Ninguém pode dizer que o Brasil, no campo político, é atualmente um País no qual os dias se sucedem de forma repetitiva.

Não. Ao contrário: o Brasil assemelha-se a um trem fantasma — cada dia é uma nova curva e dela saem assombrações, sandices e aberrações. Cada dia é um solavanco na inteligência humana. Cada dia é um atropelo à razão – e à Constituição. O mais recente absurdo dá conta de uma hipótese, sem pé nem cabeça, que começa a ganhar corpo entre parlamentares do Centrão. Trata-se da criação do cargo de senador vitalício para o presidente Jair Bolsonaro.

Calígula, terceiro imperador de Roma (entre os anos 37 e 41 d. C), nomeou senador vitalício o seu cavalo Incitatus (em latim significa impetuoso). Tivesse Bolsonaro um cavalo, e com certeza o Centrão seguiria essa loucura. Como Bolsonaro é mais ligado em motocicleta e jet ski, é bem provável que tais bens materiais entrem para a galeria senatorial. O único cavalo que há pouco tempo passou pela vida do presidente é aquele que, montado por ele, empacou na Agrishow. Mas não é de sua propriedade.

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para fazer de Jair Bolsonaro senador vitalício, cargo e título que não existem no Brasil, é inconstitucional.

A Constituição fixa, enquanto cláusula pétrea, que mandatos outorgados pelo povo serão submetidos a “eleições periódicas, em voto secreto e sufrágio universal” (tudo isso as urnas eletrônicas contemplam). PEC existe para emendar a Carta, mas não tem força legal nem é ferramenta legítima que possa alterar cláusula pétrea.

É fato que Bolsonaro estará, a julgar pelas pesquisas de intenção de voto, fora do Palácio do Planalto no ano que vem. Não mais ficará, portanto, sob o abrigo do foro especial por prerrogativa de função. Ou seja: poderá ser indiciado pela polícia, denunciado pelo Ministério Público, julgado e condenado pelo Poder Judiciário devido à tonelada de crimes cometidos ao longo do mandato.

O cargo de senador vitalício lhe asseguraria a blindagem jurídica da prerrogativa de função.

Se parlamentares fizerem alguma mágica para dar ao presidente o cargo de senador vitalício, tratar-se-á de exercício abusivo de função pública, e o caso inelutavelmente irá para o Poder Judiciário.
Bolsonaro e o Centrão cairão, então, do cavalo.