companhia. A imagem do presidente Xi Jinping tem ganhado destaque e aparece ao lado da de Mao. É a consolidação do político responsável por fortalecer a China no cenário mundial.

Durante anos, as lideranças do partido comunista chinês dividiram os holofotes e tentaram governar o país por meio de um consenso. O “Diário do Povo”, principal jornal do país, sempre apresentou retratos individuais dos principais nomes, divulgados a cada cinco anos, quando o partido se reorganiza. No mês passado, após Xi Jinping conquistar seu segundo mandato como homem mais importante da China, o jornal local estampou um enorme retrato seu, com o resto das lideranças em uma imagem coletiva. Antes virtualmente desconhecido fora de seu país, em apenas cinco anos Xi ganhou projeção como um dos maiores e mais respeitados estadistas da atualidade. “Há cinco anos, eu disse que ele seria o maior líder chinês desde Deng Xiaoping”, escreveu o ex-primeiro-ministro australiano Kevin Rudd no Financial Times. “Eu estava errado. Ele é agora o líder mais poderoso desde Mao”, afirmou. A maior honra que poderia receber foi ter seu nome incluído no estatuto do partido. Apenas Mao também obteve esse reconhecimento em vida. Deng Xiaoping, sucessor do líder revolucionário chinês e responsável por grandes mudanças econômicas na década de 1980, só teve seu nome gravado no estatuto após sua morte.

Desde 2012, quando assumiu o poder, Xi Jinping adotou uma série de medidas que fortaleceram a China como uma potência mundial. Combateu a corrupção no partido, disciplinando oficiais de diversos níveis hierárquicos. Reforçou o comprometimento em atender às metas ambientais estabelecidas pelo Acordo de Paris. Tirou 60 milhões de pessoas da pobreza. Reforçou o poder do partido comunista, adotando um tom conservador. Na economia, conseguiu manter a taxa de crescimento do país em torno dos 6,5% ao ano, mas boa parte desse desempenho se deve ainda a investimentos do governo. No Congresso Nacional do Partido Comunista, falou durante mais de três horas e afirmou que vai abrir o mercado a investimentos estrangeiros, prometendo tratamento igualitário a empresas de fora que desejarem investir na China. Disse que é chegada uma “nova era” em que a economia será pautada pelo livre mercado.

Livros retratam a juventude simples de Xi Jinping, quando ele trabalhou
nos campos. É uma imagem com a qual os chineses conseguem se identificar

CARISMA

Cozinhando, assistindo a uma partida de futebol ou num bate-papo, o presidente gosta de demonstrar que se interessa pelo povo: postura contrasta com a de seus antecessores

PATERNAL

As medidas que adotou para consolidar o poder da China, que caminha para se transformar na maior economia do planeta, superando os Estados Unidos, seriam suficientes para gravar o nome de Xi Jinping na história do país. Mas com uma imagem cuidadosamente cultivada ele deixou de ser apenas um respeitado político para se tornar um líder querido. Enquanto seu antecessor, Hu Jintao, tinha pouca desenvoltura ao lidar com a população comum, Xi tem carisma. Ao visitar vilarejos, almoçar em restaurantes ou encontrar crianças, o atual presidente chinês costuma participar de atividades e pagar suas refeições. Até suas feições são retratadas de maneira branda. Não à toa, é conhecido como “Xi Dada”, ou “Tio Xi”. Outros líderes autoritários também adotaram essa aura acessível. Joseph Stalin aparecia ao lado de crianças em pôsteres soviéticos, transmitindo uma imagem de benevolência e autoridade. Ho Chi Minh, o líder vietnamita, fazia o mesmo e era conhecido como “Tio Ho”.

CULTUADO

Livros contam a história de Xi Jinping quando jovem, enviado para trabalhar no campo. É uma história com que muitos chineses conseguem se identificar. As publicações têm sido traduzidas para fora da China, como forma de apresentar uma face pouco conhecida do presidente ao resto do mundo. Em um momento em que os Estados Unidos, sob o comando de Donald Trump, adotam políticas isolacionistas, a China pode tomar a dianteira entre as grandes potências sob o comando de um líder forte — e cultuado por uma população de 1,4 bilhão de pessoas.