Restam pouco mais de seis meses para que comece a vigorar o Brexit, a saída do Reino Unido da União Européia, prevista para 29 de março de 2019, e o futuro da complexa relação comercial com o bloco ainda está indefinido por causa de uma crise no parlamento britânico. A primeira-ministra Theresa May tenta aprovar a qualquer custo uma proposta chamada de Plano de Chequers, lançado em julho, que prevê a criação de uma zona de livre comércio para atenuar os efeitos indesejáveis da separação. A proposta causou um racha no partido do governo, o Conservador, que a considera uma submissão aos interesses de Bruxelas. Na prática, a proposta de May mantém a circulação de produtos industrializados e agrícolas sem barreiras e preserva os vínculos econômicos praticamente inalterados. Em outubro vence o prazo para a definição das regras comerciais e das relações sociais que passarão a vigorar. Para os críticos da primeira-ministra, a proposta deixa o Reino Unido numa posição desfavorável para negociação e expõe sua dependência econômica da União Européia.

Assim que foi divulgado, o plano causou baixas imediatas no governo. Dois ministros renunciaram: Boris Johnson, das Relações Exteriores, e o ministro especial do Brexit, David Davis. Agora, pelo menos 80 parlamentares do partido declararam que pretendem votar contra o modelo de acordo proposto por May. Sem esse grupo, a ministra não terá os 320 votos necessários e dependerá da bancada Trabalhista, de oposição, para aprovar o acordo, o que desafiará sua liderança e, inclusive, sua permanência no cargo. A base do governo conta com 315 conservadores e mais nove deputados do Partido Unionista Democrático (DUP). O ex-subsecretário de Estado para o Brexit Steve Baker, outro que se demitiu do governo, prevê uma rebelião contra a proposta de May no congresso do Partido Conservador, que acontecerá no final deste mês. “Se chegarmos com a expectativa de aprovar o plano à custa dos votos trabalhistas, o Partido Conservador vai enfrentar a divisão catastrófica que tem conseguido evitar”, disse Baker.

A proposta de May mostra as vulnerabilidades do Brexit. Sem um acordo com Bruxelas e diante de uma abrupta separação, o Reino Unido pode sofrer sérias perdas econômicas, inclusive fuga de capitais, queda de empregos e uma possível escassez de insumos básicos. Um dos problemas que podem eclodir é a falta de alimentos, em especial os frescos e perecíveis. O país importa da União Européia quase metade da comida que consome. Caso não se acerte com o bloco europeu, o Reino Unido terá que se submeter às regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), que envolvem um aumento da burocracia, mais perda de tempo nas alfândegas e interrupção no fluxo de caixa das empresas britânicas. Outra conseqüência da falta de um acordo é o acirramento da tensão na fronteira entre Irlanda e Irlanda do Norte, onde resiste um sentimento anti-britânico que pode ser intensificado caso surjam barreiras comerciais entre os dois países. “Devemos ter em mente a mensagem que o parlamento enviará à União Européia”, disse May na ocasião do lançamento da proposta. “Estou tentando negociar o melhor acordo para o Reino Unido.”