O senador Ciro Nogueira (PP-PI) imaginou que teria uma estadia na chefia da Casa Civil apenas de glórias. O presidente Bolsonaro tinha uma dificuldade enorme de articulação política e precisava de alguém para domar o Centrão. Os antecessores não mostraram habilidade para negociar com o Congresso. Nomeado em julho, Nogueira acabou se transformando em um grande fiasco e acumula uma extensa ficha de derrotas. Seu calcanhar de Aquiles é o Senado, inexplicavelmente. Na Casa, de onde está licenciado, se esperavam os melhores resultados, mas os reveses são acintosos. Na Câmara, o pragmátismo governamental, do toma lá dá cá, é melhor, mas as vitórias são atribuídas ao presidente Arthur Lira (PP-AL). A interlocução no Supremo Tribunal Federal (STF) também é falha. O ministro não consegue emplacar a política desenhada pelo Planalto. A deputada Joice Hasselmann (PSDB-SP) disse à ISTOÉ que o mais hábil político não dará jeito nesse governo. “Nem o experiente Ciro consegue articular com sucesso para essa gestão caótica liderada por um presidente oligofrênico”.

RIVAL Filiado ao PSD, o senador Rodrigo Pacheco pode ser candidato à Presidência: pedra no sapato da Casa Civil (Crédito:Ueslei Marcelino)

Conspiração guedes

Fora da correlação de forças com as outras esferas de poder, Nogueira fez uma jogada política bem arriscada e somou seu maior fracasso. Ele organizou uma ofensiva ao ministro da Economia. Para tanto, contou com a colaboração dos ministros João Roma (Cidadania) e Flávia Arruda (Secretaria de Governo). Eles queriam convencer Bolsonaro a pressionar Guedes para romper o teto de gastos, a qualquer custo, e anunciar o Auxílio Brasil de R$ 400. Na pauta também estava a busca por um nome alternativo para substituir Guedes caso ele não cedesse. Ao que tudo indica o presidente acenou para que o plano tivesse andamento. O interlocutor nessa estratégia foi o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual. Com um projeto ardiloso, os ministros queriam que o BTG cedesse seu executivo Mansueto de Almeida para o Ministério da Economia no lugar de Guedes. Não contavam com a boa relação do ministro com o mercado, além da negativa do próprio Mansueto, que não quis manchar seu currículo voltando para um governo embaraçado. A conspiração malfadada de Nogueira teve consequências. Guedes saiu fortalecido e Bolsonaro ganhou fôlego para tocar a reeleição: deve se filiar ao PL e não mais ao PP de Ciro.

Pesa contra Nogueira, sobretudo, os resultados negativos para conter a CPI da Covid. O ministro não impediu que o presidente fosse indiciado em nove crimes. A minirreforma trabalhista saiu derrotada por 27 votos a favor e 47 votos contrários ao governo. O pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes não prosperou. A MP que limitava a remoção de fake news das redes sociais foi devolvida ao governo. Todas essas derrotas ocorreram no Senado, onde ele gozaria de prestígio, mas mostrou-se incapaz. Na Câmara, tem melhor sorte. O governo aprovou a Privatização dos Correios, a reforma do Imposto de Renda e a flexibilização de licença ambiental. Mas todos esses projetos estão engavetados ou caminhando lentamente no Senado. A queda de braço entre o senador Rodrigo Pacheco, filiado ao PSD e possível candidato à Presidência da República em 2022, pode justificar parte das derrotas. Ainda na Câmara, o retorno do voto impresso não passou e a PEC da Vingança, que limitaria o poder de investigação dos procuradores, foi derrotada.

A fragilidade de Nogueira é exposta no episódio da carta escrita pelo ex-presidente Michel Temer. Nogueira não teve o protagonismo esperado de um chefe da Casa Civil. Correligionários do governo seguem presos e o ex-advogado-geral da União André Mendonça ainda não foi sabatinado para a vaga na Corte. No Congresso, se esperava que sob o auxílio do ministro, Bolsonaro pudesse ser contido — outra derrota. A questão a responder é se tantas perdas são fruto de falta de habilidade ou oriundas de desinteresse. A cientista política Juliana Fratini enxerga uma mistura de tudo isso. No tema sobre a rasteira que tentou passar em Guedes a derrota mostra que Nogueira deu um passo em falso. “O chefe da Casa Civil queria mostrar sua capacidade de influência”. Entretanto, o interesse é puramente fisiológico. “Nogueira foi base dos governos Lula e Dilma e seu partido costuma apoiar em troca de cargos”, afirma Juliana. De fato, o Centrão pode continuar dando as cartas no próximo governo, seja qual for.

Derrotas de Ciro

• No senado, Nogueira não teve poder de articulação para barrar as investigações da CPI da Covid. Amarga a derrota da minirreforma trabalhista. Ainda viu a devolução da medida provisória que limitava a remoção de conteúdo nas redes sociais.

• Na Câmara, o maior desejo do presidente era ver aprovado o retorno do voto impresso, mas o ministro não conseguiu reverter o quadro. Também falhou na tentativa da PEC da Vingança, que limitaria o poder de investigação dos procuradores.

• No STF, o próprio Bolsonaro precisou articular com o ex-presidente Michel Temer para que houvesse uma trégua. Correligionários do governo seguem presos e André Mendonça ainda não foi sabatinado para a vaga na Corte.