23/09/2016 - 9:40
Um “faroeste” gaúcho de narrativa lacunar foi o primeiro longa da mostra competitiva do Festival de Brasília. O filme de Davi Pretto (o mesmo de Castanha) ambienta sua história num sítio familiar no meio do nada. Ou praticamente isso. Dione é o jovem que vive lá com a família até que as terras comecem a ser cobiçadas por um latifundiário da região. Ele quer comprar, e, como é hábito com essa gente, não aceita respostas negativas. Mas Dione tem outras ideias a respeito.
A trama, como se disse, é lacunar. Respeita tempos próprios e as imagens desfilam em longos planos-sequência, sem cortes. Transmite a ideia da solidão do campo, no que se acompanha do laconismo dos personagens. Quando falam, o fazem com palavras certeiras. Um dos pontos altos é o diálogo de Dione com Mariano, velho valentão do local, que põe o jovem ao corrente das práticas da região. Nessa sugestão de atmosfera, com uma crescente tensão, Rifle dá seu recado, com o grande capital cercando os pequenos proprietários e tirando o chão precário onde se sustentam. O título se refere a um “personagem” importante na trama.
Dois curtas deram início à competição nessa metragem: Ótimo Amarelo, de Marcus Curvelo (BA), e Quando os Dias Eram Eternos, de Marcus Vinicius Vasconcelos (SP).
Em Ótimo Amarelo, um rapaz retorna a Salvador depois de tentar a sorte em outra parte. Vestido com camisa do seu time, o Vitória, está só, meio bêbado e tenta se comunicar com amigos através do WhatsApp. Enquanto isso, máquinas trabalham no ciclo infatigável de destruição e reconstrução que marca as metrópoles brasileiras. O ritmo é esticado, aposta nos tempos mortos como fontes para reflexão. O sentimento é de banzo, mesmo quando em território próprio.
A animação Quando os Dias Eram Eternos baseia-se em Kazuo Ohno com o personagem do filho voltando para assistir aos últimos dias de sua mãe doente. Terno, traço bonito, artesanal, emociona.
Dois filmes femininos, ambos fora de concurso, ilustraram a urgência das discussões de gênero num país retrógrado. Câmara de Espelhos, de Dea Ferraz (PE), escolhe uma amostragem representativa de homens e os põe a falar sobre mulheres numa sala fechada. Debatem assuntos como aborto, liberação sexual feminina, salários diferenciados, violência sexual, etc. Conclusão: todos são machistas, em graus variados. Ninguém sai impune de uma educação patriarcal e atrasada como a do Brasil.
Precisamos Falar do Assédio, de Paula Sachetta (SP), usa outro dispositivo. No interior de uma van, mulheres que sofreram abuso sexual dão depoimentos. Podem falar de rosto aberto, ou usar máscaras e ter a voz distorcida caso se sintam ameaçadas. Os depoimentos são pungentes, mas só surpreendem quem se deixa levar pela ilusão de que não existe sexismo no Brasil. Toda uma história de opressão ao gênero feminino se expressa pela fala dessas mulheres.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.