O anúncio de uma chapa Lula-Alckmin surgiu como um balão de ensaio em círculos petistas e virou um projeto concreto para as eleições de 2022. Para o ex-presidente, é fácil entender os ganhos com a união heterodoxa. Um dos maiores problemas de Lula é se vender como moderado, de centro, fugindo da marca de polarização e extremismo que o PT conquistou antes de “fazer um pacto com o mercado” em 2002 e durante a crise que levou ao colapso dos 13 anos de governo petista. Lula sabe que precisará romper a barreira dos 30% de simpatizantes que sua legenda tem historicamente desde os anos 1980. E é preciso um fato novo para desviar a atenção sobre a complicada herança do Petrolão, do Mensalão e da recessão patrocinada por Dilma Rousseff.

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Para Alckmin, o arranjo é bem mais arriscado. O ex-governador teve um desempenho sofrível na eleição presidencial de 2018, quando ficou em quarto lugar com cerca de 5% dos votos. Não ficou isolado apenas dentro do PSDB. Esse desempenho colocou o próprio partido em xeque, sem voz e vez no cenário nacional. No Congresso, os próprios tucanos reconhecem que a legenda se transformou em um braço do bolsonarismo, com caciques que fogem dos holofotes e de investigações constrangedoras e parlamentares em busca de verbas secretas e benesses paroquiais.

A melhor chance de renascimento da legenda é resgatar as realizações que fizeram o partido conquistar a Presidência em dois mandatos: ênfase em programas sociais e modernização do Estado. Os fundamentos do Plano Real, que fizeram o País crescer e até hoje são referência para todo o espectro político, foram criados pelo partido. Mas esse debate passa longe das brigas por espaço das velhas lideranças.

Alckmin exigiu voltar ao governo de São Paulo e se colocou contra a renovação do PSDB. Ao deixar o partido e tentar transferir ao petismo o histórico de realizações do PSDB, joga uma pá de cal na sua credibilidade e se anula politicamente. É como se tentasse legar ao PT quase 30 anos de governo tucano em São Paulo. Dificilmente o eleitorado vai entender essa metamorfose. Principalmente a população mais conservadora do interior do Estado, que apoiava o ex-governador contra as bravatas petistas. É bom lembrar que Alckmin tem um histórico sofrível em disputadas nacionais, como o fiasco na eleição presidencial de 2006, quando perdeu para o próprio Lula e teve menos votos no segundo turno do que no primeiro.

Se sacramentar a chapa com o ex-inimigo, o ex-governador ficará sozinho na batalha de 2022, e no máximo servirá de escada para o renascimento do lulismo e a sobrevida do bolsonarismo, sacrificando o PSDB. É provável que Lula o descarte até o momento da eleição, pois tudo o que o petista não deseja é um vice que ameace sua posição. E Alckmin pode estar acenando com esse casamento exatamente porque já sente que suas chances de voltar ao Palácio dos Bandeirantes, brigando contra o ex-partido, são pequenas. Ao invés de fazer um jogo político esperto e surpreendente para renascer no cenário nacional, o ex-governador estará apenas praticando um suicídio político, rifando a própria biografia e dando mais combustível ao populismo – aquilo que o PSDB dizia combater.