A reforma da previdência proposta pelo governo Temer terá um efeito perverso. Se o objetivo era equilibrar as contas, ela poderá provocar um rombo ainda maior, com uma queda abrupta e acentuada das contribuições. O motivo: com a idade mínima de 65 anos e a necessidade de se contribuir durante 49 anos para garantir o benefício integral, as pessoas mais sensatas chegarão à conclusão de que devem poupar por conta própria, evadindo-se do sistema público.

Afinal, qual é a lógica de continuar contribuindo para um sistema que quebra regras estabelecias – sinalizando que pode voltar a quebrá-las no futuro – e mantém privilégios para castas privilegiadas do serviço público, como os militares? Portanto, profissionais liberais, empresários e tantos autônomos no mercado de trabalho não têm nenhum incentivo para continuar no atual sistema de previdência. Permanecerão apenas aqueles que forem obrigados, como os empregados com carteira assinada – que também serão minoria quando, na próxima reforma, a trabalhista, os direitos estabelecidos na CLT forem flexibilizados.
Essa reforma, na prática, marca o fim do que foi a tentativa de se criar um Estado de Bem-Estar Social no Brasil. Ao longo do tempo, com tantos privilégios concedidos aos servidores públicos, que mantêm aposentadorias e pensões especiais, o sistema foi se aproximando de seu colapso financeiro. A reforma atual, no entanto, em vez de combater privilégios, decidiu onerar justamente os mais fracos: os milhões de trabalhadores do setor privado, que não têm voz para reclamar.

Com as mudanças, quem quiser manter algum padrão de vida no futuro terá que começar a poupar desde já, o que poderá até aprofundar a recessão no curto prazo, uma vez que recursos destinados ao consumo terão que ser reservados para a poupança de longo prazo. A mensagem da reforma é clara: cada um que se vire por conta própria, sem contar com um Estado que quebrou a confiança da população.

Coincidência ou não, a agenda recente do secretário de Previdência, Marcelo Caetano, foi reservada apenas a encontros com executivos de bancos e seguradoras. Assim que a reforma passar, podem esperar campanhas publicitárias sobre a necessidade de se poupar no sistema privado, depois do fim do sistema público.

Essa migração poderia até ocorrer de forma civilizada se fosse antes debatida com a sociedade. Os trabalhadores poderiam até migrar de um sistema de repartição, como o atual, em que trabalhadores da ativa sustentam inativos, para um modelo de capitalização, em que cada um economiza para a própria aposentadoria, desde que houvesse um debate aprofundado.

Por exemplo: se a previdência social quebrou e cada um terá que se virar por conta própria, as contribuições dos empregadores deveriam ir para os fundos dos empregados – e não para um estado que mantém um sistema injusto e quebra regras estabelecidas.

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Com a reforma proposta, só loucos continuarão a contribuir para o sistema. A lógica, agora, é outra: cada um por si


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