O presidente Bolsonaro quer instituir a espionagem oficial sobre os brasileiros. Para tanto, destacou o filho Carlos Bolsonaro como chefe dos arapongas. O vereador carioca é apontado como o responsável por tratar da compra do sistema Pegasus e passar por cima de todo o respaldo jurídico que regula a segurança nacional. Desenvolvido pela empresa israelense NOS Group, a ferramenta pode invadir celulares e computadores e vigiar críticos do governo, inclusive jornalistas. Isso já ocorreu no México, quando o presidente Enrique Peña Nieto utilizou o método para perseguir a imprensa.

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ARAPONGA Carlos Bolsonaro: poder para vigiar adversários nas redes sociais (Crédito:Divulgação)

A possibilidade de invadir a privacidade de opositores é o sonho do “Gabinete do Ódio”. Carlos Bolsonaro, embora não faça parte do governo federal, é o principal mentor dos ataques virtuais. O controle do sistema, se for implementado, ficaria a cargo dele. Além de ilegal e imoral, o poder desmedido para o filho 02 do presidente desagrada a cúpula do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) pois as entidades perderiam espaço dentro do governo. O valor destinado à compra do novo sistema é de R$ 25,4 milhões, mas, nos bastidores, comenta-se que o valor da licitação, na verdade, ultrapassa os R$ 60 milhões.

A crítica ao programa “Pegasus” veio rápida. Primeiro, por conta de o articulador ser Carlos, um vereador – o que não faz o menor sentido do ponto de vista republicano. A líder da bancada do PSOL na Câmara, Talíria Petrone (RJ), disse que o partido acionou o Ministério Público Federal para investigar o caso e criticou Carlos Bolsonaro, “um vereador que não atua no município. É, no mínimo, improbidade administrativa”, afirmou. A deputada Joice Hasselman lembrou que o principal objetivo do edital é nutrir a Diretoria de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas (Seopi), que foi “pivô no ano passado do escândalo envolvendo a fabricação de dossiês contra inimigos do governo Bolsonaro”.

“Esse software possibilita pesquisas em informações acessíveis a todo e qualquer usuário da internet” Anderson Torres, Ministro da Justiça (Crédito:PAULO H CARVALHO)

O vereador Carlos nega a participação na história, mas o edital 03/21 do Ministério da Justiça exclui da licitação a GSI e Abin propositadamente. O plano é fortalecer o Ministério da Justiça e a Polícia Federal, órgãos com maior influência do filho do presidente. O Ministério da Justiça também negou existir qualquer irregularidade. As licenças do software concedidas ao governo, no entanto, privilegiam a pasta de Anderson Torres. Ele terá sob a sua tutela – e do filho do presidente – 155 licenças, das 249 previstas na licitação. Só para a Polícia Federal serão 100 permissões.

Dados expostos

Na prática está sendo criada uma Abin paralela. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) disse que o caso é gravíssimo por envolver a aquisição de um software que invade celulares sem decisão judicial. Ela está correta: é essa a principal função do Pegasus. O programa controlado para fins políticos é perigoso. A deputada ainda afirmou que “é mais grave ainda que um dos filhos de Bolsonaro amplie a Abin paralela, um braço do gabinete do ódio”. Os militares foram jogados para escanteio nas discussões. O principal motivo seria a segurança na proteção dos dados. Há o temor de que as informações fiquem disponíveis em bancos de dados no exterior e, portanto, sem nenhuma proteção nacional. A exposição rompe a soberania do País. O armazenamento ocorre, dentro de redes privadas, na Alemanha e em Israel – isso justificaria a exclusão do GSI nas negociações. O órgão é chefiado pelo general Augusto Heleno e está lotado de militares. O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) acionou o Ministério Público contra a União e o Ministério da Justiça. Vieira questiona o uso do programa e diz que “pesquisadores na área dizem que, na verdade, a NSO é uma revendedora de armas cibernéticas”.

O sistema Pegasus permite a invasão de mídias eletrônicas sem deixar rastro. A navegação ocorre em fontes abertas e na Dark Web, sem qualquer interação com a pessoa investigada. A ausência de filtros e a facilidade de uso são preocupantes. Monitorar pessoas e quebrar o sigilo será fácil e não exigirá nem mesmo autorização judicial. O sonho antigo do presidente parece estar próximo de ser realizado. Em 2019 houve uma reunião com uma empresa que ofereceu ao Exército um software similar, mas que atendia aos anseios militares e armazenaria os dados coletados no Brasil. As tratativas não prosperaram: o vereador Carlos Bolsonaro descobriu a iniciativa e percebeu que não havia sido convidado a participar.