A permanência do PSDB na base aliada conferiu novo fôlego para a governabilidade do presidente Michel Temer. Na segunda-feira 12, em Brasília, congressistas e outros quadros graduados da sigla tucana decidiram colocar um ponto final na ameaça propagada por alguns parlamentares do partido – os chamados “cabeças pretas”, assim classificados por serem mais jovens, – de que a legenda estaria rompendo de vez com o Palácio do Planalto. O apoio tucano não só aplaca um pouco a crise que abateu a Presidência da República, com a divulgação de uma conversa nada republicana entre Temer e o empresário Joesley Batista, bem como dá moral para a continuidade da tramitação de projetos importantes para o País, como as reformas trabalhista e da previdência. Foi uma importante vitória, somada à absolvição no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), quando os ministros da Corte Eleitoral decidiram não cassar a chapa Dilma-Temer por 4 votos a 3. Por ironia, a ação de abuso econômico e político foi proposta no TSE pelo próprio PSDB, após a derrota de Aécio Neves em 2014, que está suspenso do mandato por ter sido denunciado na delação de Joesley.

Levantamento feito por ISTOÉ revela que prevaleceu a vontade dos caciques do PSDB. De acordo com dados coletados nas eleições, o peso do voto foi decisivo para que os tucanos não desfizessem seu ninho no governo. Dos 16 nomes mais bem votados em pleitos eleitorais, apenas Ricardo Ferraço (ES) defendeu a saída. Ele obteve 1,5 milhão de votos. Os outros 15, somados, superam a marca de 46 milhões de eleitores computados pelo Tribunal Superior Eleitoral que votam em candidatos tucanos. O peso nas urnas dos parlamentares que pressionavam o partido a deixar a Esplanada dos Ministérios está bem aquém do grupo liderado pelo governador de São Paulo Geraldo Alckmin, que obteve 12,2 milhões de votos. Juntos, eles fizeram pouco mais de 2 milhões de votos. Mas o partido sofreu uma baixa importante. O ex-ministro da Justiça Miguel Reale Junior, um dos autores do pedido de impeachment de Dilma Roussef, pediu a desfiliação do PSDB, alegando não ter condições de ficar num partido que “relativiza a questão ética”.

Cargos valiosos

No Congresso, entretanto, houve parlamentar que deu um tom irônico ao possível desembarque da legenda. Um alto deputado do PMDB chegou a fazer galhofa quando perguntado se os tucanos sairiam da base, deixando o governo ainda mais isolado. “Até a “Velhinha de Taubaté” (personagem do escritor brasileiro Luis Fernando Veríssimo cuja característica principal é o otimismo) não acreditava que isso pudesse ocorrer”, vaticinou o congressista.

O comentário do parlamentar não foi à toa. O partido foi o maior contemplado na gestão do peemedebista após o impeachment de Dilma Rousseff. Antes escanteado pela petista, a legenda chegou a ter cinco ministros no atual governo. São eles: Maria Inês Fini, que ainda hoje é presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep); Luislinda Valois, atual secretária especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Ministério da Justiça e Cidadania; Maria Helena Guimarães de Castro, secretária-executiva do Ministério da Educação; e Bruno Araújo (PSDB-PE), que está à frente do Ministério das Cidades. Além disso, o ninho tucano foi montado nos ministérios das Relações Exteriores, com José Serra (PSDB-SP), que voltou para o Senado, e da Justiça e Cidadania, com Alexandre de Moraes, que saiu para o Supremo Tribunal Federal.

Por isso, as chances de uma possível retirada dos tucanos da Esplanada eram vistas como remotas. Dificilmente o partido abriria mão de pastas com maior poder de visibilidade, como o Ministério das Cidades, que possui uma receita de R$ 7,86 bilhões. Além disso, alguns destes ministros, como Bruno Araújo, chefe da pasta, dependem da atuação em seus cargos para ganharem novamente as eleições em seus estados. Araújo está licenciado da Câmara desde 2016, quando foi empossado no ministério.

Mas os interesses capitais do partido em se manter na base de Temer não se restringem à permanência na Esplanada e passam por Geraldo Alckmin. Pré-candidato à Presidência, o governador paulista pensa a longo prazo. Segundo fontes tucanas, ele acredita que é melhor ter o PMDB como parceiro de chapa do que criar uma liderança capaz de competir até 2018, caso Temer seja apeado do cargo. E um governo sangrando também pode afetar uma eventual candidatura do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ao Palácio do Planalto.

Em um outro cenário de conjecturas, há quem aposte que a permanência de Temer pode ser eficaz para o futuro de Aécio Neves. O senador afastado vai precisar do apoio do PMDB para se livrar da cassação no Conselho de Ética. Além disso, o presidente já deu mostras de que pretende controlar mais o ministério da Justiça e seus departamentos, como a Polícia Federal. Para isso, arriscou jogadas ambiciosas que alcançaram um revés imperdoável, como o fim do foro privilegiado de Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), suplente do deputado Osmar Serraglio (RS), que voltou à Câmara depois de ser defenestrado da Justiça. A prisão de Loures representa uma ameaça a Temer, já que o ex-auxiliar do presidente foi filmado pegando uma mala de R$ 500 mil de propina.

O ex-ministro da Justiça Miguel Reale Junior (Crédito:Divulgação)

Mas houve quem torcesse para a saída da sigla. De olho em mais espaço na Esplanada dos Ministérios, alguns correligionários de Michel Temer e políticos que integram a sua base no Congresso viram na crise e no possível desembarque tucano uma forma de conquistarem mais terreno dentro do governo. O Ministério das Cidades, aliás, há muito tempo é um dos alvos da bancada peemedebista na Câmara. Insatisfeita com o tamanho que os tucanos ganharam na Esplanada, uma parte da legenda passou a reclamar por mais espaço. Um dos alvos apontados era justamente a pasta ocupada por Araújo.

Mas o apoio incondicional dos tucanos ao enfraquecido governo de Michel Temer não é tão sólido assim. Uma prova de fogo desse casamento pode ser a eventual denúncia ao presidente ou, até mesmo, o surgimento de fatos novos, o que desgastaria ainda mais a imagem da sigla ao lado do peemedebista.

O PSDB optou por não abrir mão de pastas de grande poder e visibilidade. E os caciques do partido preferiram não se afastar do PMDB

O fico do PSDB

• O PSDB anunciou que permanecerá no governo após a chapa Dilma-Temer ser absolvida no TSE
• A decisão não foi unanimidade dentro do partido. Os “cabeças pretas”, parlamentares mais jovens e liderados pelos deputados João Gualberto (BA), Eduardo Cury (SP) e Betinho Gomes (PE), eram a favor do desembarque do governo;
• Já os “cabeças brancas”, que têm no front o ex-ministro de Relações Exteriores, José Serra (SP), e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, se mostraram contra a saída da base do governo;
• O PSDB tem o comando dos ministérios das Relações Exteriores, Secretaria de Governo, Cidades e Direitos Humanos, além de ser um dos principais aliados do governo no Congresso. Com a decisão, os quatro ministros permanecem em seus cargos;
• A decisão de se manter na base tem como objetivo principal aprovar as reformas da previdência e trabalhista que estão em tramitação no Congresso;
• Porém, os tucanos admitem a possibilidade de mudarem de ideia, caso a PGR apresente uma denúncia formal contra o presidente Temer no STF, por causa da delação da JBS