Antigamente, os indígenas acreditavam que os fotógrafos roubavam suas almas. Hoje, sabem que essas imagens podem salvá-los. O operador desse milagre é o fotógrafo Sebastião Salgado, um dos artistas brasileiros mais respeitados em todo o planeta. Sua longa lista de láureas acaba de ser ampliada com o Prêmio Imperial do Japão, considerado o Nobel das Artes. Desde o início dos anos 1990, quando publicou os livros “Terra” e “Serra Pelada”, suas deslumbrantes e dramáticas imagens em preto e branco dizem muito mais que mil palavras, como reza o dito popular. Toda vez que Salgado direciona sua câmera para um tema, ele se torna não apenas universal, mas urgente. Para ele, hoje, não há emergência maior que sua missão para salvar a floresta Amazônica.

A exposição “Amazônia”, fruto de 48 viagens à região em um período de sete anos, entre 2013 e 2019, acaba de ser inaugurada simultaneamente em três capitais europeias. Na França, ocupa a Filarmônica de Paris; na Inglaterra, está em cartaz no Science Museum, em Londres; em Roma, na Itália, acontece no MAXXI, museu nacional de arte e arquitetura.

“É uma exposição de arte, mas tem uma parcela de ativismo”, disse Salgado à ISTOÉ. “Contribuo com as imagens, quem traz o discurso político são os líderes indígenas.” Além das fotos, incríveis, a mostra exibe depoimentos de sete caciques e xamãs, que representam as 12 tribos fotografadas para o projeto, em parceria com a Funai.

Como em todos os projetos de Salgado, há uma integração orgânica entre o ser humano e a natureza. A vida transborda em rios aéreos, fenômeno que garante a agricultura em toda a América do Sul; nas nuvens carregadas, que semeiam as chuvas; nas árvores imponentes, colunas que sustentam o planeta. Há também elementos inéditos: “é a primeira vez que registramos a Imeri, maior cadeia de montanhas do território brasileiro”, conta Salgado, 77 anos, com uma empolgação juvenil.

A mostra “Amazônia” tem curadoria e cenografia de Lélia Salgado, companheira do fotógrafo há 55 anos e sua parceira no Instituto Terra, organização que já plantou mais de dois milhões de árvores. Leila montou uma exposição em que os sons desempenham parte quase tão importante quanto as imagens. A música surge em diversos momentos, a começar pela canção-tema composta pelo francês Jean-Michel Jarre – ele valeu-se de arquivos cedidos pelo Museu de Etnologia de Genebra, na Suíça. Salas adjacentes trazem projeções de retratos de indígenas ao som da trilha sonora de Rodolfo Stroeter, do grupo Pau Brasil, e de “Erosão (Origem do Rio Amazonas)”, de Heitor Villa-Lobos.

Em termos musicais, no entanto, a parte mais espetacular será a parceria firmada com orquestras e salas de concerto. Projeções de 250 fotos serão exibidas em telas gigantes (16m X 11m) de forma sincronizada com a suíte “A Floresta do Amazonas”, de Villa-Lobos, sob regência da brasileira Simone Menezes. Na Filarmônica de Paris, o concerto será executado pela orquestra francesa Rouen Normandie; no tradicional Barbican Hall, em Londres, se apresentará com a Sinfônica de Londres; em Roma, no auditório Parce Della Musica, o projeto terá a participação da Orquestra da Academia de Santa Cecília.
A exposição chega a São Paulo em 15 de fevereiro de 2022, com exibição no Sesc Pompeia e presença de lideranças indígenas. No dia 18, o formato que prevê a projeção musical ocorre na Sala São Paulo, sede da Osesp. No Rio de Janeiro, a mostra estreia em 15 de julho no Museu do Amanhã. Há planos para que ela se torne itinerante e viaje por outras capitais da América do Sul, inclusive Belém e Manaus, maiores cidades da região amazônica. Salgado diz que fará o máximo para atrair atenção ao assunto: “Buscamos um despertar planetário para a proteção da floresta amazônica, um paraíso que estamos perdendo com velocidade incrível. É o objetivo dessa exposição”.