FOME Metade da população vive na miséria, mas dinheiro do Auxílio Brasil demora a chegar para os mais pobres (Crédito:Jardiel Carvalho)

Nada dá certo no governo de Jair Bolsonaro (PL). Nem mesmo quando estão em jogo interesses pessoais do presidente. Ele aparentemente tinha o plano perfeito para dar uma turbinada na sua candidatura e diminuir a distância que o separa do primeiro colocado, Lula da Silva, do PT. De olho no voto dos mais carentes, o populista Bolsonaro almejava ser reconhecido por essa fatia do eleitorado como o “Pai dos Pobres”, mas essa alcunha não colou. Lançou o Auxílio Brasil, programa social que substituiu o Bolsa Família, criado por Lula, e mais do que duplicou seu orçamento, de R$ 35 milhões em 2021 para R$ 90 milhões neste ano. São R$ 54 milhões a mais, um aumento de 157%. É muita coisa, mas o programa não consegue decolar – o que mais uma vez reafirma a notória incompetência do governo para planejar e executar qualquer projeto. O efetivo funcionamento do programa ainda poderia ajudar o presidente em outra frente, já que esse dinheiro estimularia a economia. Estimativa da Confederação Nacional dos Municípios aponta que há 1,3 milhão de famílias cadastradas e habilitadas – mas que ainda não estão recebendo o auxílio mensal de R$ 400. O Brasil tem 27 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, de acordo com dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O auxílio emergencial de R$ 600 durante a pandemia sem dúvida foi fundamental para uma parcela importante da população. Em 2020, representou 93% da renda dos 30% mais pobres – gente que não está no mercado formal e que ficou sem ganhos durante a fase mais restritiva do isolamento social. Ajudou a aplacar a fome de milhões de brasileiros. Mas, em mais uma demonstração da inépcia do governo Bolsonaro, os desvios no programa ficaram na casa dos bilhões. Já no primeiro ano do programa, o Tribunal de Contas da União (TCU) encontrou irregularidades em quase 440 mil cadastros e identificou o pagamento dos R$ 600 do benefício a pelo menos 110 mil empresários de alta renda. Além disso, o tribunal apontou que o auxílio foi pago a 17 mil pessoas mortas. Mas os muito vivos também foram contemplados. É o caso do empresário bolsonarista Jackson Vilar, do movimento Acelera para Cristo, organizador de algumas das motociatas em apoio ao presidente. Jackson recebeu 16 parcelas, o que totalizou R$ 5,7 mil entre abril de 2020 e outubro de 2021. “Recebi, porra, recebi. Qual o problema? Eu estava desempregado, não tinha loja ainda, e graças ao auxílio emergencial eu abri uma loja. Valeu, Bolsonaro!”. Jackson é candidato a deputado federal em São Paulo pelo Republicanos. Ajudar os mais pobres parece não ser mesmo a vocação do atual governo. Nesta semana, a Controladoria-Geral da União (CGU) apontou um desvio de R$ 2,6 bilhões do programa Farmácia Popular.

MALVERSAÇÃO Jackson Vilar, organizador de algumas das motociatas em apoio ao presidente, recebeu 16 parcelas do Auxílio Brasil, no total de R$ 5,7 mil (Crédito:Divulgação)

Enquanto não consegue fazer o dinheiro do Auxílio Brasil chegar a quem precisa, o governo encontrou outra forma de estimular a economia. São os saques extraordinários do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Esse fundo foi pensado como uma espécie de pé de meia do trabalhador, e originalmente só poderia ser sacado em situações específicas: para financiar a casa própria, por exemplo, ou em caso de demissão sem justa causa. Mas seu governo autorizou até agora saques extraordinários num montante de R$ 123 bilhões. Para o trabalhador que está com a corda no pescoço, a proposta é tentadora: pegar esse dinheiro para saldar dívidas. Mais uma solução simples para um problema complexo, como é a praxe neste governo. Diante da inflação acelerada dos preços do gás, da luze dos alimentos, o trabalhador assalariado mais uma vez paga a conta pela incompetência de Bolsonaro e da sua equipe — e ainda fica sem o que deveria ser uma garantia para o futuro.