É motivo de júbilo e de grande comemoração. Daqui a duas semanas o Brasil vai ganhar um dos mais incríveis museus nacionais, que voltará a ser um dos espaços de exposições com maior visitação da América Latina e vai se tornar um lugar de reflexão permanente sobre a independência e a nacionalidade. Depois de nove anos fechado, abandonado e chegando a correr risco de desabamento, o Museu do Ipiranga ressurge vigoroso para o século 21 nas comemorações do bicentenário do grito de Dom Pedro I, turbinado por R$ 211 milhões de investimentos privados, usados na restauração de seu prédio histórico e numa ampliação primorosa que vai permitir exposições temporárias e uma rotina dinâmica de cursos e seminários de agora em diante. O que se espera do novo ambiente é que ele se torne um lugar de intensa convivência cultural e de discussão sobre a realidade brasileira, onde se possa exercer a cidadania e pensar a história do País. São expectativas alvissareiras que permitem projetar, a partir de 2023, um público de mais de um milhão de visitantes por ano, marca que já atingiu no passado, graças ao grande número de estudantes que sempre atraiu.

MIRANTE Novo equipamento no alto do edifício permite uma visão de 360 graus da cidade de São Paulo (Crédito:Natália Cesar)

O projeto de restauração e ampliação do museu ficou a cargo do escritório H+F, dos arquitetos Eduardo Ferroni e Pablo Hereñu, que venceu um concurso público em 2018. As obras começaram no ano seguinte e, entre as referências para a nova construção, a dupla de arquitetos estudou a já clássica reforma do museu de Castelvecchio, em Verona, na Itália, levada adiante pelo arquiteto Carlo Scarpa entre as décadas de 1950 e 1970, e a ampliação recente do Neues Museum, em Berlim. A própria obra do Louvre, de 1989, que envolveu a instalação de uma nova entrada e de um imenso ambiente receptivo, também foi analisada pelo escritório, embora o projeto do Museu do Ipiranga fosse menor. “O principal, porém, foi estudar muito bem o prédio antigo, que tinha muitas coisas a revelar e muitos segredos”, diz Ferroni. “Descobrimos os bastidores do museu, espaços que ficavam atrás das salas e que não eram vistos pelo público e agora serão usados para circulação e exposições.”

O principal desafio do projeto, segundo Ferroni, além do tempo curto (três anos para as obras), foi conectar a estrutura monumental com a nova construção, cuja principal função será receber e acolher o público, com sanitários, guarda-volumes, loja, café, auditório para 200 pessoas, salas de aula e tudo mais que não cabia no pavilhão do século 19. A ampliação utiliza um desnível de oito metros que já havia no terreno e para levar a obra adiante foram adotadas tecnologias construtivas de escavação iguais às usadas pelo Metrô. Cerca de dois mil caminhões retiraram a terra do local. “Para a gente era importante manter a narrativa da entrada do prédio antigo. E se criou a conexão da ampliação com o saguão original com duas escadas rolantes”, explica. Ao subir e descer as escadas, o público poderá ver como eram as fundações da construção monumental.

Na inauguração do museu, no dia 7 de setembro, serão abertas 11 exposições permanentes e uma temporária chamada Memórias da Independência, com duração de quatro meses, que além da epopéia paulista, incorporará movimentos libertadores de outros estados, visando mostrar a amplitude do processo histórico. Com as exposições temporárias, que terão uma área de 1,2 mil metros quadrados com climatização e controle de umidade, o museu deixará de ser estanque e se tornará dinâmico, recebendo coleções de outras instituições, inclusive internacionais e abrindo uma discussão permanente sobre a nacionalidade. “Tudo isso faz do museu algo intrigante e, de alguma maneira, a reforma permite que se reconte a história. Com as exposições temporárias serão incorporadas novas visões do processo histórico”, diz. A área expositiva total do Ipiranga passará a ser de cerca de 5 mil metros quadrados. O edifício ganhou também um mirante no topo com visão de 360 graus.

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Uma das preocupações fundamentais embutidas no projeto, diz Ferroni, foi com o desenvolvimento da parte educativa. Ele destaca que por se tratar de um museu da Universidade de São Paulo (USP), ele é fortemente orientado para a pesquisa e o ensino e foi estabelecido que as salas de aula ficassem visíveis para o público e integrassem a nova arquitetura. “Queremos que a pesquisa e a educação sejam experimentadas pelos visitantes”, afirma. Outro pré-requisito arquitetônico foi fazer que a nova área se abrisse para o fabuloso Jardim Francês, que também foi restaurado, integrando os espaços. O próprio piso do parque se estende para o ambiente interno de acolhimento. “A nova área foi pensada para ser uma extensão do parque, um lugar convidativo onde as pessoas queiram ficar”, diz Ferroni. O arquiteto imagina algo parecido com o Sesc Pompeia ou com o Centro Cultural São Paulo, lugares deliciosos onde a população tem prazer em circular. Tudo indica que o novo Ipiranga já vai nascer como um dos lugares mais agradáveis de São Paulo. E do Brasil.